O Exame de Ordem deve deixar de ser unificado?

Terça, 14 de dezembro de 2010

Ouvi alguns comentários de que ganha força um movimento tendente a abolir o Exame de Ordem Unificado, porquanto nos últimos Exames de Ordem ocorreram sistemáticos problemas de gestão, acarretando na exposição da imagem da OAB e do Exame de Ordem em si.

Em suma: O Exame de Ordem seria melhor aplicado pelas seccionais do que pelo Conselho Federal da OAB.

Ledo engano.

O Exame de Ordem Unificado é muito melhor, em todos os sentidos, do que a aplicação da prova de forma isolada pelas seccionais.

E por quê?

1 - Reduz drasticamente as possibilidades de fraude.

Rapidamente, de cabeça, lembro que na década de 2000 aconteceram fraudes nos Exames aplicados pelas Seccionais de Goiás, Distrito Federal, Rio de Janeiro, São Paulo e Rondônia. Relato apenas essas ocorrências pois consegui encontrar referências delas na web. Não descarto a existência de mais fraudes no período acima apontado:

Goiás - CLIQUE AQUI

Distrito Federal  - CLIQUE AQUI

Rio de Janeiro - CLIQUE AQUI

São Paulo - CLIQUE AQUI

Rondônia - CLIQUE AQUI

Sim! No Exame Unificado 2009.3, aplicado neste ano, também tivemos uma fraude, resultando na Operação Tormenta,  mas isso não elide o raciocínio aqui defendido.

Fraudes ocorrem. Seja dentro da entidade de classe dos advogados, seja no Congresso Nacional, na Bolsa de Valores...enfim, ocorrem onde há uma oportunidade de se ganhar dinheiro e seres humanos - Ou seja, em qualquer lugar.

A diferença é que um sistema unificado, com apenas uma organizadora, centraliza todo o processo de elaboração e distribuição de provas, permitindo uma fiscalização mais apurada e controles mais rigorosos. O foco de fiscalização é um só. Isso inibe a ocorrência de fraudes.

Descentralizar significará assumir um aumento no risco de ocorrência de fraudes, e a OAB não pode se dar a esse luxo.

Nunca!

2 - Expõe o ensino deficitário

Uma forte bandeira da OAB está em combater o chamado "estelionato educacional". E a exposição das faculdades não muito preocupadas com um ensino de qualidade aumentou radicalmente com a unificação do Exame. Como todos os candidatos são submetidos a uma mesma prova, o trabalho de cada instituição é desnudado sem contemplações, facilitando a vida de centenas de milhares de vestibulandos em escolher a instituição que propicia melhores resultados na hora de se fazer o Exame de Ordem.

O problema central nesse caso é a flexibilização excessiva dos critérios de elaboração das provas. Uma prova muito fácil mascara o ensino ofertado, transformando uma instituição ruim em "boa" porque seus egressos seriam avaliados de forma leniente.

Vejam o trecho de uma matéria publicada pelo site Conjur no ano de 2005 que trata exatamente dessa problemática. É reveladora:

(...)

Uma analise dos últimos Exames de Ordem em seis estados brasileiros ? Rondônia, Bahia, São Paulo, Paraná, Rio de Janeiro e Brasília ? mostrou a raiz das diferenças de resultados de estado a estado e a discrepância de rigor e qualidade na avaliação dos futuros advogados.

O responsável pela analise dos exames, a pedido da revista Consultor Jurídico, foi o advogado Aleksander Mendes Zakimi, direitor da Jurisp ? Escola de Direito e Prática Jurídica de São Paulo e professor da UniFMU.

(...)

Veja a analise de Zakimi em cada prova

Rondônia

Na prova de testes, as questões formuladas são, em sua grande maioria, diretas. Os enunciados não expõem uma situação ou caso concreto, sendo assim, deixa de exigir que o candidato pense, reflita antes de assinalar uma alternativa. São questões muito simples, curtas e explorando conhecimentos básicos. Não exige do candidato qualquer interpretação ou raciocínio. Como se não bastasse tanta simplicidade, dos 100 testes da prova, mais de 70 são do tipo que pede para o candidato assinalar a alternativa correta ou incorreta. É uma prova fraca. O exame escrito é muito fácil. Não exige do candidato raciocínio para descobrir a peça a ser feita.

Bahia

A prova da Bahia apresenta muitas questões diretas, com abordagem básica e de grande simplicidade. Poderiam ser melhor elaboradas, e não somente exigir do aluno conhecimento do que a lei dispõe. Não é exigido raciocínio, não se requer do candidato que ele pense para responder. Em algumas matérias as questões são melhor elaboradas, como a de Direito Civil, mas outras, como a de Direito Penal e Direito do Trabalho são simples demais querendo que o aluno responda por métodos frágeis como a ?decoreba?.

Distrito Federal

A prova de testes de uma forma geral é trabalhosa, exigente, mas dentro da normalidade. O candidato não tem sua inteligência ?ofendida?, como acontece na prova de Rondônia. Algumas questões da prova abordam pontos cruciais da Emenda Constitucional 45, o que exige do candidato um conhecimento sempre atualizado. Porém, a prova da OAB do DF possui dois pontos falhos. O primeiro, que é verificado também nas provas de outras seccionais, é o grande número de questões que só exigem do candidato que seja assinalada a alternativa correta e em outras questões a incorreta. O outro ponto falho é que algumas questões são diretas demais, exigindo do candidato somente o seu conhecimento da lei e não a interpretação e adequação dela ao caso concreto, como deveria ser. A prova escrita é equilibrada e inteligente.

