Chute x lógica jurídica: o que é melhor caso surja a dúvida?

Quinta, 5 de abril de 2018

Chute x lógica jurídica: o que é melhor caso surja a dúvida?

E aí? Quando chega aquele momento em que sobram questões na prova mas o conhecimento já foi todo gasto, o que fazer? Chute x lógica jurídica para resolver o restinho de questões que sobrou?

Primeiramente, não tenham dúvidas de uma coisa: NENHUMA questão da 1ª fase deve ser entregue em branco. Marquem todas, sem exceções.

Mas, sabemos, algumas disciplinas não foram bem estudadas, ou simplesmente bate a dúvida e a resposta está longe de ser facilmente identificada.

NO ALVO - Transmissão Completa!

E aí vem a dúvida entre chute x lógica jurídica: qual a melhor opção?

Digamos que o chute é a última tentativa, quando nada mais sai da cachola. ANTES, sem sombra de dúvida, temos a lógica jurídica.

Com ela dá para abrir caminhos que antes pareciam estar fechados, e a eficiência certamente é maior do que o mero chute.

Com bom senso e a lógica é possível operar pequenos milagres cognitivos. Com eles é possível responder algumas questões sem precisar apelar para o chute, e com isso somar pontos preciosos que por outro lado seria deixados para o acaso.

As 12 ciladas da prova da OAB

Evidentemente, em regra o desconhecimento do conteúdo inviabiliza gravemente a chance de acertar uma questão, e o uso da lógica e do bom-senso na busca da resposta correta encontra óbvias limitações.

Somente quando não há mais alternativa, ou seja, o candidato não sabe mesmo a resposta, que o uso do raciocínio e da coerência devem entrar em campo.

Vamos ver como funciona na prática?

Chute x lógica jurídica

Iniciaremos com uma questão de Direito Civil:

Chute x lógica jurídica

Enunciado enjoado, né? Ele foi concebido de forma intrincada exatamente para confundir o raciocínio e induzir ao erro. Mas com uma leitura atenta é possível achar a alternativa correta.

Vamos por etapas:

1 - A MAC Geral adquiriu de AC industrial equipamentos para fazer churro.

Primeiro ponto lógico: trata-se de um contrato entre MAC Geral e AC Industrial. A relação contratual é só entre essas duas empresas.

2 - A MAC Geral deve fazer o transporte dos equipamento se valendo dos serviços da Rota Transportes, figura estranha no contrato.

Segundo ponto lógico: a Rota Transportes NÃO faz parte do contrato original. A MAC Geral terá de contratá-la a parte para o serviço. Mas, para o problema, a Rota não é parte no contrato.

Vamos agora para as alternativas. Notem que devemos escolher a incorreta!

A) AC Industrial S.A. poderá exigir de Mac Geral & Companhia o cumprimento da obrigação firmada em favor de Rota  Transportes Ltda.

Pela lógica, e ignorando completamente o Direito, isso é certo. O contrato foi feito pelas duas empresas (criando obrigações recíprocas) e está explícito no enunciado que a obrigação da Mac Gera era a de transportar os equipamentos.

Correto.

B) Ao exigir o cumprimento da obrigação, Rota Transportes Ltda. deverá efetuar o transporte ao preço previamente ajustado pelas partes contratantes.

Se ficou ajustado entre os dois contratantes (Mac e AC) que o preço de contratação da Rota seria de R$ 100,00 por equipamento, então a Mac, que deverá contratar, o deverá fazer por este preço.

Correto.

C) Somente Rota Transportes Ltda. poderá exigir o cumprimento da obrigação.

Pergunta ESSENCIAL: a Rota faz parte do contrato? Não! Quem NÃO faz parte do contrato pode exigir o cumprimento da obrigação? Pela lógica, não.

E o enunciado facilita muito a vida para quem pensa um pouquinho: somente a Rota pode exigir o cumprimento da obrigação? Claro que não! Quem efetivamente pode exigir esse cumprimento é a AC Industrial, que é parte do contrato.

Incorreto!!!

D) AC Industrial S/A poderá reservar-se o direito de substituir Rota Transportes Ltda., independentemente de sua anuência ou de Mac Geral & Companhia.

Aqui pinta uma dúvida! A AC industrial efetivamente pode substituir a Rota Transporte independentemente da anuência da MAC ou da própria Rota?

Como nós não conhecemos o Direito, a dúvida surge. Pode ou não? Aqui nós não temos uma resposta.

