Entrevista com os dois candidatos a presidente do Conselho Federal da OAB

Quarta, 23 de janeiro de 2013

O site Conjur publicou hoje duas entrevistas com os candidatos a presidente do Conselho Federal da OAB, Alberto de Paula Machado e Marcus Vinícius Furtado Coelho. No dia 31 de janeiro o CF escolherá um dos dois para presidir a entidade no próximo triênio, em substituição ao atual presidente, Ophir Cavalcante.

São entrevistas longas e a abordagem  dos temas foi bastante variada. Pincei nelas o pensamento de ambos sobre os temas que nos interessam: Exame de Ordem e educação jurídica. Infelizmente o grau de dificuldade do Exame de Ordem não foi tema da entrevista.

Confiram as opiniões dos candidatos!

Alberto de Paula Machado:

ConJur ? O Exame de Ordem é alvo de diversos projetos de lei no Congresso Nacional. Alguns querem a sua extinção, outros o modificam de maneira bastante profunda. Por que o Exame de Ordem é necessário?

Machado ? O Exame de Ordem é necessário porque nós temos que ter a responsabilidade de garantir que o advogado só entre no mercado de trabalho se possuir as condições mínimas para o exercício da profissão. Com isso, nós estamos protegendo o cidadão, que será atendido por um advogado capaz de responder à demanda judicial, capaz de propor a sua ação, de defender o cliente em torno de algum assunto de seu interesse.

ConJur ? A questão é assegurar institucionalmente a qualidade no nível técnico do advogado?

Machado ? Sim. Não temos um curso que forma advogados. Temos um curso de Direito que forma bacharel em Direito. Esse bacharel em Direito tem possibilidade de ampla atuação no mercado de trabalho. Pode atuar futuramente como juiz, pode atuar como membro do Ministério Público, pode atuar como delegado de Polícia. Enfim, são várias as atividades que podem ser exercidas pelo bacharel em Direito. O advogado tem que ter determinado conhecimento técnico e típico para o exercício dessa profissão, e o modo como esse conhecimento é aferido é através do Exame de Ordem.

ConJur ? A formação acadêmica não dá conta disso?

Machado ? Temos a questão da proliferação de cursos de Direito no Brasil, o que fez inegavelmente com que a qualidade do ensino jurídico seja prejudicada. Há inequívoco prejuízo na formação de muitos bacharéis em Direito e, por isso, o Exame se torna indispensável para o bom exercício da profissão.

ConJur ? O que a OAB pode fazer ou o que o senhor pretende fazer em relação a essa proliferação das faculdades de Direito e em relação ao aperfeiçoamento da qualidade do ensino jurídico?

Machado ? Penso atuar em duas frentes. Em uma delas, estreitar o diálogo que já é feito com o Ministério da Educação no sentido de que não sejam criados mais cursos de Direito. E que também sejam canceladas as vagas de cursos existentes que não estejam atendendo as exigências técnicas do Ministério da Educação. A outra forma seria levar essa questão ao Poder Judiciário, porque educação é atividade de Estado, portanto é dever do Estado exercer a fiscalização. Ou seja, não debatê-las apenas no âmbito da Ordem.

ConJur ? O parecer que a Ordem emite recomendando ou desaconselhando determinados cursos já não vai nesse sentido?

Machado ? Esse parecer tem que ter força vinculativa à decisão do Ministério da Educação. Nós já demonstramos, ao longo da história, o nível de responsabilidade que nós temos com esse tema, o que significa dizer que o veto da OAB, quando ocorre, é de modo fundamentado e criterioso.

ConJur ? Professores dizem perceber em sala de aula, nos cursos de Direito, que a maioria dos estudantes está interessada em concursos. A advocacia privada está em crise? O profissional liberal é uma espécie em extinção?

Machado ? O que houve nos últimos anos, especialmente a partir de 1988, foi um enorme crescimento de vagas no âmbito da Advocacia Pública, no âmbito das procuradorias, do próprio Poder Judiciário. Esse aumento de vagas de oferta e o aumento da remuneração atraíram muitas pessoas. Existe ainda um bom mercado para a advocacia de um modo geral. O que está a ocorrer é a modificação das áreas de atuação, dos níveis de especialização. Há muita gente hoje praticando advocacia não contenciosa, aquela consultiva, enfim, existem nichos que estão sendo gradativamente ocupados pelos novos advogados.

ConJur ? E a situação do advogado empregado, que prefere trabalhar para um escritório do que empreender? A exemplo do que vem ocorrendo com outros ramos, faltam empreendedores na advocacia? Hoje se fala em proletarização da profissão do advogado. Onde entra a OAB nisso?

