Quinta, 11 de agosto de 2011
O Exame é inconstitucional. É elementar a inconstitucional da norma, ainda que legal, que estabeleça limites ou condições conflitantes com garantias constitucionais. A Constituição Federal prevê concurso para os cargos públicos, mas não para as atividades privadas, que exigem, apenas, qualificação, atribuição do Estado, não dos Conselhos profissionais, sob pena de usurpação da competência do Poder Público.
O Exame não atende à suposta finalidade de defender a sociedade de maus profissionais. Alegar que as faculdades não qualificam os bacharéis não é argumento jurídico. É falácia. O Exame não corrige essa deficiência. O mal está na qualificação dada nas faculdades e estas é que devem ser penalizadas pelo estelionato que praticam; não os bacharéis, que detém diploma por ato jurídico perfeito. Se houvesse lógica nesse argumento, valeria para os demais conselhos profissionais. Esses argumentos fingem ignorar a raiz do verdadeiro problema. O Exame não impede o ingresso de maus profissionais na advocacia. Estes estão na atividade aprovados no Exame sem que sejam delas excluídos.
A comparação com os concursos para Magistratura e Ministério Público (MP) padece da mesma inconsistência de argumentos. O concurso seleciona aprovados no limite das vagas ofertadas. É uma exigência constitucional para ingresso em cargos públicos, inclusive da advocacia estatal. A advocacia é atividade privada. É tão inconsistente esse argumento que magistrados e membros do MP são dispensados do Exame se desejam advogar mesmo que não tenham sido inscritos antes como advogados.
O Exame valida o diploma e, aí, usurpa função do Estado. O detalhe semântico de que os cursos de Direito formam bacharéis e não advogados é preconceituoso e discriminador, porque os demais cursos não diplomam no nome da atividade, mas da ciência. O Exame é uma espécie de circo de horrores com pegadinhas finalmente admitidas pela própria Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em detrimento dos sonhos e sacrifícios de pessoas honradas que acreditaram na seriedade das instituições do País.
O Exame é fonte milionária que se alimenta da deficiência da graduação. Quanto pior for esta, maior será o lucro, decorrente de um estelionato que deveria ser combatido pela instituição que dela se beneficia, se não por dever legal (art. 44, I, Lei 8906/94), pelo menos por reparação, pois os advogados, membros de seus Conselhos, são docentes dessas instituições. Se a OAB quer defender a sociedade dos maus advogados, questione a diplomação, antes de efetivada, e, acima de tudo, faça cumprir seu Código de Ética pelos advogados já aprovados.
carlos.nina@yahoo.com.br
Carlos Nina
Advogado e membro do Instituto dos Advogados Brasileiros
Não
Pela importância do tema, vale salientar dois aspectos do Exame de Ordem. O primeiro é a sua indiscutível constitucionalidade que, na lúcida avaliação do jurista Marcus Vinicius F. Coelho, entender de modo diferente é considerar o ?cidadão menos importante que o Estado?. O pronunciamento do jurista vem em repulsa à recente alegação de inconstitucionalidade fundada no RE 511.961 quando o Supremo se pronunciou pela não obrigatoriedade de diploma para exercício da profissão de jornalista.
Embora a alegada ?liberdade profissional? defendida em parecer, esteja definida no artigo 5º da Constituição, por seu inciso XIII, onde o mesmo prevê que ?é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão?, de igual modo, ao menor dos intérpretes da norma é obrigatória a análise do enunciado completo, onde o mesmo finaliza, ?atendidas às qualificações profissionais que a lei estabelecer?.
Ora, se de um lado direito é possibilidade normativa para aproveitamento de um ?bem?, o usufruto deste ?bem? terá de ser cotejado com outros elementos fundamentais da resenha constitucional. Dúvidas não há de que a lei poderá restringir tais direitos e garantias, sempre nos casos previstos na Constituição, devendo limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos constitucionalmente protegidos.