Compete agora fazer uma ponderação: A alternativa C está errada, isso foi constatado logicamente. Já a alternativa nos deixa na dúvida, pois não sabemos como aplicar o Direito no caso. Qual delas devemos escolher?

Naturalmente, a que temos a convicção, pela lógica, de que está errada, no caso a C. E, pelo gabarito, efetivamente é a alternativa C a equivocada.

Vamos olhar outra questão, agora de ambiental:

Chute x lógica jurídica

Aqui vamos ter de apelar para um pouco de lógica jurídica. A resposta deriva diretamente da letra da lei, e em um primeiro momento a pergunta pode desanimar. Mas, mesmo assim, é possível achar a alternativa correta. Vamos lá!

1 - Técnicos do Ibama, autarquia federal meteu uma multa em uma empresa licenciada pelo Estado em que está localizada. A leitura com atenção já mostra por onde vai girar a controvérsia: a distribuição de competência entre a União e um Estado. Evocando um pouco do conhecimento jurídico, nós sabemos que a União, Estados e o DF têm competência concorrente.

Vamos ter de escolher a alternativa correta.

A) Há irregularidade no licenciamento ambiental, uma vez que em se tratando de atividade que cause degradação ambiental significativa, o mesmo deveria ser realizado pela União.

 Lendo esta alternativa não temos como saber se ela é correta ou não. Pode ser que haja uma norma específica quanto a isto. Apesar da ignorância, não faz muito sentido, em termos de lógica, que a natureza da degradação determine se o problema é de âmbito da União ou de um Estado. Essa fica de stand by.

B) É ilegal a fiscalização realizada pelo IBAMA, que só pode exercer poder de polícia de atividades licenciadas pela União, em sendo a atividade regularmente licenciada pelo Estado. 

Aqui o enunciado diz que o licenciamento determina a competência. Será? A pergunta a ser feita à alternativa é: diante de um crime ambiental, a autoridade fiscalizadora só pode agir se for competente? Aqui a lógica mata esse item: oras, diante de um crime qualquer um pode agir, quando o agente estatal deve agir, independentemente da natureza do crime, incluindo aí o crime ambiental. Neste ponto, a lógica torna essa alternativa inválida.

C) É possível a fiscalização do IBAMA o qual pode, inclusive, lavrar auto de infração, que, porém, não prevalecerá caso o órgão estadual de fiscalização também lavre auto de infração. 

Aqui o enunciado faz mais sentido. O IBAMA pode lavrar o auto mas, caso o órgão competente em âmbito estadual lavre um auto sobre o mesmo problema, este último prevalecerá. Alternativa possível, mas sem muita segurança.

D) Cabe somente à União, no exercício da competência de fiscalização, adotar medidas para evitar danos ambientais iminentes, comunicando imediatamente ao órgão competente, em sendo a atividade licenciada pelo Estado.

Esta alternativa é totalmente contrária ao conceito da competência concorrente. Seu erro é facilmente perceptível. E agora? Qual das alternativas, entre as duas em que ficamos com dúvida, fazem mais sentido em termos lógicos? A A ou a C? Eu escolheria a C, pois nela, comparando com a A, não há uma ruptura da lógica ou da lógica jurídica. A correta é essa, por óbvio.

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Vamos agora olhar uma de Constitucional:

Chute x lógica jurídica

Novamente aplicaremos um pouco de lógica jurídica para resolver essa questão:

1 -O Supremo publica uma súmula vinculante e um Estado edita lei no sentido contrário ao determinado pelo STF.

Bom...súmula vinculante faz o que mesmo? Vincula, certo? Partindo dessa óbvia constatação vamos às alternativas. Foco na correta:

A) O Supremo Tribunal Federal (STF) poderá, de ofício, declarar a inconstitucionalidade da norma estadual produzida em desconformidade com a Súmula.

De ofício? De cara essa questão está errada! Nós sabemos que o Judiciário não age, em regra, de ofício.

B) Qualquer cidadão poderá propor a revisão ou o cancelamento de súmula vinculante que, nesse caso, será declarada mediante a decisão de dois terços dos membros do Supremo Tribunal Federal (STF).

Qualquer cidadão? A competência para propositura de ações no âmbito do STF está na Constituição, e é restrita a um rol pequeno de legitimados. Imaginem se qualquer cidadão pudesse propor uma ação diretamente no STF? Nós sabemos que isso não ocorre.

