Quarta, 1 de setembro de 2010
Nem bem publiquei a pesquisa sobre o Exame de Ordem realizada pela FGV em parceria com a OAB e já surgiu uma polêmica.
Primeiramente vamos aos dados da pesquisa:
1 - 1500 entrevistados, todos inscritos no Exame de Ordem 2010.1;
2 - 82% favoráveis ao Exame (seriam 1230 candidatos);
3 - 23% culpam os próprios candidatos pela fraca aprovação no Exame;
4 - 34% culpam as faculdades;
5 - 29% culpam o grau de dificuldade das provas;
6 - 60% (seis em dez) já fizeram a prova uma ou duas vezes;
7 - 70% (sete em dez) fizeram cursinho preparatório.
São informações muitíssimo interessantes, capazes de render um longo e abrangente debate sobre o Exame de Ordem.
Alguns aspectos merecem ser ressaltados.
Primeiro é que a pesquisa foi feita com um universo de pessoas relativamente pequeno e bem delimitado - Os próprios inscritos no Exame de Ordem, por amostragem.
Recentemente a Agência Senado patrocinou uma pesquisa de opinião aberta aos usuários da internet sobre o Exame da OAB - Ampla maioria dos votos em enquete indica apoio ao fim da prova da OAB - onde o percentual de rejeição do Exame foi de 94,3 % dos votos.
O Correioweb também realizou uma pesquisa com o mesmo tema - Avaliação da OAB (Exame de Ordem) é reprovada na internet - e o percentual de reprovação do Exame também foi elevado (92%).
Aqui eu trato do primeiro ponto da polêmica.
Na postagem sobre a pesquisa realizada pela FGV - Pesquisa da FGV mostra perfil de candidatos ao Exame da OAB - Muitos internautas questionaram sua validade.
De fato tal pesquisa foi realizada entre os inscritos no Exame 2010.1, e isso inclusive foi ressaltado aqui no Portal - Pesquisa de opinião com o inscritos no Exame de Ordem 2010.1 - e debatido na nossa Comunidade no Orkut no dia 5 de agosto.
Vejam as perguntas feitas aos candidatos:
1. Se tomou conhecimentos sobre as recentes denúncias de fraudes no Exame de Ordem; 2. Se acompanhou as tais denúncias; 3. Se teve alguma informação de vazamento da prova antes da realização da prova; 4. Se foi prejudicado com a anulação da prova; 5. Quantas vezes fez o Exame; 6. Se fez cursinho preparatório; 7. Se é contra ou a favor do Exame de Ordem; 8. Se estudou em faculdade pública ou particular; 9. Se o nível da faculdade cursada é ótima, boa, regular, ruim ou péssima; 10. Qual a melhor faculdade de Direito do Brasil; 11. Qual a imagem que tem das seguintes faculdades e dar uma nota de zero a fez: USP, PUC-Rio, PUC-SP, FGV, UERJ, Mackienze-SP, Mackienze-Rio e UNB; 12. Se é contra ou favor da prova ser aplicada por uma banca que não seja da própria OAB; 13. Que imagem tem da OAB; 14. Quais os serviços que sabe que a OAB presta para a sociedade; 15. Qual a avalização que faço da Revista da OAB, da Ouvidoria e dos Cursos da OAB; 16. Qual a importância do Exame de Ordem para avaliar os conhecimentos: muito importante, pouco importante, indiferente, nada importante. 17. Se a prova da OAB é simples ou complexa; 18. Por que tem um número de reprovação muito grande no exame: Baixo preparo dos candidatos; baixa qualidade das faculdades, prova muito difícil e outros 19. Qual a avaliação que tem da CESPE/UNB; 20. Se o fato da FGV também ter curso de direito: afetaria a lisura do exame, não comprometeria a lisura do exame pois a FGV é uma instituição séria, indiferente; 21. Se a troca da CESPE pela FGV foi positiva ou negativa; 22. Se sabe quem realiza a prova da OAB: a OAB Nacional ou as Seccionais; 23. Se é contra ou a favor de outras profissões se submeterem ao um Exame como o Exame de Ordem.
Há de se ressaltar que tanto a pesquisa da Agência Senado com do Correioweb foram abertas ao público em geral, sem nenhum tipo de monitoramento. Ou seja, desprovidas de um maior rigor na aferição dos dados.
