Exame de Ordem para que mesmo?

Sexta, 1 de julho de 2011

O Estadão Online publicou hoje uma matéria inacreditável do Jornal da Tarde abordando a uma curiosa inovação de algumas faculdades particulares paulistas para os seus alunos: a revisão de conteúdos de Língua Portuguesa e Matemática do ensino fundamental e médio. Segundo a matéria (cliquem AQUI) "os alunos chegam ao ensino superior sem saber nem mesmo a tabuada, por exemplo, ou resolver divisões simples e equações com fração. Em Português, precisam reaprender ortografia, concordância e pontuação. De maneira geral, não conseguem ler um texto complexo, próprio do curso, e responder a questões."

Segundo Magali de Paula, professora do projeto Aprimorar do Centro Universitário Sant?Anna (UniSant?anna), e ouvida pela reportagem, ?o ensino público está muito ruim? e ?os alunos chegam à instituição semianalfabetos?.

Fiquei aqui me perguntando para que serve o vestibular.

Sim, o bom e velho vestibular, aquela prova que em breve fará parte dos livros de história como prática obsoleta do século XX.

De acordo Rodrigo Capelato, diretor executivo do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo. ?Esse é o nosso público. E ele também tem direito de cursar a faculdade?.

Não, esse público NÃO tem o direito de cursar uma faculdade!!! Essa é uma visão de mercado, valorada em função dos interesses econômicos das faculdades privadas.

Como um indivíduo entra em uma faculdade sem saber (bem) o português e a matemática, fundamentos ELEMENTARES do conhecimento???

Para entrar em uma faculdade há de se ter um mínimo de base educacional. Um mínimo! Essa é uma premissa básica, inequívoca!!! As deficiências apontadas na matéria mostram um ensino de base em frangalhos que deveria inviabilizar o ingresso do estudante na faculdade.

Mas isso não acontece.

E minha posição NÃO É ELITISTA. Obviamente existem causas econômicas e sociais por detrás dessas deficiências, mas é sanando-as que a questão do ingresso no ensino superior é resolvida, e não meramente abrindo as comportas de forma indistinta para pessoas sem o mínimo de condições e depois dar aula de português e tabuada (aula de reforço de tabuada na faculdade é algo simplesmente inacreditável).

Venho escrevendo sobre a expansão do ensino superior no Brasil e o impacto dela no futuro do Exame de Ordem:

Péssima qualidade dos cursos reduz procura por cursos de direito

OAB denuncia explosão irresponsável do MEC na criação de cursos de direito

O Exame da OAB fazendo escola: Exame de Suficiência da classe contábil tem alto índice de reprovação em todo o Brasil

Perigos da expansão desenfreada de cursos de Direito

Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior quer acabar com a interferência da OAB na autorização e reconhecimento de novos cursos jurídicos

É óbvio que esse problema atinge também as faculdades de Direito, assim como atinge qualquer outra graduação.

Já escrevi aqui e repito mais uma vez: hoje as faculdades de Direito dão diplomas para analfabetos funcionais. Isso eu constatei pessoalmente ao analisar centenas de provas de candidatos reprovados.

É fato!

Com a expansão do ensino superior no nosso horizonte, esse quadro tornar-se-á caótico.

Nesse contexto é quase certo que todos os conselhos profissionais queiram criar seus respectivos exames, tal como a OAB o faz.

O quadro do ensino superior no Brasil é de calamidade pública. O MEC, na prática, não existe, e essa matéria do Estadão deveria desencadear uma investigação séria pelo Ministério Público Federal.

Mas, como isso é Brasil...

O Exame de Ordem aparece como um instrumento de regulação enviesado do sistema: excesso de acadêmicos, excesso de faculdades, autorizações para o funcionamento de novas instituições dadas sob critérios duvidosos, saturação de mercado, ausência de políticas públicas eficazes e um Exame de Ordem para conter a irresponsabilidade do Estado e a ganância do empresariado da educação.

Ele é, sem sombra de dúvida, uma instância de controle de uma entidade de classe em resposta à falta de controle e responsabilidade do Estado.

O futuro da educação superior no Brasil é sinistro. E escrevo isso sem querer forçar a retórica. É sinistro MESMO!