Errada!

C) É cabível reclamação perante o Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar a validade da lei do Estado X que dispõe sobre os sistemas de consórcios e sorteios em seu território.

Hummmm....será? Será que a reclamação é o instrumento adequado neste caso? Como nós não sabemos Constitucional, vamos deixar essa em stand by.

D) A súmula possui efeitos vinculantes em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, mas não vincula o Poder Legislativo na sua atividade legiferante.

Sim, a Súmula vincula, mas volta e meia o poder legislativo dos mais diversos entes da federação editam normas inconstitucionais, quanto mais normas contrárias a uma súmula vinculante.

Vem logo a lembrança o Princípio da Separação dos Poderes, e legislar, criar lei, é a essência da atividade do legislativo. Pode uma Assembléia Legislativa editar norma contrária a um pronunciamento do STF? Óbvio! É para isso que o STF serve também.

E agora? Entre a C e a D, qual escolher? A C nós não temos certeza, já a D é mais coerente e não apresenta erro.

Ficamos com a D.

Chute x lógica jurídica

De vez em quando o uso da lógica torna a resolução de uma questão algo muito fácil. Essa aqui é um exemplo disto.

1 - O trabalhador tentou ajuizar duas vezes uma reclamação trabalhista. Na 1ª tentativa ele faltou e depois, na 2ª, ele desistiu.

O problema versa sobre a faculdade de ajuizar uma ação em caso de desistências anteriores. Na base da lógica, desta vez, temos o Direito de Ação.

Vamos olhar as alternativas:

A) terá de aguardar o prazo de seis meses, pois contra ele será aplicada a pena de perempção.

Aguardar seis meses? E a prescrição, entra como nessa história?

Alternativa muito improvável, pois a demora no ajuizamento da ação prejudica o recebimento das verbas trabalhistas.

B) poderá ajuizar a nova ação de imediato, contanto que pague o valor de uma multa que será arbitrada pelo juiz.

Multa? Será que existe multa? Não seria a multa um obstáculo ao exercício do Direito de Ação?

Opção esquisita.

C) não precisará aguardar nenhum prazo para ajuizar nova ação.

Ok, faz sentido, em conformidade com o livre exercício do direito de ação.

D) deverá aguardar seis meses para ajuizar ação contra aquele empregador, mas não para outros que porventura venha a ter.

Tão improvável quanto a alternativa  A.

A Letra C é a que faz mais sentido entre as 4.

Vamos dar uma olhada em uma questão de Direitos Humanos, bem enjoada.

Chute x lógica jurídica

Essa questão exigiria, logo em uma primeira olhada, o conhecimento do teor da lei. E ela, além disto, impressiona pelo tamanho não só do enunciado como também das respostas. Mas, mesmo assim, dá para resolvê-la!

Reparem só:

A) Entende-se por desaparecimento forçado a privação da liberdade promovida por particulares no exercício de uma coação irresistível, seguida da recusa em reconhecer a privação de liberdade ou do encobrimento do destino ou do paradeiro da pessoa desaparecida, colocando fora do âmbito de proteção da lei.

Aqui dá para eliminar a questão logo de plano. O termo "a privação da liberdade promovida por particulares" não se encontra sob o controle do Estado. A isso nós chamamos de sequestro e o Código Penal cuida deste crime. Não guarda correlação nenhuma com a atuação do Estado.

B) Entende-se por desaparecimento forçado a prisão, a detenção, o sequestro ou qualquer outra forma de privação de liberdade por agentes do Estado ou por pessoas ou grupos de pessoas agindo com a autorização, o apoio ou o consentimento do Estado, seguida da recusa em reconhecer a privação de liberdade ou do encobrimento do destino ou do paradeiro da pessoa desaparecida, colocando-a, assim, fora do âmbito de proteção da lei.

O enunciado não apresenta inconsistências. Aliás, em sua leitura, vemos que ele não só abarca a atuação de agentes do Estado apresentado formalmente como também por pessoas agindo com "a autorização, o apoio ou o consentimento" do Estado, algo com cara de informalidade.

O enunciado não tem incongruências mas não dá para bater o martelo sem ler as demais alternativas.

C) Entende-se por desaparecimento forçado a prisão, a detenção, o sequestro ou qualquer outra forma de privação de liberdade por agentes do Estado ou por pessoas ou grupos de pessoas agindo com a autorização, o apoio ou o consentimento do Estado, colocando fora do âmbito de proteção da lei.

