Quinta, 14 de julho de 2011
Os índices de aprovação e reprovação nos exames da OAB que vêm sendo apresentados não permitem uma análise comparativa adequada entre os cursos jurídicos do país.
São apresentadas informações alarmantes acerca do índice de reprovação no exame da OAB, o que aquece o debate sobre o excesso de cursos de direito existentes, os desafios sobre processos regulatórios e avaliativos e a demanda sobre a necessária qualificação da formação jurídica ofertada.
A seriedade do debate proposto, entretanto, exige que as informações produzidas em relação ao desempenho acadêmico de um curso, à sua capacidade de profissionalização ou à qualidade de seus egressos decorram da análise de dados consistentes e comparáveis.
Todavia, os índices e ranking veiculados devem ser olhados com cuidado, uma vez que a lista das instituições de ensino, com seus respectivos percentuais de aprovação, compara situações muito diversas. Por exemplo, é possível identificar um índice de aprovação de 100%, ou 0%, que conte com a participação de apenas um aluno inscrito em determinado curso.
Seria relevante pensar na construção de um índice consistente, que de fato pudesse comparar situações equivalentes. Se os índices fossem feitos levando em consideração os formandos de cada ano, as universidades, o mercado, o MEC e a própria OAB poderiam ter uma informação real para fazer eventuais ajustes de forma mais efetiva.
É preciso destacar que, a partir do edital de exame da OAB de junho de 2010, os alunos do último ano de direito podem prestar exames muito antes de se formarem, com a simples comprovação de matrícula no quinto ano do curso.
O destaque para esse fato é que essa situação agrega novas possibilidades de comparações indevidas quando se fala de índice de aprovação no exame da Ordem: é possível que um exame conte exclusivamente com candidatos que ainda são alunos e que outro conte com candidatos já formados.
No último exame da OAB, por exemplo, a Direito GV contava apenas com seis alunos formados em 2010, pois os demais já tinham sido aprovados em exames anteriores, e a grande maioria era de alunos que acabavam de se matricular no quinto ano. Da turma que se formou em 2010, o índice de aprovação da Direito GV é de 95%.Quantos alunos formados ou em curso compunham o quadro de inscritos das demais faculdades? Os índices que nos foram apresentados não fazem essa distinção.
Pensando na construção de um índice consistente e equivalente, seria interessante que fosse construído um índice de percentual de aprovação que levasse em conta exclusivamente os prováveis formandos de cada ano.
Tal índice consideraria os alunos inscritos/aprovados na soma dos exames feitos a partir do início do quinto ano de curso até o primeiro exame após a formatura da turma.
Evidentemente, a comparação de índices teria que trabalhar por faixas de inscritos. Afinal, uma instituição que teve mais de 70% da turma de formandos inscrita nos exames autorizados não pode ser comparada com uma que teve um ou poucos alunos inscritos nessa condição.
Essa proposta permitiria o conhecimento do percentual de alunos de cada universidade aprovados no exame da OAB imediatamente após sua formatura.
Ou seja, escolas, mercado, sociedade civil, Ministério da Educação e OAB poderiam saber a cada turma de formandos qual o efetivo percentual de aprovação em cada ano.
A partir dessa nova informação construída seria possível falar na elaboração de uma análise comparativa em relação aos cursos de direito do país, o que não pode ser aceito hoje, diante da forma como a informação é compilada.
Por Adriana Ancona de Faria, é coordenadora institucional da Direito GV.
Fonte: Folha de S.Paulo
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A abordagem da Drª Adriana é correta. Os dados do Exame de Ordem precisam ser filtrados para se revelar com clareza a aprovação dos candidatos de cada faculdade em função de sua situação acadêmica.
Há de se ressaltar, entretanto, que a possibilidade dos ainda acadêmicos prestarem a prova a partir do último ano não decorreu de uma ação deliberada da OAB, mas é resultado de uma Ação Civil Pública movida, se não me engano, pelo MPF/ES. A OAB nunca quis que os acadêmicos fizessem a prova.
E a atual conjuntura, com o Exame de Ordem adentrando as faculdades, produzirá um impacto inevitável na sistemática acadêmica e nos projetos pedagógicos.
O Exame de Ordem tem um perfil específico, implica na seleção dos examinando a partir de sua própria metodologia, e realmente não pode ser visto com um sistema indicativo de qualidade, não ao menos de forma direta.
Por outro lado, a prova da OAB é única porta para o exercício de uma profissão jurídica de forma imediata, e passaporte para o amadurecimento profissional. O bacharel ou logra a aprovação no Exame ou luta pelo o ingresso no serviço público, muito mais seletivo, limitado e difícil.
Mesmo não sendo um instrumento adequado de aferição de qualidade, acaba se tornando em um, não só por sua objetividade de análise como por sua importância pelo ponto de vista exclusivamente do mercado profissional.
E disso nem examinandos e nem faculdades têm como fugir.
O Exame de Ordem, como pontuou o Dr. Sandro Alex Simões, é uma prova para uma entidade de classe, e não métrica de aferição de qualidade. Não é, não diretamente, mas acaba sendo utilizado para tal, não porque seja único, e não é, mas sim porque é determinante para o exercício profissional.