Segunda, 5 de julho de 2010
Foi eleito no domingo o novo presidente da OAB Federal, o Dr. Ophir Cavalcante Júnior (no centro da foto, conjuntamente com os novos membros da diretoria), para presidir a OAB no triênio 2010-2012.
A entrevista "A Ordem não vai ingressar em discussões de varejo" foi publicada na edição de ontem (31) do jornal Diário do Nordeste (CE). Trago parte dessa entrevista, relacionada ao Exame de Ordem. Os trechos mais interessantes foram destacados:
(...)P - Hoje se fala no alto índice de reprovação do exame da Ordem. Qual será o foco na formação do advogado?
R - Essa é uma responsabilidade de todos, da sociedade, do governo, através do MEC, das Instituições de Ensino Superior e da própria Ordem dos Advogados do Brasil. A nossa ideia é criar um grande fórum de discussões a respeito disso, envolvendo todas esses segmentos, para que a gente possa ter uma luta identificada a respeito das nossas deficiências. E a partir daí, construir cursos de qualidade, voltados para os interesses da sociedade. Não apenas informar, mas formar com cultura crítica dos advogados profissionais. E a Ordem quer colaborar. Mas, ao lado disso, a Ordem não vai abrir mão de uma fiscalização, da denúncia, de exercer o papel que sempre teve e continuará na luta pela qualificação do ensino. O Cezar Britto (ex-presidente da OAB nacional) tem um posicionamento que eu acompanho, de que a defesa da qualidade do ensino jurídico é a defesa da sociedade.
P - Como seria esta qualificação?
R - O promotor e o juiz passam por um concurso muito difícil. Eles estão, portanto, qualificados para exercer as suas atividades profissionais. Vamos ter um promotor qualificado, que é aquele que acusa. O Estado que julga através do juiz. E aquele que defende não está qualificado. Então para que haja um equilíbrio de forças entre as partes é necessário que o advogado esteja qualificado. Por isso, nós defendemos uma qualidade melhor dos cursos. Acho que essa postura da Ordem tende a desagradar a muita gente, como os cursos que não tem essa consciência de sua responsabilidade social, mas a Ordem não teme, em absoluto, qualquer demanda no sentido de acabar com o exame de Ordem, com o poder da OAB de fiscalizar. Temos certeza de que o Congresso Nacional está consciente do papel da Ordem. Nós vamos trabalhar para que esse papel seja cada vez mais intensificado e cada vez mais presente na sociedade brasileira.
P - O surgimento de novos cursos vem diminuindo a qualificação dos profissionais. Qual a tendência daqui pra frente?
R - A partir da gestão do Cezar Britto nós tivemos uma mudança qualitativa na participação da Ordem no MEC nestas discussões para melhorar a qualidade do ensino. Há mais de dois anos não se cria um novo curso de Direito no Brasil e, neste período, já foram extintas quase 30 mil vagas nos cursos de Direito. Havia um crescimento muito grande de cursos e a qualidade fica prejudicada. Tem de haver uma somatória de compromissos; da formação profissional, da formação educacional, que vem desde a família e dos ensinos Fundamental e Médio até Superior. Este é o primeiro compromisso que o Estado deve ter, que é formar melhor o cidadão. Outro compromisso, é das próprias instituições de ensino superior. Elas não podem fazer mercantilização do ensino. As instituições têm de formar cidadãos qualificados para poder exercer com dignidade e com competência aquilo que estão propondo que as pessoas se formem, porque senão vai ser um engodo, um conto do vigário educacional. É aquela lógica perversa, em que uns fingem que ensinam, outros fingem que aprendem e fica tudo bem como dantes. O que nós queremos é mudar essa lógica que não atende aos interesses da sociedade brasileira. (...)
Fonte: OAB Federal
A partir dessa entrevista é perfeitamente possível antever o futuro do do Exame de Ordem: Uma prova cada vez mais e mais difícil.
É necessário uma nova visão sobre o Exame. Somemos os seguintes elementos:
1 - A mudança na prova prática, não só mais bem elaborada do que suas antecessoras como também mais exigente no aspecto do raciocínio jurídico;
2 - A inclusão da Disciplina Direitos Humanos a partir do Exame 3/2010;
3 - A supressão da consulta de doutrina e jurisprudência na 2ª fase;
4 - O fim do arredondamento;
5 - A limitação de mil caracteres para a elaboração dos recursos nas duas fases do Exame;
6 - A inclusão das disciplinas do eixo fundamental de formação, ainda a serem selecionadas pela OAB, entre as determinadas pelo Conselho Nacional de Educação na Resolução 9/2004: Antropologia, Ciências Políticas, Economia, Ética, Filosofia, História, Psicologia e Sociologia.
Ainda não é possível discorrer sobre a nova concepção da prova subjetiva, se será mais simples ou manterá o mesmo padrão até então apresentado. Só a partir do dia 28 de fevereiro nós saberemos.