No caso da restrição à ?liberdade profissional? perpetrada pelo Exame, resta bem definida na Lei 8.906/94, no inciso XIII, cumprindo ainda os preceitos clássicos de restrição proporcional, havendo adequação, necessidade e justa medida. Portanto, constitucional é o Exame de Ordem.
O segundo aspecto é a inquestionável repercussão da advocacia na liberdade, no patrimônio e na vida das pessoas, fazendo do Exame um instrumento cada vez mais necessário à aferição dos mínimos conhecimentos do bacharel, sobremodo após a proliferação indiscriminada de cursos de Direito ocorrida no Brasil.
O Exame revelou-se um hábil e indispensável mecanismo para avaliar, mesmo que superficialmente, bacharéis e faculdades, sendo este o primeiro embate das inúmeras dificuldades da advocacia, num país recordista em editar normas legais, onde o Judiciário nem sempre tem a celeridade que a ?causa? requer ou os meios materiais para realizar a prestação jurisdicional, e onde, por juramento, é dever do advogado defender a cultura e as instituições jurídicas.
O Exame de Ordem deve ser a bandeira de todo bacharel em Direito, que orgulhoso da coragem de abraçar a advocacia terá, na sua aprovação, a certeza de contribuir com o desenvolvimento jurídico-cultural de nosso País.
Valdetário Monteiro
Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Ceará
Em termos
O Exame de Ordem não pode acabar. Há de se considerar que o exercício da advocacia não é apenas a prática de uma profissão liberal: o advogado detém ?munus? público, por força do Art. 133 da Constituição Federal. Ou seja, exerce privativamente uma atividade pública. Seus atos são passíveis de fiscalização pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que por sua vez detém poder de polícia, revelando sua face institucional por delegação de poderes do Estado, enquadrando-a em instituição ?sui generis?.
Se os juízos e tribunais são os órgãos do Judiciário, os advogados são o sangue: fazem fluir as pretensões de todos face o exercício estatal da jurisdição, e a concessão desta faculdade não pode ser feita meramente após o bacharelado: não se outorga ?munus? público sem avaliação de capacidade técnica, e isso vale para juízes, membros do Ministério Público e advogados.
Inquestionavelmente é preciso averiguar se o advogado está apto ao exercício de tão importante função, e essa função cabe ao Exame de Ordem. Entretanto, a legitimidade do Exame está intimamente atrelada à sua correção técnica, e sob este aspecto o Exame tem deixado, e muito, a desejar.
No certame 2009.2 foi usada uma redação confusa e dúbia na prova trabalhista para induzir ao erro e reprovar a maioria dos candidatos, que optam por essa disciplina em específico. No 2009.3 tivemos a descoberta da fraude na prova da 2ª fase, fraude esta que também atingiu o Exame 2009.2.
No 2010.1 a OAB aplicou uma prova cheia de pegadinhas e armadilhas, conseguindo reprovar 90% dos candidatos ainda na 1ª fase. A repercussão foi tão negativa que a Ordem anulou cinco questões para mitigar a indignação de todos. No Exame 2010.2, o primeiro da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a prova da primeira fase foi bem concebida, mas aprovou tantos candidatos que, para compensar, resolveram pesar a mão na segunda fase. O resultado foi uma prova pessimamente corrigida, gerando inclusive o ajuizamento de seis ações civis públicas contra o gabarito e os critérios de correção.
No 2010.3, a FGV não respeitou o provimento e o edital, e não cobrou as questões de Direitos Humanos, previstas no edital, motivando outra ação civil pública. Tais falhas, indesculpáveis, fragilizam a legitimidade do Exame como processo de seleção e o argumento da exclusividade de culpa do péssimo ensino jurídico pelos elevadíssimos percentuais de reprovação.
A importância do Exame é manifesta, mas a necessidade de se aplicar provas tecnicamente irretocáveis é premente para preservar a imagem da prova. Do contrário, o embate sobre sua legitimidade nunca terá fim.
Maurício Gieseler - Advogado e especialista no Exame de Ordem
Fonte: Direito CE