São Paulo

Já de algum tempo a prova de São Paulo vem recebendo enormes críticas de todos os lados, seja dos candidatos, seja das escolas. É uma prova difícil e exigente, mas seguramente é um bom parâmetro para avaliar como andam os cursos de Direito em São Paulo. A prova escrita tem sofrido de altos e baixos. Algumas com enorme exigência de conhecimento, como a prova da área Tributária; outras têm sido muito simples, como, a da área Civil. Podemos concluir que a segunda fase está um tanto desproporcional.

Diante dos últimos resultados, duas dúvidas podem ser colocadas: Uma é se a prova da OAB-SP não vem exigindo mais do que os candidatos são capazes de dar? Ou será que a qualidade dos cursos de Direito é que apresenta deficiências tais que justiçam o alto índice de reprovação?

Rio de Janeiro

Na primeira fase, as questões formuladas exploram casos práticos, situações do cotidiano da advocacia. É uma prova equilibrada, com questões fáceis, médias e difíceis. Não se exige do candidato mais do que ele é obrigado a saber sobre cada matéria. Algumas questões exploram somente um conhecimento do que está previsto na lei. Na segunda fase, a prova escrita é equilibrada, abordando situações e casos práticos. Exige do candidato a interpretação da lei adequando-a ao caso concreto proposto para análise. Uma prova que exige raciocínio.

Paraná

A prova do Paraná é equilibrada, exige do candidato conhecimento do que é importante de cada instituto jurídico abordado. A grande falha está na formulação das questões, uma vez que são diretas demais, sendo que grande parte não ultrapassa uma linha. Todas as questões, sem exceção, pedem para o candidato assinalar a alternativa correta e em outras questões a incorreta. A prova escrita é muito exigente, extensa, contendo inúmeras informações em cada caso proposto para análise. O candidato deve ler com atenção redobrada cada questão, pois uma informação perdida ou que não se tenha dado a importância devida pode ser comprometedora no momento de se dar a resposta ou elaborar a peça prático profissional.

Fonte: Conjur

Regionalizar seria dar um prêmio para as chamadas faculdades caça-níqueis, pois, com a queda na qualidade das provas e a regionalização do Exame, a pressão para a melhora do ensino jurídico no Brasil sofreria um forte abalo, e todo o discurso, luta e empenho da OAB nesse sentido nos últimos anos iria escoar pelo ralo.

A OAB, com o Exame Unificado, assumiu um compromisso inarredável com a sociedade, pois só o Exame unificado oferece um parâmetro uniforme para avaliar de fato a qualidade do ensino jurídico no Brasil e dos candidatos que desejam ingressar em seus quadros.

E digo compromisso com a sociedade porque o papel da OAB é com a fiscalização dos advogados, pois estes atuam para a sociedade, são servidores da sociedade.

Seria justo que um candidato menos preparado ingressasse nos quadros da OAB enquanto um colega mais preparado, mas defrontado com uma prova mais difícil, não lograsse o mesmo sucesso apenas porque mora em outra região do Brasil?

Não seria nem justo e nem bom para a sociedade, e só o Exame Unificado propicia uma avaliação homogênea para todos.

3 - Permite a crítica e a evolução do Exame

Ninguém gosta de ser criticado. Pior ainda quando se trata de instituições tão importantes como a OAB e a FGV.

O desgaste na imagem é manifesto.

Mas também é bom, é salutar.

Bom e salutar porque os problemas ocorridos no Exame são vistos por todo o Brasil, todos podem criticar, todos acompanham e as soluções são apresentadas com mais celeridade.

Sob certos aspectos, a exposição nestes casos enriquece o processo dialético, ainda mais quando TODOS participam, diferentemente de Exames de Ordem apenas regionalizados.

Ninguém critica o Exame de Ordem, a FGV ou a OAB por mero capricho. Quem pode negar as falhas na correção das provas do atual Exame? Elas são evidentes!!

Com todos apontando os problemas ocorridos, a consequência natural é que o processo de aplicação do Exame de Ordem passe por uma evolução, com a melhoria de seus parâmetros de aplicabilidade.

Só o Exame Unificado, com todo o interesse que atraiu, e a correlata visibilidade, propicia a melhor evolução dos parâmetros de aplicação da prova.

Aliás, há de se ressaltar que em termos de logística, há tempos não ocorrem falhas. A OAB e as organizadoras, até então, conseguem aplicar bem as provas.

O problema é de critério.

O Cespe foi substituído por abusar dos chamados peguinhas. A FGV escorregou na escolha dos critérios de correção.

Não se trata de criticar indiscriminadamente. A prova da 1ª fase da FGV foi bastante elogiada. Não vi ninguém dizendo que ela havia sido injusta ou ruim.

No presente caso, parece que ninguém da OAB que entenda de Exame de Ordem deu uma simples conferida nos que a FGV estava fazendo. Se Tivessem dado, certamente não teria acontecido o que aconteceu.

E falando em FGV, alguns já postulam sua saída do Exame.

Nada mais precipitado...

Tenho certeza que, caso o próximo Exame seja organizado por ela, o zêlo na aplicação das provas será absoluto.

Como escrevi acima, o processo é dialético. Duvido que a FGV fique inerte após tanta exposição negativa.

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Enfim...esperamos apenas o melhor para o Exame de Ordem, e isso não significa postular por uma prova fácil. Como deve ser a prova é uma escolha da OAB, e, fácil ou difícil, o importante mesmo é que ela seja JUSTA.

A aplicação de uma prova justa afastaria qualquer crítica, fortalecendo o Exame de Ordem e seus propósitos.

É simples assim.