O próprio site da Agência Senado deixou isso claro:
"Sem expressar rigorosamente a opinião de toda a população, pois para isso seria necessária pesquisa com padrões de amostragem com valor estatístico..."
O Correioweb também não se furtou em analisar o resultado de sua própria pesquisa:
"Os resultados, no entanto, são fruto da mobilização dos integrantes do Movimento Nacional dos Bacharéis em Direito (MNBD), uma organização criada em 2007 por estudantes, acadêmicos e pessoas formadas de todo o país para lutar contra o exame pós-diploma como exigência para se inscrever no órgão fiscalizador nacional. Além de atuar junto a parlamentares no apoio a projetos de lei contrários à prova ou sugerindo mudanças nas avaliações da OAB, o grupo questiona a constitucionalidade do exame em vários tribunais regionais do país, pois acredita que o exame fere o princípio do livre exercício das profissões. Para eles, a obrigatoriedade vai de encontro à lei de diretrizes e bases da educação no que se refere à autonomia das universidades de habilitar e qualificar os bacharéis para o exercício da profissão."
De fato a OAB tem um interesse no Exame e na sua perpetuação mas, em princípio, não se imagina que uma instituição séria como a Ordem, ladeada por outra instituição séria como a FGV, em conjunto, modificariam o resultado de tal pesquisa para atender seus próprios interesses, até porque essas pesquisas têm princípios e rigores metodológicos próprios e muito provavelmente as informações foram devidamente registradas.
Ademais, a pesquisa foi feita exclusivamente com o público diretamente envolvido na polêmica - Os bacharéis em Direito. São eles que sofrem com o Exame, com o drama da reprovação e o fantasma da não-inclusão no mercado de trabalho.
O tema é polêmico, pois o Exame é alvo de questionamentos tanto no STF como no Congresso Nacional, e seu fim traria enormes repercussões no Poder judiciário como um todo, principalmente no mercado de trabalho, assim também como sua perpetuação representa atualmente a exclusão de centenas de milhares de bacharéis da profissão de advogado.
Sobre o RE no STF, confiram o vídeo abaixo, de 23/07/2010:
No Senado tramita uma PEC sobre o tema - 01/2010 - A PEC altera a redação do art. 205 da Constituição Federal, introduzindo um parágrafo que elimina a necessidade aprovação em provas complementares, incluindo o Exame da OAB.
Também tramita no Senado o PLS 186/2006, que prevê expressamente o fim do Exame de Ordem. Esse PLS já foi consideravelmente desfigurado sob a relatoria do Senador Marconi Perillo, e hoje dá outro enfoque ao Exame, e não simplesmente impõe seu fim. Também poderíamos mencionar os Projetos de Leis 2.195/07 e 2.426/07, que não repercutem muito na mídia.
Aparentemente trata-se mais de uma batalha midiática do que efetivamente se tomar o pulso dos reais interessados sobre a necessidade ou não do Exame de Ordem.
A OAB tem seus argumentos, e eles são muito pertinentes. O MNBD também tem seus argumentos e eles também são pertinentes.
Acredito que a pesquisa da Ordem seja séria, o que mostra uma visão dos próprios bacharéis sobre a prova, mas não se pode ignorar a mobilização daqueles que não conseguiram passar no Exame.
O embate, antes de ser técnico, é político. É a expressão do antagonismo entre dois grupos de poder distintos, cada uma na luta para fazer prevalecer seus interesses, considerando que ambos são integralmente legítimos.
E nesse jogo, a Ordem dos Advogados do Brasil tem muito mais balas na agulha para disparar...
O julgamento no STF tem uma peculiaridade relevante: Ele tratará da raiz do debate sob o ponto de vista técnico: A constitucionalidade do Exame de Ordem.
Se for considerado inconstitucional, a OAB terá de fazer das tripas coração para achar uma solução política de forma urgente no sentido de relegitimá-lo, se é que o conseguirá.
Se for considerado constitucional, o MNBD perderá sua principal bandeira e ficará adstrito somente ao campo do lobby político, despido de seu principal argumento. Ou seja, perderá o embate.
Atualmente o RE 603583 está no MPF e é provável que seja devolvido ao Ministro Relator em breve. Acredito que até o ano que vem esse recurso seja julgado no STF.
Então essa história ganhará contornos finais.
Façam suas apostas.