Quarta, 18 de setembro de 2013
O deputado federal Fábio Trad (PMDB-MS) finalmente apresentou o relatório quanto aos vários Projetos de Lei que têm como tema o Exame de Ordem. E, curiosamente, ele faz apenas uma proposta: a de incluir a repescagem uma única vez no Exame de Ordem.
Ou seja: todos os projetos contra o Exame, incluindo aí o PL do deputado Eduardo Cunha, estão para ser arquivados na Comissão de Constituição e Justiça.
E como isso foi acontecer? Eu explico desde o começo.
No dia 24 de agosto de 2011 a Ordem usou de sua influência política para retirar o deputado Eduardo Cunha da relatoria do novo projeto do Código de Processo Civil. A indicação de Eduardo Cunha havia sido contestada por ele não ter formação jurídica, e tal formação seria imprescindível para o projeto em questão.
Magoado, o deputado à época questionou durante a OAB e atacou o Exame de Ordem. O problema é que a OAB não avaliou corretamente o tamanho da influência do parlamentar, e este, ao receber manifestações de apreço dos bacharéis contrários ao Exame após suas indignadas tuitadas, comprou a briga e resolveu partir para a retaliação.
Assim nasceu sua animosidade, ao menos publicamente, contra o Exame de Ordem, calcanhar de Aquiles da OAB.
O deputado rapidamente apresentou um projeto de lei visando extinguir a prova da Ordem (PL 2154/2011). Este PL foi apensado a vários outros projetos favoráveis e contrários ao Exame, todos sob a relatoria do deputado Marco Feliciano, relator do PL 5.054/05 que aglutinou em si todos os projetos que tratam do Exame de Ordem. Eis o substitutivo apresentado pelo deputado a todos os projetos reunidos no apenso:
SUBSTITUTIVO AO PROJETO DE LEI No 5.054, DE 2005
Extingue o Exame de Ordem para a inscrição na Ordem dos Advogados do brasil.
O Congresso Nacional decreta:
Art. 1º Esta Lei extingue o Exame de Ordem para inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil.
Art. 2º Dê-se caput do art. 3º da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, a seguinte redação:
?Art. 3º O exercício da atividade de advocacia no território brasileiro e a denominação de advogado são privativos dos inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), mediante requerimento e concedidos automaticamente após a graduação em Direito, obtido em instituição de ensino oficialmente autorizada e credenciada, observados os demais requisitos do art. 8º, exceto o disposto no inciso IV e § 1º. ?(NR)
...............................................................................................................................
Art. 2º Revogam-se o inciso IV e o § 1º do art. 8º e o inciso VI do art. 58 da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, colocando-se ao final dos artigos as letras (NR).
Art. 3º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala da Comissão, em de de 2012.
Deputado PASTOR MARCO FELICIANO
Relator""
E a animosidade de Eduardo Cunha chegou ao ponto máximo após um evento que catalizou a atenção de muitos, mas muitos parlamentares.
No dia 19 de abril de 2012, na posse do Ministro Ayres Britto na presidência do STF, o presidente da OAB, Ophir Cavalcante, criticou severamente o Congresso Nacional, chamando-o de "pântano". O Conjur elaborou uma matéria sobre este discurso e adequadamente lhe deu o seguinte título: Presidente da OAB afirma que Congresso é um pântano. Vejam o trecho do discurso de Ophir Cavalcante em que ele ataca o parlamento:
""Antes que sejam ligados os holofotes, precisamos refletir ? e refletir seriamente ? sobre um dado inegável: na origem de todos os grandes escândalos está o modelo de financiamento privado das campanhas políticas, que permite o ?caixa dois?, ou, em outras palavras, a relação promíscua entre o interesse privado e a coisa pública. É sempre assim.
E o resultado é que a cada eleição, se de um lado tomam posse os eleitos, nas sombras, outro poder se instala, apropriando-se dos negócios públicos e dando as cartas no jogo. E manda tanto que quando cai arrasta, junto de si, numa grande cascata, bicheiros, contraventores, falsificadores, arapongas, policiais, governadores, parlamentares, servidores, empresários, projetos, obras, e, também, a própria credibilidade nas instituições. Este, sim, nos parece o verdadeiro apocalipse.