Machado ? Em primeiro lugar, a advocacia é distinta nas várias regiões do país e, muitas vezes, em uma mesma região, muda bastante o perfil entre o advogado da cidade grande e o do interior. Fiz alguns estudos na época em que estive na direção e na presidência da seccional paranaense, sobre o perfil do advogado brasileiro. Esse, inclusive, é um dos itens da nossa plataforma de trabalho para que tracemos o perfil do advogado brasileiro. Quando fizemos esse estudo, há alguns anos, percebemos que ainda compõem a maioria dos advogados brasileiros aqueles que trabalham em pequenos escritórios de advocacia, com um ou dois advogados.

Fonte: Conjur

Marcus Vinicius Furtado Coelho

ConJur ? O Exame de Ordem é realmente necessário?

Furtado Coêlho ? Sim. Por diversos motivos. Primeiro, pela realidade do sistema educacional superior no que tange o ensino jurídico. Nos últimos 15 anos, o número de faculdades de Direito no Brasil subiu de 200 para 1.200 escolas. Os principais beneficiários do fim do Exame de Ordem seriam as faculdades de péssima qualidade, porque elas venderiam um produto mais rentável, mas de qualidade sofrível. Além do diploma de bacharel em Direito, elas iriam vender o exercício da profissão, sem se preocupar com a qualidade. Nas pesquisas que realizamos com estudantes de Direito que fizeram as provas, a ampla maioria foi favorável ao Exame de Ordem porque não querem nivelar por baixo. Vamos propor ao MEC, já em fevereiro, o congelamento de criação de novas vagas em cursos de Direito já existentes e de novos cursos.

ConJur ? Além de impedir a criação de cursos, o que a OAB pode fazer para melhorar a qualidade do ensino?

Furtado Coêlho ? Vamos propor um grupo de trabalho com o MEC para verificar quais cursos têm condições de continuar funcionando. Isso significa fazer inspeção especial naqueles cursos que, nos últimos três exames de Ordem, não conseguem uma média mínima de aprovação, que não conseguem aprovar 5% de seus alunos, por exemplo. As boas faculdades de Direito aprovam. Quase 70% são aprovados na primeira tentativa. Na segunda tentativa, o restante já é aprovado.

ConJur ? A Ordem não emite um parecer em relação à criação de cursos?

Furtado Coêlho ? Sim. Dá um parecer para a autorização de funcionamento do curso e dá outro parecer para o reconhecimento do curso, cinco anos depois. Mas o parecer não vincula a decisão do MEC. E para que o parecer da Ordem não seja respeitado pelo MEC, faz-se necessário que haja outro parecer do MEC, quer dizer, que haja uma aprovação em nível recursal do parecer da OAB. Mas o segundo aspecto na defesa do Exame de Ordem é o da defesa do cidadão. O prejudicado com uma defesa mal feita é o cidadão, e esse prejuízo é irreparável. Já disse o Supremo Tribunal Federal, quando declarou constitucional o Exame de Ordem, que a exigência dessa prova de qualificação é necessária porque a advocacia pode trazer prejuízos irreparáveis a terceiros, à liberdade, aos bens, aos direitos das pessoas. Uma má orientação pode levar a novos litígios. Penso que o principal beneficiário do Exame de Ordem é o cidadão, que tem pelo menos uma certeza de que aquele advogado possui o mínimo de conhecimento jurídico para o exercício da profissão.

ConJur ? Professores dizem perceber em sala de aula, nos cursos de Direito, que a maioria dos estudantes está interessada em concursos. A advocacia privada está em crise? O profissional liberal é uma espécie em extinção?

Furtado Coêlho ? Esse fenômeno não é novo. Há 19 anos, quando eu ingressei na advocacia, da minha turma na Universidade Federal do Piauí, de 40 formandos, dois ou três foram para a advocacia. Os demais são hoje juízes federais, procuradores da República, promotores de Justiça, juízes de Direito. Mas há uma nova realidade na advocacia brasileira, do advogado empregado. Muitos estão submetidos à condição de empregados e de correspondentes de grandes escritórios que pagam valores mínimos de remuneração e honorários aviltantes.

É necessário verificar o fenômeno da proletarização da advocacia que toma o lugar da advocacia liberal e de profissionais que montam o seu escritório e, a partir daí, desempenham a sua profissão. O termo advogado pautista utilizado em alguns locais do Brasil é altamente revelador dessa situação. O advogado é um mero pautista, ou seja, alguém que vai para a audiência representar o cliente de outro escritório, por vezes sem sequer ter preparado a peça jurídica. O aviltamento da profissão pode ser uma das causas para o afastamento da advocacia liberal e a Ordem tem de ter um olhar sobre isso. Por exemplo, com a luta pela instituição de piso remuneratório aos advogados contratados em escritórios de advocacia. Isso já é uma realidade em alguns estados. No Piauí, conseguimos aprovar um piso de R$ 2 mil, que é considerado razoável para a realidade local. Precisamos discutir no Conselho Federal se há a necessidade de se fixar um piso nacional ou se isso fica a cargo das seccionais.

Fonte: Conjur