Pode a assistência judiciária gratuita canibalizar o mercado da advocacia privada?

Terça, 20 de janeiro de 2015

Me deparei hoje com uma notícia publicada no site do TJDFT, franqueando aos advogados a possibilidade de se cadastrarem para prestar assistência jurídica gratuita no âmbito do Tribunal.

Vejam a notícia na íntegra:

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios ? TJDFT regulamentou, por meio da Portaria GC 3, de 7 de janeiro de 2015, publicada, no dia 9/1, no Diário de Justiça eletrônico ? DJe, o cadastramento de advogados interessados em prestar assistência jurídica gratuita no âmbito do Tribunal.

Para realizar o cadastramento junto ao TJDFT, o advogado voluntário deverá dirigir-se às Distribuições e, por meio de formulário próprio, declarar-se ciente das condições em que será prestada a assistência jurídica e fornecer, obrigatoriamente, as seguintes informações: regularidade da inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil - OAB; ausência de penalidade disciplinar imposta pela OAB, impeditiva do exercício da profissão; número do CPF, endereço profissional, endereço eletrônico e número de telefone.

Os advogados voluntários serão organizados em sistema de rodízio, conforme disponibilidade declarada no ato de cadastramento, com o objetivo de, no mínimo, prestar atendimento durante o horário de expediente forense do Tribunal.

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O pedido formulado por advogado voluntário, de exclusão ou de suspensão do cadastramento, não o exime de seus deveres perante os assistidos que já lhe tenham sido encaminhados. O advogado deverá prosseguir atuando nos feitos correspondentes, na mesma condição de advogado voluntário, até que eventual renúncia produza efeitos na forma da lei.

Segundo a Portaria, é vedado ao advogado voluntário apresentar-se, em qualquer circunstância, sob o título de defensor público, ou utilizar expressões assemelhadas, inclusive em petições, que possam induzir à conclusão de se tratar de ocupante de cargo público ou ainda de integrante de entidade pública oficial.

O descumprimento das condições estabelecidas nesta Portaria e na Resolução nº 62/2009 do CNJ pelo advogado ou por estagiário voluntário ensejará a exclusão do cadastro sem prejuízo de outras sanções previstas em lei. A notícia da cobrança de honorários, despesas ou quaisquer valores ao assistido, por advogado ou estagiário voluntário, implicará, ainda, a imediata comunicação do fato à OAB-DF.

O TJDFT manterá, em seus sistemas informatizados, cadastro atualizado dos advogados inscritos para prestar assistência jurídica gratuita. Além disso, o Tribunal realizará controle estatístico dos atendimentos gratuitos, da demanda por assistência e da quantidade de processos e de pessoas assistidas.

Para mais informações, acesse a Portaria GC 3, de 7 de janeiro de 2015.

Fonte: TJDFT

Emergem desta notícia uma série de observações:

1 - Não se trata de uma regulamentação da profissão, por certo, até porque o Tribunal não teria esse poder. Digamos que é uma forma de "organizar" o serviço;

2 - Isso ocorre em função da lacuna, da própria OAB, em regulamentar a questão da advocacia pro bono, assunto nunca enfrentado de frente;

3 - Os requisitos da assistência judiciária gratuita serão observados, incluindo aí a comprovação de hipossuficiência financeira dos beneficiados para poderem ser atendidos?;

4 - Se existe Defensoria Pública no âmbito do DF, para que esse cadastramento?;

5 - Como será evitada eventual captação de clientela feita pelos advogados? Trabalhar de graça é um gesto bonito, mas ninguém vive de vento de forma indefinida;

6 - O TJ ignora a existência da FAJ - Fundação de Assistência Judiciária - da OAB/DF?;

7 - Se um serviço é prestado de graça, como fica a imagem dos profissionais que cobram para trabalhar? Afinal, se alguém faz de graça, outro cobra, o valor cobrado passa a ser CARO para se fazer um serviço independentemente do seu preço, por ínfimo que venha a ser. É uma forma de achatar ainda mais os valores cobrados como honorários.

A verdade é que, cada vez mais, a profissão de advogado cada vez mais vai sendo achatada, tornando a vida para os jovens advogados (e nem tão jovens assim) muito mais difícil.

A OAB/DF interveio corretamente neste caso (Cliquem AQUI), mas o ponto central está na percepção de limites para não transformar a atuação da classe dos advogados em uma verdadeira feira onde os serviços terão de ser leiloados.

A lógica é de que todos tenham igualdade de condições, para que então os melhores, mais preparados e abnegados possam conquistar seu espaço. Uma regulamentação frouxa como esta do TJDFT só serve para prejudicar ainda mais a classe dos advogados.

E, claro, corremos o risco de ver medidas como esta virarem moda em outras unidades da federação.