O pedreiro, o advogado, o Exame da OAB e o mercado de trabalho

Sexta, 13 de maio de 2011

Na edição de 18/05/10, jornal Correio Braziliense publicou uma matéria sobre o mercado profissional da construção civil do Distrito Federal.

De acordo com a reportagem, o piso salarial médio dos trabalhadores formais da construção civil no DF era de R$ 1.473,20, acima do piso nacional, que era de R$ 1.189,00. (fonte: Correioweb)

O Jornal Gazeta Online publicou em novembro de 2010 uma matéria com o título "Quer um salário de pedreiro?" aduzindo que as pessoas, de um modo geral, acham que um pedreiro ganha pouco, mas faz o contraponto com a realidade: hoje existem pedreiros, carpinteiros ou armadores ganhando R$ 3 mil por mês. O salário seria maior inclusive de um engenheiro iniciante, que receberia na faixa de R$ 2 mil. E se for um mestre de obras, a renda pode chegar até R$ 6 mil por mês.

Vejam agora um trecho da Convenção Coletiva 2011/2013 da categoria no Distrito Federal:

A convenção delimita o piso salarial. Pedreiros em início de profissão podem ganhar mais do que isso.

E quanto ganha hoje um advogado em início de carreira?

Em Niterói/RJ, R$ 1.000,00 mais comissão - Empregos RJ (11/03/2011)

No Rio de Janeiro, R$ 1.200,00 - ZAP (08/05/2011)

Rio de Janeiro, R$ 1.500,00, com pós-graduação - Empregacarioca - (02/10/2010)

No Distrito Federal a média salarial de advogados iniciantes está entre R$ 1.200,00 a R$ 1.500,00. Não conheço com exatidão a média dos demais estados, mas creio que esses valores representariam a média salarial pelo Brasil.

Por que um pedreiro ganha tanto quanto ou mais do que um advogado em início da profissão?

Não quero, evidentemente, desmerecer sob qualquer aspecto a profissão de pedreiro, mas não podemos ignorar, por óbvio, o abismo de investimento em educação necessário para se formar um advogado e um pedreiro. E quando falo em investimento, falo de tempo e de dinheiro.

Para ser pedreiro é necessário, se muito, o nível fundamental, e para ser advogado é necessária a formação superior, afora passar no difícil Exame de Ordem.

Em tese, a diferença de tempo e dinheiro para se formar um advogado deveria assegurar a este profissional uma remuneração muito superior a de um pedreiro.

Em tese...

Na prática podemos observar um nivelamento que não deveria existir, mesmo para profissionais em início de carreira (e muitas vezes nem tão no início assim!), em função exatamente da diferença de investimento educacional entre uma e outra atividade profissional.

Agora vejam o título de outra matéria do Correio Braziliense, datada de 29/11/2009: Faltam pedreiros no mercado

O título já diz tudo: Há demanda por pedreiros, mas não existem muitos deles para suprir a falta de mão-de-obra. De acordo coma reportagem, "Na tentativa de suprir um deficit de pelo menos três mil pessoas, os empregadores têm recrutado trabalhadores de Goiás e Minas Gerais, e das Regiões Norte e Nordeste. O crescimento de Águas Claras, o surgimento do Setor Noroeste e o início das obras para a Copa do Mundo de 2014 tendem a agravar a situação."

Por que então os salários dos jovens advogados é tão baixo? Há um excesso deles no mercado. Tudo resultado da lógica da oferta e procura.

A percepção de saturação de um mercado não é algo muito óbvio e eventuais análises podem apresentar equívocos, mas faz tempo que se é debatida a precariedade do mercado da advocacia.

Quando a oferta de profissionais é grande, os valores tendem a diminuir. Se a remuneração é considerada aviltante por um advogado, outro, com a mesma formação, certamente estará disposto a receber a remuneração rejeitada. Isso cria a média remuneratória de uma determinada localidade e acaba se impondo sobre todos, gostem ou não disso.

O mercado saturado joga os salários para baixo.

E não só do salário, mas também dos honorários advocatícios. Todas as seccionais da Ordem possuem uma tabela de honorários advocatícios indicando os valores mínimos a serem cobrados. Quem milita sabe que existem profissionais que cobram valores muito abaixa da tabela.

Esse é o mercado hoje.

E esse é o principal fundamento justificador do Exame de Ordem: seu fim representaria o colapso da profissão.

"Os melhores se estabelecem", diriam alguns, mas os nem tão bons assim também têm o direito de sobreviver. Os melhores se estabelecem sim, mas a expansão deste mercado implicaria em dificuldades para todos, bons e ruins.

"O mercado seleciona", diriam outros, mas não creio que o mercado tenha maturidade ou capacidade de efetivamente selecionar. O leigo ignora o que ocorre em uma profissão cujo promoção e divulgação são limitadas em razão de aspectos éticos.

Quem não passa no Exame de Ordem sente-se, muitas vezes, profundamente injustiçado pela lógica do sistema. O pleito pelo fim do Exame de Ordem é perfeitamente aceitável.

Mas, para variar, a realidade massacra os melhores ideais.

O problema todo tem uma só origem: o excesso de faculdades de Direito. Ontem, na audiência pública sobre o Exame de Ordem, o diretor de Regulação e Supervisão da Educação Superior do Ministério da Educação, Paulo Roberto Wollinger, afirmou que atualmente o ministério realiza apenas uma análise da qualidade da aprendizagem e não uma avaliação individual dos profissionais que se graduam.

Ou seja, lavou as mãos.

Segundo Wollinger, cerca de 80 instituições tiveram avaliações frágeis e por isso estão sujeitas à redução de vagas e até à suspensão de novos vestibulares.

Entretanto, o Exame de Ordem mostra uma realidade bem mais amarga: 80% das faculdades não conseguem aprovar nem 5% de seus egressos.

A metodologia do MEC de julgar e avaliar as instituições de ensino superior está muitíssimo distante do que a prática, e o mercado, apresentam. Isso resulta em um exército de novos bacharéis em Direito a cada ano no mercado.

Esse é um problema complexo, grave, e que tende a piorar com a iminente expansão do ensino superior - Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior quer acabar com a interferência da OAB na autorização e reconhecimento de novos cursos jurídicos.

Essa é a realidade. Quem tem razão nessa história, afinal?

Debatam nos comentários deste post.