Quarta, 29 de outubro de 2014
Na terça-feira da semana passada, durante a XXII Conferência Nacional dos Advogados Brasileiros, acompanhei o décimo painel do evento, cujo tema era "o Ensino Jurídico, Advocacia e Sociedade".
Já retratei o que aconteceu em parte deste painel, na publicação sobre o futuro da educação jurídica no Brasil:
Agora vou abordar a palestra do ex-presidente da OAB, Dr. Ophir Cavalcante, cujo tema foi a "Essencialidade do Exame de Ordem."
O primeiro ponto abordado pelo ex-presidente foi a expansão do número de faculdades de Direito no Brasil desde 1995. A evolução foi traçada desta forma:
1995 ? 165 faculdades de Direito
2001 ? 505 faculdades de Direito
2014 ? 1284 faculdades de Direito
Isso representa um crescimento de 778,18% no período, algo verdadeiramente assombroso considerando que a qualidade do ensino médio no país não melhorou para o ensino superior acomodar tantos novos universitários.
A "geração do diploma perdido", ou, como o Brasil fabrica profissionais que não sabem trabalhar
Estudantes de Direito têm deficiências do ensino básico
Ophir fez questão de desconstruir uma informação que vem circulando há algum tempo e que não corresponderia a verdade: que o Brasil teria mais faculdades de Direito do que o resto da soma dos demais países.
A China sozinha teria 987 cursos de Direito, para uma população de 1,5 bilhões de habitantes.Já o Brasil tem esses 1284 cursos para uma população hoje de 200 milhões de pessoas. Aí sim residira a discrepância, pois proporcionalmente existem faculdades demais de Direito no Brasil.
Só o estado de São Paulo tem 300 faculdades de Direito - o maior número no país inteiro, mais do que no Estados Unidos, que tem 212 faculdades.
Isso representa, em termos práticos, o seguinte contingente de estudantes e examinandos:
1 - 282 mil novos estudantes por ano
2 - 125 mil examinandos por ano.
A diferença entre ingressantes e examinados se dá pelas desistências e em razão de que nem todos fazem o Exame de Ordem.
Já a segunda informação, de que 125 mil examinandos fazem a prova por ano, quando cada edição tem aproximadamente 110 mil inscritos, pode parecer estranha em um primeiro momento, mas ela faz sentido.
Ano passado o G1 trouxe uma informação muito interessante sobre o desempenho dos candidatos no Exame de Ordem e o aproveitamento dos estudantes nesta prova. Tão somente 18,5% dos candidatos que prestaram o Exame de Ordem entre 2010 e 2012 conseguiram passar na 1ª tentativa. Ou seja: ainda estavam na faculdade, ou saindo dela.
Resumindo, daqueles que irão fazer a prova pela 1ª vez, 81,5% reprovam.
No VIII Exame, por exemplo, de cada 4 inscritos, 3 estavam fazendo a prova ao menos pela 2ª vez, ou seja, só 24,86% dos bacharéis iriam enfrentar para sua 1ª tentativa.
O trecho mais interessante da matéria é este daqui:
"O levantamento da FGV Projetos mostra ainda que 212.498, ou 58,8% do total de bacharéis que fizeram inscrições pelo menos uma vez nessas oito edições, foram reprovados em todas as provas que realizaram. Há ainda um grupo de 5.475 que se inscreveram para todos os oito exames estudados, mas não passaram em nenhuma ocasião.
Dos 148.612 que conseguiram a aprovação, 101.558 passaram na primeira ou na segunda tentativa, e 21.619 precisaram fazer as provas três vezes antes de conseguirem o direito de exercer a profissão.
Outros 25.435 (7,04%) precisaram de pelo menos quatro tentativas para conseguir a aprovação. Dentro desse grupo estão 416 bachareis que fizeram todas as oito edições do exame analisada no cruzamento de dados, e conseguiram passar na última."
Resumindo: a maior parte dos candidatos inscritos no Exame de Ordem, ao menos no período apurado, já fez a prova ao menos uma vez.
O índice médio de aprovação no Exame de Ordem é de 17,46%. Aqui o presidente não especificou o período analisado, mas suponho que se trate do período abrangido pela unificação total do Exame.
Uma pesquisa em conjunto da FGV e da OAB atribui a baixa aprovação no Exame aos cursos que geralmente não investem em pesquisa, extensão e que remuneram mal seus professores, ou seja, o ensino jurídico ruim tem uma influência direta na formação e no exercício da advocacia.
É interessante apresentar aqui um outro estudo, produzido no XI Exame de Ordem, sobre o desempenho das faculdades naquela edição.
Um estudo da Coordenação de Exame Unificado do Conselho Federal da OAB mostrou que a grande maioria das faculdades aprovou entre 10% e 20% dos seus alunos no XI Exame de Ordem e que cerca de 90% delas aprovaram número abaixo de 50%.
Considerando o Exame como um filtro para o mercado, os dados mostram a precariedade do ensino jurídico atual.
Seguem abaixo dados estatísticos do XI exame de ordem divididos por Seccional, com o desempenho das instituições:


























Os dados completos podem ser vistos aqui: XI Exame de Ordem - resultados detalhados da 1ª fase
Ophir Cavalcante ressaltou bastante uma conquista ocorrida em sua gestão: o reconhecimento da constitucionalidade do Exame pelo STF.
Íntegra do voto do Ministro Marco Aurélio
Ressaltou também a previsão de provas de suficiência em vários ordenamentos jurídicos, não sendo uma "jabuticaba" criada no Brasil, e sim algo de âmbito internacional. Estados Unidos, Alemanha (ao encerrar o curso, submete-se a uma prova oficial, depois um estágio supervisionado e depois mais uma prova) Canadá e França foram alguns dos exemplos dados.
Por fim, o ex-presidente constatou a existência de 48 referências à OAB e a advocacia na Constituição, prova cabal da importância da profissão e da necessidade da manutenção do Exame de Ordem como balizador da qualidade para a classe.