Quarta, 4 de dezembro de 2019
Uma falha redacional no enunciado da peça prática de Direito Constitucional seguramente fez muitas centenas de vítimas. Não exagero se foram até mesmo mais de mil candidatos.
E uma falha que gera tamanho impacto NÃO PODE ser desprezada!
Uma coisa é um parcela de examinandos de uma disciplina errar a peça, ou qualquer ponto da prova, por falhas de leitura ou limitações próprias.
Outra, completamente diferente, é quando uma multiplicidade de candidatos sucumbe diante de um mesmo problema. Quando isso ocorre, sem dúvida, estamos diante de uma falha da prova e não dos examinandos.
E a falha tem de ser reconhecida pela banca.
A solução para a peça da prova de Constitucional foi o Recurso Ordinário.
Entretanto, a falha no enunciado vai reprovar muitos candidatos, pois a terminologia usada gerarou erro um real erro de interpretação, induzindo muitos a apresentarem o Recurso Extaordinário como solução.
FGV publica comunicado corrigindo o padrão de resposta de Constitucional
E este é o ponto: se o enunciado é capcioso, a banca tem de expandir o gabarito e aceitar o RE também como resposta correta, elaborando espelho específico para isto.
Li muitas análise e explicações rebuscadas sobre o problema na peça de Constitucional, mas para mim a explicação do problema é simples.
Vejamos um trecho do enunciado:
Por que é Recurso Ordinário?
Porque o enunciado mostra que o MS foi impetrado diretamente no Tribunal, como instância inicial do trâmite da ação, e que o o julgado exauriu o julgamento lá no próprio Tribunal. O recurso cabível de fato é o Ordinário e isso não se questiona.
Vejamos agora o mesmo trecho do enunciado:
A atecnia na redação projeta de fato uma outra resposta!
Ao usar o termo "exaurimento da instância ordinária" o enunciado gerou um paradoxo, induzindo os candidatos a crer que estavam diante de uma pegadinha.
Pegadinha, para quem não sabe, é uma armadilha cognitiva feita em provas com o propósito manifesto de reprovar o candidato.
Foi o que aconteceu!
O enunciado fala em Mandado de Segurança para o Tribunal, mas ao se ler o enunciado muito se surpreenderam. Como assim "exaurimento da instância ordinária? O processo foi julgado em primeira instância?"
Esse pensamento pode perfeitamente ser considerado razoável. A banca poderia estar tentando pregar uma armadilha na sua peça ao gerar confusão entre o tribunal e a instância ordinária, e muitos assim entenderam.
Foram induzidos ao erro porque o termo remete sim a ideia de primeira instância.
O Tribunal seria instância originária? Se não fosse, então a solução seria o Recurso Extraordinário. E foi o que muitos apresentaram como resposta.
A falha, claro, derivou do fato da FGV gostar de reciclar as coisas por aí. A problemática apresenta imensa semelhança com a questão abaixo:
Não sei qual foi a organizadora que fez essa questão, mas é evidente que a peça prática de Constitucional se inspirou nela.
Quem fez a peça puxou a terminologia da questão, correta em seu contexto original, mas equivocada na peça prática.
PONTO CENTRAL DO PROBLEMA: A banca, ao mencionar o "exaurimento da instância ordinária", referiu-se a instância inicial de conhecimento, ou seja, o Tribunal, mas o fez usando terminologia comumente aplicada à primeira instância.
A banca se expressou de forma equivocada, e com isso induziu ao erro centenas de candidatos.
Instância ordinária não é segunda instância ou instância extraordinária. Não é um conceito legal mas é sim um conceito doutrinário, e a projeção de um conceito equivocado em meio ao enunciado cujo uso da terminologia técnica é obrigatório, fazendo contraponto a qualquer tipo de linguagem coloquial, imprecisa ou de uso aleatório, FULMINOU a pretensão de centenas de examinandos.
Colhi depoimentos de vários examinandos dizendo que a primeira opção que fizeram foi pela ROC, mas depois trocaram ao ler o enunciado de forma mais detalhada, influenciados pela frase "exaurimento da instância ordinária".
O problema na peça é semântico, e o induzimento ao erro é manifesto.
Não acredito que tenha sido proposital, mas tenho certeza de que foi inapropriado.
A ampliação do gabarito para comportar o RE é a única solução para este caso. E a banca deveria fazê-lo imediatamente.