O Congresso Nacional, o Parlamento em todos os níveis, tornou-se, para usar uma expressão de Monteiro Lobato, um pântano, onde muito se discute, mas nada é feito de concreto para melhorar o ambiente, que continua sendo o de um pântano. Com honrosas exceções, é claro, o Parlamento tem servido de balcão de negócios para muitos políticos, contribuindo para desgastar ainda mais a imagem das instituições.""
Desse dia em diante os habitantes do tal "pântano" se irritaram e começaram a cutucar exatamente a parte mais fraca da OAB: o Exame de Ordem.
Curiosamente, no próprio dia 19 de abril, o deputado Eduardo Cunha, maior cruzado contra o Exame de Ordem, conseguiu a adesão de uma das lideranças da Câmara. O primeiro e imediato reflexo do que estava por vir:
"Eduardo Cunha intensificou a cruzada contra o exame da OAB. O deputado conseguiu a assinatura do Jilmar Tatto, líder do PT na Câmara, para a urgência na tramitação do projeto que trata sobre o fim da prova da Ordem. Outros líderes prometeram assinar o documento."
Deputado luta por urgência na tramitação de projeto que trata do fim do Exame de Ordem
Na esteira, a OAB impôs seu jogo e retirou de pauta um Projeto de Lei que determinava a eleição direta da diretoria do CFOAB - Proposta de eleição direta para OAB é retirada de pauta na CCJ - Deputado reclama de "pressão" - e o líder do PR, deputado Lincoln Portela (MG), reclamou de uma pressão da OAB contra esse projeto.
As lideranças na Câmara, depois de tantas interferências e adjetivações, resolveram aderir à luta de Eduardo Cunha e dar um troco na OAB, aderindo em peso ao projeto contrário ao Exame - Projeto de Lei que visa o fim do Exame de Ordem recebe apoio das lideranças na Câmara dos Deputados - Quase todos os líderes assinaram o pedido de urgência na votação.
Alguns membros da OAB passaram a atacar Eduardo Cunha, tal como mostra exemplificativamente um nota publicada no blog do Anselmo:
Do presidente da OAB do Rio, Wadih Damous, sobre o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que, "em vez de apresentar projetos de lei, tenta emplacar suas proposições durante as apreciações das medidas provisórias editadas pelo governo" (em várias MPs, o deputado apresentou emenda propondo o fim do exame da OAB):
- Trata-se de uma monstruosidade e mostra o nível de determinados setores do parlamento brasileiro. Medidas provisórias como essas são manifestadamente inconstitucionais. Não é possível que o ódio que o deputado Eduardo Cunha nutre pela OAB venha produzir uma legislação de vingança. O deputado deve procurar tratamentos alternativos para os seus ressentimentos.
Fonte: Blog do Anselmo
A partir daí vários debates ocorreram no 2º semestre de 2012 dentro da Câmara, em especial as três audiência públicas ocorridas em três distintas comissões da casa:
Em audiência pública, MEC apoia exigência do Exame de Ordem
Rápida análise da audiência pública sobre o fim do Exame de Ordem
Deputados divergem sobre o fim do exame da OAB
Notícias sobre a audiência pública contra o Exame de Ordem
Confiram a íntegra da audiência pública de ontem sobre o Exame de Ordem
Sobre a audiência pública de hoje na Câmara dos Deputados
E o desfecho do tema em 2012 foi muito tenso. Após articular nos bastidores, Eduardo Cunha finalmente conseguiu colocar ao menos a urgência na votação do substitutivo ao PL 5.054/2005 para ser deliberada em plenário, e fez no dia 04/12/2012. A OAB, ciente destas movimentações, articulou seus interesses na casa conseguiu impor uma relevante derrota ao deputado:
ATENÇÃO! Câmara dos deputados REJEITA a urgência no PL contra o Exame de Ordem
Como interpretar a vitória da OAB e do Exame de Ordem na Câmara dos Deputados?
Deputados se dividem sobre fim do exame da OAB e rejeitam urgência do texto
Os bastidores da OAB na votação de ontem na Câmara
Um conselheiro da OAB me contou por cima como foi a atuação da Ordem na defesa do Exame de Ordem nesta votação. Os membros do Conselho Federal há muito já vinham articulando nos bastidores a defesa do Exame na Câmara. Quando a pauta foi definida com clareza, a atuação deles acabou sendo decisiva.
E assim terminou 2012.
Agora uma pergunta importante para a compreensão do problema: o que representou, exatamente, a perda da urgência no Plenário da Câmara?
