Segunda, 25 de julho de 2016
O professor Matheus Carvalho elaborou um recurso para a questão em que AMria é atingida por um bloco de concreto.
Confiram abaixo a fundamentação dele:
A banca examinadora indicou como gabarito a alternativa "C". Contudo, diante da análise da questão, a assertiva "D" também deve ser considerada como correta, pois encontra-se totalmente de acordo com os ensinamentos firmados pela doutrina e jurisprudência nacional.
Neste sentido, com o objetivo de demonstrar que a alternativa "D" está correta, deve-se esclarecer inicialmente que a questão, ora analisada, descreve uma situação que aborda o tema da responsabilidade civil do Estado decorrente de obras públicas.
Este tema deve ser analisado diante de enfoques diferentes. Isso porque existem situações em que os danos decorrem da má execução da obra pública e, em outros casos, o dano decorre da existência da obra em si e não de sua execução indevida.
Nas hipóteses em que o dano decorre da existência da obra em si, afirma-se que a responsabilidade decorre pelo simples fato da obra. Assim, nestes casos, a obra causa o dano sem que tenha havido culpa de alguém, ou seja, o dano não decorre de sua má execução, mas sim da existência da obra. Com efeito, o simples fato de a obra existir poderá vir a causar um dano ao particular.
Já na situação apresentada pela questão, aplica-se a responsabilidade decorrente da má execução da obra: nesses casos, para fins de definir a responsabilização, é indispensável perquirir quem estava executando a obra.
Justifica-se: há hipóteses nas quais a obra é executada pelo próprio Estado e, nestes casos, a responsabilidade objetiva é indiscutível, uma vez que a conduta do agente público está ensejando um dano ao particular, em perfeita subsunção do dispositivo constitucional. Nas palavras de José dos Santos Carvalho Filho ?se por alguma razão natural ou imprevisível, e sem culpa de alguém a obra pública causa dano ao particular dar-se-á a responsabilidade objetiva do Estado?.
Já nas situações em que a obra é executada por uma empresa executora de obra, sua responsabilidade é regida pelo direito privado, uma vez que não se encontra abarcada pelo art. 37, §6º da Carta Magna, que trata somente de particulares que atuam, na prestação de serviços strictu sensu.
Nestes casos, portanto, a responsabilidade da empresa é regida pelo direito privado e se configura objetiva, nos moldes do art. 937 do Código Civil e da doutrina civilista acerca da responsabilidade civil pela coisa caída.
Por seu turno, a responsabilidade do município somente se configura se for demonstrada a ausência do dever de fiscalização do contrato firmado. Com efeito, a responsabilidade do município não é solidária ou subsidiária, decorrendo sim da sua omissão no dever de fiscalização, como bem traduz a letra ?d? da questão. Nesse sentido, pode se verificar a doutrina de: José dos Santos Carvalho Filho (Página 517, 24ª edição, 2011 ? Manual de Direito Administrativo), assim como Helly Lopes Meireles (Página 3568, 22ª edição, Direito Administrativo Brasileiro), José Cretella Junior (Página 337, O Estado e a obrigação de Indenizar. Rafael Carvalho Rezende Oliveira (Página 722, 1ª edição, Curso de Direito Administrativo), Matheus Carvalho (Página 342, 3ª edição, Manual de Direito Administrativo).
Assim, a alternativa "D", de maneira correta afirma que a empresa contratada responde de forma objetiva e que a responsabilidade do município dependerá da comprovação de que este foi omisso no dever de fiscalização do contrato.
O enunciado da questão indica os três elementos que configuram a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica prestadora de serviço público. Neste sentido, vale destacar que a questão afirma que em razão da desatenção de um dos funcionários que trabalhava na execução da obra pública, um bloco de concreto se desprendeu da estrutura principal e atingiu o pé de Maria, causando danos.