Temos o mesmo enunciado da questão B, excluindo o trecho "seguida da recusa em reconhecer a privação de liberdade ou do encobrimento do destino ou do paradeiro da pessoa desaparecida.Ou seja, a mesma alternativa, em uma versão "light".

Não dá para excluir de plano também.

D) Entende-se por desaparecimento forçado o sequestro de um cidadão praticado por agentes das forças armadas do Estado, seguido da recusa em reconhecer a privação de liberdade ou do encobrimento do destino ou do paradeiro da pessoa desaparecida, colocando-a, assim, fora do âmbito de proteção da lei.

Esta é fácil de excluir! O enunciado restringe o conceito somente aos membros das forças armadas, ou seja, Marinha, Exército e Aeronáutica. Obviamente o rol de agentes estatais é bem maior do que este, tal como explicitado nas letras B e C, cujo conceito é bem mais abrangente, englobando inclusive o conceito de forças armadas. O erro da alternativa é evidente.

Certo!

Com quem ficamos? B ou C?

Pode até parecer difícil escolher, mas não é! Ficamos com a letra B.

Por quê?

Por conta do trecho "colocando fora do âmbito de proteção da lei."

A alternativa B explica o que é colocar fora do âmbito de proteção da lei. Isso se dá quando o Estado se nega a reconhecer a privação de liberdade do indivíduo:

"seguida da recusa em reconhecer a privação de liberdade ou do encobrimento do destino ou do paradeiro da pessoa desaparecida"

Sem o registro do paradeiro da pessoa, não dá para ao menos tentar protegê-la. Essa conceituação não é oferecida pela alternativa C. A alternativa B, sob este aspecto, é mais completa, fazendo mais sentido em termos de definição.

Existe uma regra do universo das "pegadinhas" que diz que a alternativa mais extensa costuma ser a correta, quando o candidato tem uma dúvida como esta. Obviamente, a regra precisa ser temperada, pois não pode ser considerada absoluta. Mas ela faz sentido quando uma resposta oferece mais detalhes ao candidato.

Essa é uma regra de chute, o que estamos tentando evitar aqui. A escolha se deveu a uma maior completude conceitual da resposta, escolhida entre duas cuja a lógica era a mesma, mas com diferentes níveis de profundidade quanto a conceituação. Escolhemos a alternativa mais completa sob este aspecto.

Simples, não parece?

Mais ou menos...

Vamos agora deixar claro alguns pontos para não parecer que a coisa é simples. Não é simples!

Primeiro devemos ter em mente que apenas algumas questões esse tipo de busca é possível, e em todas as hipóteses serão somente naquelas em que o candidato teve dúvida sobre a alternativa correta. Ou seja: só após a resolução das questões que o candidato domina é que ele parte para o uso da lógica em conjunto com a lógica jurídica.

Depois, esse tipo de raciocínio demanda muito tempo.

Vejam: quando uma pessoa domina determinado conteúdo, a identificação da alternativa correta consome muito menos tempo e esforço, pois em termos das conexões cerebrais, o conteúdo está facilmente disponível (memória profunda) e não demanda esforço.

A construção de um raciocínio lógico como os apresentados acima demanda sim muito esforço, em especial na hora da prova, pois o candidato não sabe o conteúdo e tenta, valendo-se do raciocínio, achar o caminho correto.

Logo, essa metodologia é residual, quando não é mais possível achar a resposta por meio do uso do conhecimento específico para aquela determinada questão.

Há de se considerar também que, em troca do uso da lógica, só resta o chute. E o chute é sempre loteria. Se o uso da lógica não for mais possível, se a mente não aguenta mais o esforço, aí o chute está liberado. Melhor chutar a arriscar acertar do que deixar em branco.

Como evitar o ?branco? na hora da prova objetiva da OAB?

Ao fim, nem todas as questões podem ser resolvidas desta forma. Talvez, no máximo uma 15 ou 20. A lógica pode ser buscada a qualquer momento mas o conhecimento específico de determinado assunto pode frustrar a tentativa. Estamos partindo do princípio de que o candidato não sabe nada da questão-alvo, e sob essa premissa que escrevi o texto. Se ele domina alguma coisa, a tentativa pode ganhar mais consistência.

Na disputa entre chute x lógica jurídica, vence o uso do raciocínio.

Mas isso só depois da 1ª etapa da prova ter sido concluída, ou seja, da resolução convencional das questões.