Terça, 26 de agosto de 2014
Ontem o site do OGlobo publicou uma matéria curiosa sobre um site chamado Processe Aqui, onde os internautas podem, por conta própria, elaborar petições para processar empresas sem precisar pagar por documentos, profissionais especializados ou pelas custas dos processos.
Trata-se do Processe Aqui, um site criado por um advogado, um publicitário e um analista de sistemas.
Segundo a reportagem, o site é voltado para os processos de juizados especiais que pedem indenização de até 20 salários mínimos (R$ 14.480).
De acordo com a Lei dos Juizados Especiais, o cidadão não precisa ser assistido por advogado nestes casos. As petições, uma vez impressas, devem ser levadas a um Juizado Especial Cível (JEC).
De acordo com o site, em apenas 4 passos o usuário consegue uma petição personalizada para atender os mais diversos problemas.
Resolvi então gerar uma petição para mim.
E até que o resultado não foi ruim! Recebi, segundos após finalizar todos os passos, no formato PDF, uma petição completa, com fundamentos, jurisprudências, valor da causa (que o próprio sistema definiu - R$ 13.560,00) e até mesmo citações doutrinárias.
O sistema realmente é voltado para atender causas de juizados especiais (Lei 9.099/95), que podem prescindir da figura do advogado (até 20 salários mínimos - art.9º).
Esse tipo de site não é bem uma novidade no mundo. Há uma forte discussão sobre a oferta desse tipo de serviço na Inglaterra e nos Estados Unidos, em que leigos pode se valer de sistemas semelhantes para elaborarem petições, dispensando assim a figura do advogado.
Aliás, trata-se de um movimento mais abrangente, resultado das fortes mudanças causadas pelo avanço das tecnologias.
Em suma: sinal dos tempos!
Como se não bastasse uma concorrência absurda (em que pese o Exame de Ordem), agora surge um sistema capaz de substituir um advogado na elaboração de uma petição.
Fica a pergunta: a tecnologia vai restringir ainda mais o mercado da advocacia?
Aqui é interessante trazer um estudo feito pela OAB/GO sobre as tentativas do jurisdicionado em litigar por conta própria. Reproduzo a matéria aqui:
?"Consumidor sem Advogado, Prejuízo Dobrado?" - conheça o estudo da OAB-GO
A Comissão de Direito do Consumidor (CDC) da OAB-GO realizou uma pesquisa em 12 Juizados Especiais Cíveis e concluiu que sem advogado constituído o consumidor que já foi lesado acaba tendo indenizações menores. Batizado de "Consumidor sem Advogado, Prejuízo Dobrado", o estudo calculou as médias de indenizações em cada juizado e a diferença surpreendeu.
A indenização média de todos os juizados é de R$ 982,05 em processos sem advogado e de R$ 7.578,44 com advogado constituído. A maior diferença foi constatada no 8º Juizado de Goiânia, de R$ 316,80 para R$ 8.840,71, ou seja condenações 27 vezes maiores em ações com advogados.
"O estudo tem o intuito de conscientizar a população sobre os seus direito. Ainda que os juizados não exijam que seja constituído um advogado, o cidadão tem de saber que pode sair ganhando se contratar um bom profissional para representá-lo", afirma o presidente da OAB-GO, Henrique Tibúrcio.
Mesmo que a lei dos juizados autorize os cidadãos propor uma ação sem assistência de um advogado, o objetivo da pesquisa é demonstrar o quanto é importante que o cidadão seja acompanhado pelo advogado em todos os tipos de processos.
O presidente da CDC, Rogério Rodrigues Rocha, afirma que uma das preocupações da categoria é que o cidadão já teve algum prejuízo e por isso procurou a justiça, e ao entrar em um processo sem o advogado o mais provável é que sofra mais um dano. "Como o cidadão não tem experiência, ele aceita qualquer acordo e pede uma quantidade pequena de indenização. O valor que ele pode ganhar pode ser muitas vezes maior, caso seja com advogado constituído", diz.
O idealizador da pesquisa e membro da CDC, Pitágoras Lacerda, afirma que a OAB está na vanguarda deste tipo de levantamento. "A OAB-GO é uma instituição importante para toda sociedade e traz mais credibilidade para a pesquisa", afirma.
Pesquisa
A pesquisa foi realizada por membros da CDC, que fizeram o levantamento detalhado de dados de cada juizado das comarcas de Goiânia e de Aparecida de Goiânia. Foram pesquisados vinte processos, ativos e arquivados, em cada juizado das cidades, dos anos de 2011 a 2014. Em cada pesquisa, foram selecionados dez processos sem acompanhamento de advogados e mais de dez com advogados atuando em defesa dos consumidores.
Para o presidente da seccional, Henrique Tibúrcio, o levantamento realizado pela Comissão ratifica o que há tempos a OAB-GO vem alertando: o advogado é segurança para o cidadão. "O consumidor, muitas vezes, não tem conhecimento dos seus direitos e pode ser lesado durante um processo judicial", afirma.
"A nossa luta é pelo respeito da Constituição Federal, em especial, me refiro ao artigo 133 que determina a indispensabilidade do advogado na administração da justiça, pela nossa valorização e dignidade, além, é claro, pelo respeito dos direitos do cidadão", completa Tibúrcio.
Indenizações médias por juizado
Sem advogado Com advogado %
1º JEC - Goiânia R$ 856,84 R$ 6.868,55801 %7 vezes mais
2º JEC - Goiânia R$ 1.975,48 R$ 12.461,41630 %5 vezes mais
3º JEC - Goiânia R$ 385,54 R$ 8.401,032179 %20 vezes mais
4º JEC - Goiânia R$ 1.053,17 R$ 6.236,90592 %5 vezes mais
5º JEC - Goiânia R$ 1.212,95 R$ 6.930,00571 %4 vezes mais
6º JEC - Goiânia R$ 262,70 R$ 4.050,001541 %14 vezes mais
7º JEC - Goiânia R$ 1.576,70 R$ 7.587,12481 %3 vezes mais
8º JEC - Goiânia R$ 316,80 R$ 8.840,712790 %27 vezes mais
9º JEC - Goiânia R$ 1.404,44 R$ 3.709,05264 %1,5 vez mais
10º JEC - Goiânia R$ 1.740,03 R$ 11.356,52652 %5,5 vezes mais
1º JEC - Ap. Goiânia R$ 300,00 R$ 7.000,002333 %22 vezes mais
2º JEC - Ap. Goiânia R$ 700,00 R$ 7.500,001071 %9 vezes mais
Geral R$ 982,05 R$ 7.578,44771 %6,7 vezes mais
Vem a pergunta que não quer calar: Um site desse, que forma uma petição previamente estruturada, sem que o litigante possa usufruir dos conhecimentos, da experiência e da estratégia a serem formulado por um advogado, diretamente envolvido com a causa, não seria uma possível fonte de prejuízo para o consumidor?
A despersonalização da construção da peça processual, me parece, é um excelente caminho para uma causa ir para o bebeléu...