Com efeito, neste tipo de situação apresentada pela banca examinadora, a responsabilidade do ente público é subjetiva, desde que se comprove a não fiscalização do contrato por parte do ente público contratante. Sendo assim, a responsabilização do Estado decorre do fato de que foi omisso no dever de fiscalização do contrato celebrado. Vejamos o posicionamento da jurisprudência pátria neste sentido.
TJ-MG - Apelação Cível AC 10313100228441001 MG (TJ-MG)
Data de publicação: 25/01/2013
Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. MUNICÍPIO DE SANTANA DO PARAÍSO. RESPONSABILIDADE CIVIL. INUNDAÇÃO RESIDENCIAL POR LAMA E ÁGUAS PLUVIAIS. FALTA DE INFRA-ESTRUTRURA, MANUTENÇÃO DAS MANILHAS DE DRENAGEM EFISCALIZAÇÃO DE OBRAS IRREGULARES. CONDUTA OMISSIVA DO ENTE MUNICIPAL. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. NEGLIGÊNCIA. INDENIZAÇÃO DEVIDA. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. SENTENÇA MANTIDA.
I. Se o dano alegado adveio de uma omissão do Município, trata-se de responsabilidade subjetiva, pelo que se faz necessária a comprovação da conduta negligente do agente público, bem como do nexo de causalidade entre esta e o evento danoso.
II. Resta evidente o dever de indenizar se o contexto probatório demonstra que os prejuízos sofridos pelos autores foram decorrentes da péssima infra-estrutura para a captação e canalização das águas da chuva e, também pelo fato de o Município não ter construído meio fio, nem promovido a pavimentação das ruas do bairro, tampouco realizado a manutenção preventiva nas manilhas de drenagem pluviométrica e fiscalizado as obras irregulares feitas por moradores;
III. Os juros de mora são devidos a partir do evento danoso, nos termos da Súmula 54 do STJ e a correção monetária, em se tratando de dano moral, deve incidir da fixação definitiva, a data da publicação do acórdão.
IV. A correção monetária não significa um plus, mas mera atualização do valor arbitrado na sentença, servindo apenas para que expressões diferentes pela época, representem um mesmo valor. Os juros de mora são devidos, como consectário lógico da condenação, de tal sorte que não há de se falar em reformatio in pejus, em razão desses acréscimos ao valor da indenização.
TJ-PR - Apelação Cível AC 1396723 PR 0139672-3 (TJ-PR)
Data de publicação: 23/09/2003
Ementa: AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS - SUPOSTA FALTA DE LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM - INOCORRÊNCIA - ALEGAÇÃO DE PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL PELO "CUSTOS LEGIS" - POSSIBILIDADE - DECLARAÇÃO COM RELAÇÃO AO MUNICÍPIO DE LONDRINA - NEXO DE CAUSALIDADE DEMONSTRADO - NEGLIGÊNCIA NA FISCALIZAÇÃO DE OBRA - DANO MORAL E DANO ESTÉTICO - NÃO CUMULAÇÃO - QUANTUM INDENIZATÓRIO - MAJORAÇÃO - PROVIDO PARCIALMENTE O APELO DE MARIA TEREZA MARANDOLA - DEMAIS APELOS NÃO PROVIDOS.
1.Ao Juiz é vedado conhecer, de ofício, da prescrição, mas o Ministério Público tem legitimidade para argüi-la, mesmo quando atua como "custos legis".
2. Detém legitimidade passiva ad causam, respondendo pelos danos morais causados, aquele que age com negligência na fiscalização de execução de obra.
3.Não cabe cumulação de dano moral com dano estético, já que este se encontra abrangido por aquele. Súmula 37 do STJ.
4.Os critérios de punição e satisfação, inerentes às condenações por danos morais, devem ser observados para a fixação do quantum indenizatório.
Assim, com base em toda a fundamentação exposta, não resta dúvidas sobre a validade da alternativa "D", pois de acordo com a doutrina e jurisprudência pátrias, na hipótese apresentada pela banca examinadora, a empresa contratada responde de forma objetiva, mas a responsabilidade do Município demanda comprovação de culpa na ausência de fiscalização da obra, razão pela qual a anulação da questão se impõe.