O Exame de Ordem, as colas e o futuro da prova

Quinta, 12 de julho de 2012

Até ontem as fraudes ocorridas no Exame de Ordem 2009.3 e anteriores envolviam apenas aqueles que diretamente participaram do esquema de desvio das provas: os membros da quadrilha e os candidatos beneficiados.

Mas ontem, após a conclusão do relatório da Polícia Federal, foi revelado que não só os fraudadores deram um "jeitinho". Mais de mil candidatos foram flagrados por um programa de computador. Eles colaram para conseguir a aprovação.

Ironia do destino: a PF mirou em um alvo e acertou mais de mil.

E agora? O que vai acontecer?

Mais uma vez o Exame de Ordem vai para a berlinda, e vai incrivelmente por conta de um "café requentado", a fraude  de 2009. Acontece que re-esquentar o café trouxe novos aromas a essa historinha e creio em mudanças para o futuro do Exame de Ordem.

E porque creio nisso?

Vamos  considerar o contexto das fraudes ocorridas nos Exames de 2009.

O Exame, naquela época, estava parcialmente unificado (não participavam ainda São Paulo e Minas Gerais), mas sua estrutura estava definida e se repete até hoje: salas com um número X de candidatos e 3 ficais. Naquela época os candidatos podiam levar a doutrina para a prova (era um tempo bom e ninguém sabia). Literalmente levavam uma mala cheia de livros (cansei de ver isso) facilitando o processo de cola.

Mas considerem que as colas ocorreram dentro das salas, com candidatos compartilhando, de alguma forma, os conteúdos de suas provas. Foi isso que a PF flagrou! É aquele velho esqueminha de deixar o colega ver sua prova, ou passar um papelzinho com o que foi escrito. Não é difícil imaginar o ato em si.

Aqui surge o primeiro ponto: a prática ocorreu descolada da fraude principal, era completamente difusa. Ou seja, ela ocorreu em 2009 como também deve ter ocorrido em 2008, 2007, 2006 e assim vai, e como também deve ter ocorrido em 2010, 2011 e 2012.

Imagino se a OAB resolve passar um pente fino com esse programa de computador da PF em várias edições do Exame de Ordem, certamente vai flagrar aí mais de 4 mil candidatos que deram uma de espertos.

Mas como a Ordem costuma ser reativa nestes casos, e nunca pró-ativa, creio que isso não vai acontecer.

Não vai acontecer mas não quer dizer que a OAB não se importa. A história das colas pegou muito, mas muito mal.

A questão é se perguntar o que vai acontecer com a prova daqui para frente. E creio que as consequências não serão boas.

Já existia um "zumzumzum" quanto ao fim das remissões na prova subjetiva, mas nada concreto o suficiente para merecer uma nota ou um comentário. Com a descoberta da facilidade de se colar no Exame de Ordem, é muito provável que a OAB proíba a utilização das remissões nos vade mecuns.

É uma especulação minha, mas dentro deste contexto é algo potencialmente real.

Não sei o que vai acontecer, mas não acontecer NADA é algo bastante improvável. A OAB precisa dar respostas, e essa seria uma, assim como o aumento no número de fiscais.

A descoberta da PF mostrou uma fragilidade dentro de um sistema que não passou por nenhuma grande alteração, e a Ordem não vai ficar inerte diante de tamanha exposição negativa.

E, gostem ou não, ela, se agir, estará recoberta de razão.

Seria o preço que os inocentes, os sérios, pagam por conta das MERDAS feitas por outros candidatos. Infelizmente é assim.

Espero estar errado, mas temo que não.

Quanto a estes outros candidatos, estes que colam para passar, a vida vai se tornar um tanto quanto amarga daqui para frente. Vejam o que o ex-presidente da OAB, Dr. Cézar Brito, escreveu no Twitter:

E o ex-presidente, dentro da OAB, é muito, mas muito influente.

Mas também nem precisava ser. É óbvio que a OAB vai vir BABANDO para cima dos coladores. Aliás, ela não tem alternativa: ou faz isso ou faz isso.

Mas não será só a OAB, evidentemente. Após a conclusão do inquérito, o MPF entra entrará em cena e oferecerá denúncia contra todos. E aí vem a parte mais sinistra da história: todos vão ter os nomes expostos. Não duvido que as ações do MPF virem notícia também, tal como virou as denúncias contras os fraudadores do Exame de Ordem da OAB/GO. O nome de todos, com foto e tudo, no site do MPF/GO.

Afora isso, a perda da carteira após um longo processo, isso já decorridos quase 3 anos de exercício profissional, e a mácula no nome.

O fim de uma carreira, de anos e anos de estudo e investimento numa profissão. Sem contar que as portas para o serviço público também serão fechadas.

Projetem as consequências disto tudo e se perguntem: vale a pena colar? Vale usar do subterfúgio para lograr o sucesso?

Parece que não...

Não seria muito melhor ter reprovado mais uma duas ou três vezes e se livrar de verdade do Exame de Ordem? Se livrar para sempre disto?

Em quem colou em Exames anteriores ou posteriores e agora se pergunta se vão investigar estes também? Devem estar com problemas de sono agora, e com razão.

Moral da história: por mais difícil que seja, consigam as suas coisas pela via meritória, pelo suor na cara e através da dor do fracasso para então advir a a glória do sucesso honesto, do sucesso REAL.

Não desejo, obviamente, o mal para ninguém. O devido processo legal está aí para proteger os inocentes, mas com certeza, no mínimo, esse caminho da SACANAGEM tem de ser fechado.

Eu já entrei em contato com centenas (literalmente) de histórias de dor e sofrimento por conta do fracasso no Exame de Ordem, fracasso de gente que quer a carteira estudando, ralando, fazendo por merecer exclusivamente por conta do esforço pessoal.

É revoltante ver candidatos que pulam essa fase valendo-se no "jeitinho". É um tapa na cara de quem faz por merecer e uma dedada em uma ferida supurada pela dor de reprovar várias vezes na prova.

Não sei o que a OAB vai fazer, mas uma resposta ela tem de dar em respeito à DOR de centenas de milhares que sonham em ser, honestamente, advogados, e que sofrem prova após prova até lograr o sucesso.

Isso quando logram, pois no Exame de Ordem o fracasso é a regra e o sucesso, exceção.

Que a OAB, em seu papel, faça justiça aos examinandos sérios.