Isso significa, em termos simples, que a votação de todos os projetos contrários e favoráveis ao Exame de Ordem (todos apensados a um único projeto, o mais antigo) não serão votados no Plenário da casa, e sim na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Eduardo Cunha não queria isso, pois sabe bem que essa Comissão é composta, em boa parte, por juristas, e estes não são simáticos ao fim do Exame da OAB. Ir para a CCJ representaria, em uma boa medida, uma possibilidade de derrota.
Mas até então, a relatoria de todos esses projetos, na CCJ, era do deputado Marcos Feliciano, aliado de Cunha e também contrário ao Exame.
Veio 2013, Eduardo Cunha passou a ser líder do PMDB na Câmara, um cargo que concentra muito poder e as perspectivas contra a prova da OAB não era das melhores.
Mas aí aconteceu a "virada da maré"!
O deputado Marcos Feliciano, então relator, passou a ser presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados. Isso gerou um grande rebuliço na sociedade, redes sociais se na mídia, jogando o deputado-pastor dentro do olho do furacão, fato este público e notório.
E a relatoria dos PLs contra o Exame foi esquecida...
Percebendo o vácuo, a OAB, sem alarde, se mobilizou e conseguiu nomear um novo relator, o deputado Fábio Trad, ex-presidente da OAB/MS.
Quando a relatoria é deixada, o novo relator pode apresentar um novo relatório, descartando o relatório anterior. E foi o que Fábio Trad fez.
Ao apresentar o novo relatório, ele DESCARTOU todos os projetos apresentados, exceto um, que será votado pela CCJ. Confiram o texto do único projeto encampado pelo deputado:
Mas olhem só! O texto do projeto escolhido pelo deputado Fábio Trad é IGUAL a proposta aprovada na sexta-feira passada pelo Colégio de Presidentes da OAB: uma reprovação na 2ª fase permite que o candidato faça a 2ª fase subsequente uma única vez!
Igualzinho!
IMPORTANTES mudanças no horizonte do Exame da OAB! Aproveitamento da 2ª fase é uma delas!
Colégio de presidentes da OAB autoriza modificações no Exame de Ordem! ?Repescagem? é aprovada!
OAB quer que ?repescagem? seja implementada já no próximo Exame de Ordem
A Carta de João Pessoa e todas as mudanças no Exame de Ordem
Ou seja: o novo provimento do Exame de Ordem que está por vir apenas é a reprodução do futuro texto legal!
Futuro?
Pois é, a Ordem realmente tem uma grande influência na CCJ, e muito dificilmente o relatório do deputado Fábio Trad deixará de ser aprovado.
Na prática, o que isso significa?
Significa que, caso algum parlamentar queira apresentar um novo projeto contra o Exame de Ordem, ele só o poderá fazer na PRÓXIMA legislatura. Ou seja, só em 2015!
Uma vez arquivados todos os projetos contra a prova, sendo aprovado o relatório do Fábio Trad, os demais Projetos apensados ao projeto original são arquivados e perdem suas respectivas validades. O parlamentar contrário ao Exame terá de começar do zero, e só o poderá fazer em 2015, quando se dará início a próxima legislatura.
Considerando o tempo que levou para o mais antigos dos PLs chegar a CCJ (8 anos), talvez voltemos a ter uma nova discussão sobre o fim do Exame de Ordem, caso o relatório de Trad seja aprovado, lá por volta de 2020.
Sim! é por volta de 2020 mesmo, considerando o tempo médio de tramitação deste tipo de projeto.
Trad desde sempre esteve com a OAB, e a OAB desde sempre vem articulando a aprovação de um projeto que lhe fosse agradável, afastando a possibilidade do fim do Exame de Ordem ser aprovado.
O relatório de Trad ainda está longe de virar lei! Precisa também ser votado no Senado, e lá, no Senado, a força da OAB é bem maior se comparada com a da Câmara.
Depois de tantas idas e vindas a OAB está a um passo de vencer a batalha no Congresso Nacional. Falta só a CCJ se manifestar. Confiram o andamento do PL:
Ainda não há uma data para a votação na CCJ deste relatório, mas é provável que isto ocorra ainda neste ano. Vamos continuar acompanhando a tramitação do projeto.
Confiram a íntegra do Relatório do deputado Fábio Trad: