Quinta, 26 de março de 2015
Ontem escrevi sobre mais uma tentativa do deputado Eduardo cunha em acabar com o Exame de Ordem. Filtrei uma série de comentários de candidatos falando que o fim da taxa seria algo bom, em especial porque ela seria muito cara.
Eduardo Cunha vai tentar acabar com taxa do Exame de Ordem via emendas ?jabuti? na MP 660/14
Eu concordo! Seria uma maravilha que a inscrição no Exame fosse gratuita, mas se tudo fosse simples assim esse debate não existiria.
O objetivo do deputado não é facilitar a vida dos bacharéis, mas sim dificultar a vida da Ordem. Ele sabe que o Exame tem um custo, e que acabar com o valor de inscrição iria dar um nó na vida da OAB.
Um nó para a OAB e também, mas nisto ele não pensou, na vida dos bacharéis.
Como assim?
Não é a primeira vez que ele tenta isto, de colocar uma emenda em uma MP para acabar com a taxa de inscrição. Em março de 2014 ele apresentou emendas na MP 627 que alterava praticamente toda a legislação tributária federal .
Naquela época tive a oportunidade de conversar com um membro do Conselho Federal e ele me passou a seguinte perspectiva, também à época publicada aqui:
Se a taxa de inscrição do Exame acaba, a Ordem PODERIA reduzir o número de edições da prova de 3 para apenas 1 por ano! E isso pelas seguintes razões:
1 - A prova tem um custo, e é um custo muito alto. Ela é aplicada em mais de 200 municípios, exige uma logística sofisticada, cara, sistema de segurança, custo de impressão, transporte e correção. É o 3º maior processo seletivo do país, perdendo apenas para o ENADE e o ENEM. Se a OAB perde a inscrição usada para custear os gastos, ela não teria receita, neste momento, para bancar 3 edições por ano;
2 - A única forma de manter as 3 edições seria transferindo este custo para os atuais advogados, aumentando o valor das anuidades. A classe não se dispõe a pagar por este custo. Nenhum advogado tem o interesse de pagar para um bacharel fazer a prova, e muito menos tem o interesse em ver o valor de sua anuidade aumentar;
3 - Não há condição política para o aumento das anuidades. Isso geraria um embate sério entre a classe e seus dirigentes, e nenhum presidente gostaria de enfrentar o ônus político de aumentar as anuidades. Hoje a média cobrada está na casa dos 700 reais, o que já gera reclamações. Com o fim do Exame esse valor certamente iria aumentar, e a indignação da classe também. (E aqui faço um adendo mais atual: estamos em ano eleitoral! NENHUM candidato vai ousar falar em aumento de anuidade!);
4 - A Coordenação do Exame de Ordem ADORARIA ter mais tempo para elaborar e corrigir as provas, exatamente para não mais ser bombardeada por conta dos erros que ocorrem a cada edição. Com mais tempo a prova poderia ser elaborada com muito mais calma e correção. Essa proposta, inclusive, chegou a ser debatida após o X Exame de Ordem, mas não encontrou respaldo. Com o fim da taxa, a ideia seguiria em frente sem oposição, respaldada pela futura condição financeira.
Já imaginaram? Apenas UMA edição do Exame de Ordem por ano?
Pois é...
E isso geraria uma séria implicação para os candidatos!
Uma reprovação custaria um tempo IMENSO para os examinandos! Somente no ano seguinte eles poderiam tentar novamente a sorte. O mesmo valeria para os candidatos da repescagem.
Hoje então, se um candidato é aprovado apenas em sua 3ª tentativa, ele gasta um ano. Com essa mudança ele levaria 3 anos para entrar no mercado! Isso sem falar naqueles que tentam mais vezes!
A classe dos advogados, que não quer mais concorrentes, ADORARIA ver isso acontecer!
Essa tentativa do deputado Eduardo Cunha não prejudica a OAB, ela prejudica os bacharéis e os estudantes que querem entrar na Ordem pela porta da frente!
E a OAB pode fazer isso? Pode sim, pois a lei 8.906/94 não estipula o número de edições por ano da prova.
Art. 8º Para inscrição como advogado é necessário:
I - capacidade civil;
II - diploma ou certidão de graduação em direito, obtido em instituição de ensino oficialmente autorizada e credenciada;
III - título de eleitor e quitação do serviço militar, se brasileiro;
IV - aprovação em Exame de Ordem;
V - não exercer atividade incompatível com a advocacia;
VI - idoneidade moral;
VII - prestar compromisso perante o conselho.
§ 1º O Exame da Ordem é regulamentado em provimento do Conselho Federal da OAB.
(...)
Se a regulamentação do Exame está nas mãos do CFOAB, ele pode sim alterar o número de edições da prova, tudo com respaldo legal.
Tudo por obra e graça de um parlamentar que não cansa de criar picuinha com a OAB.
O risco existe, é real, e já foi ventilado dentro do próprio CFOAB.
Sim, a Ordem vai trabalhar para derrubar a proposta de Eduardo Cunha, como vem trabalhando sem parar desde que ele botou na cabeça que quer acabar com o Exame de Ordem. Mas no atual contexto político, sendo Cunha presidente da Câmara e, virtualmente, o político mais poderoso da atualidade, a vida da OAB não está sendo fácil.
Se ele consegue impor VÁRIAS derrotas ao Governo, por que não sobre a OAB?
De tanto brigar com a OAB ele vai é prejudicar, de verdade, centenas de milhares de bacharéis e estudantes que estudam e lutam para vencer na vida pelo próprio mérito.