De toda forma, fica muito clara a nova filosofia que norteará o Exame. Ela está bem descrita neste trecho da entrevista do Dr. Ophir Cavalcante Júnior:
"O promotor e o juiz passam por um concurso muito difícil. Eles estão, portanto, qualificados para exercer as suas atividades profissionais. Vamos ter um promotor qualificado, que é aquele que acusa. O Estado que julga através do juiz. E aquele que defende não está qualificado. Então para que haja um equilíbrio de forças entre as partes é necessário que o advogado esteja qualificado."
Na visão da Ordem, o advogado é o elo fraco da pirâmide composta também pelo Ministério Público e pela Magistratura, principalmente em razão do péssimo ensino jurídico ofertado pelas Instituições de Ensino Jurídicas.
A solução reside em um Exame de Ordem mais severo, aproximando seu grau de dificuldade com os concursos das outras duas carreiras (a questão é saber o quanto será aproximado), o que obrigaria às Instituições de Ensino a mudarem suas grades curriculares e exigirem mais de seus discentes. Um reflexo disso é a inclusão de disciplinas Direitos Humanos, Antropologia, Ciências Políticas, Economia, Ética, Filosofia, História, Psicologia e Sociologia.
Mas resolver o problema do ensino jurídico no Brasil tornando o Exame de Ordem mais difícil poderia ser considerado apenas como uma solução no melhor estilo "gambiarra".
Se, como aduziu o novo presidente, existem instituições que aplicam um verdadeiro "conto do vigário educacional", não seria mais adequado fechá-las?
Meramente impedir o surgimento de novas faculdade não altera o problema do excesso de instituições. Depois, fechar 30 mil vagas não faz uma grande diferença em um universo de centenas de milhares de vagas hoje existentes. O Brasil tem, de longe, o maior número de faculdades de direito no mundo com a maior população de bacharéis de direito. É óbvio que isso representa uma distorção.
Se o MEC fechasse, de um dia para outro, dois terços dessas faculdades, não estaria cometendo nenhuma injustiça. Cliquem neste link AQUI, escolham as estatísticas de qualquer Exame de Ordem e contem o número de faculdades que aprovam mais de 30% dos seus egressos. Vocês vão tomar um susto. Se o Exame de Ordem tem a finalidade de aferir conhecimentos mínimos dos bacharéis, facilmente se percebe que o ensino jurídico no Brasil está podre, e as estatísticas não me deixam mentir.
Logo, como está fica, e o exame é apresentado como solução para "corrigir" essa distorção. Esse não deveria ser seu papel.
A atual situação pode ser classificada como uma "normose". Um exemplo de normose: Algumas décadas atrás, fumar era chique, mesmo fazendo mal à saúde. Ou seja, uma situação considerada normal, apesar de fazer mal, é amplamente aceita pela sociedade.
Centenas e centenas de faculdades, milhares de cursinhos, milhões de bacharéis, etc, etc. A grande verdade é que a situação atual não só está constituída como também sedimentada. Qualquer pretensão de se reformar o atual modelo esbarrará inequivocamente em MUITOS interesses, e interesses capazes de fazer valer suas posições.
Daí a normose. Não pode ser normal que 4 milhões de bacharéis que gastaram 280 bilhões de reais para se formarem fiquem fora do mercado.
Sim, eu escrevi 280 bilhões de reais. Multiplique 70 mil reais (preço médio de um curso de Direito) por 4 milhões (número de bacharéis que não conseguiram passar no Exame de acordo com dados da própria OAB). Levando-se em conta que mais de 80% dos bacharéis das universidade públicas passam na prova, esse valor se aproxima bastante daquele efetivamente gasto até então.
280 bilhões a título de quê? De um diploma que na prática não vale nada? De uma profissão que nunca poderá ser exercida?
Em suma, TUDO precisa ser repensado, mas, aparentemente, NADA será feito. Todo exame é a mesma ladainha: "Oh, 87% de reprovação na 1ª fase, que absurdo!!" Só quem trata superficialmente desse assunto se impressiona com esses dados. A lógica do sistema requer tantas reprovações para que o próprio sistema em si continue operacional. As faculdades faturam, vendendo um "curso de direito", as editoras faturam, a OAB mantém o "mercado" saneado, sem "tantos" profissionais, os cursinhos faturam, dada a enorme demanda, e....só não fatura quem pagou pelo ensino superior pensando que teria direito a uma profissão no final do curso.
A OAB deveria fazer campanha aberta para fechar as faculdades "estelionatárias". E são centenas delas.
Para mim, a Ordem dos Advogados do Brasil simplesmente não tem força para fazer isso. Logo, um Exame de Ordem mais difícil é a solução.
A conta vai para o bolso dos reprovados.