É possível hoje passar no Exame de Ordem sem fazer um cursinho?

Quinta, 13 de fevereiro de 2014

Qual é o papel de um curso preparatório dentro do mercado?

Seria um curso mera redundância, desnecessário, em especial para quem está se formando ou se formou em uma faculdade de ponta? Ou seria um elemento significativo na preparação dos candidatos, responsável por fazer a diferença na hora da verdade?

Lembro-me quando comecei a estudar para o Exame de Ordem em que fui aprovado. Comecei meu planejamento e meus estudos com 3 meses de antecedência, e minha metodologia envolvia duas práticas, a leitura de resumos e a resolução de muitos exercícios.

Lembrei até do resumo que usei, acho que não está mais nem no mercado, a coleção de Maximiliano Fuhrer, da Editora Malheiros:

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Hoje, creio, esta obra nem mais é vendida no mercado. Ao menos não é encontrável nas livrarias jurídicas.

Eu fazia assim: lia um resumo inteiro e depois resolvia todas as questões acessíveis daquela disciplina. Certo ou errado, eficiente ou não, consegui tirar 54 pontos (em 100) e passar na 1ª fase.

Para a 2ª fase fiz um cursinho, presencial, e consegui a minha aprovação.

Simples, não é?

Aparentemente sim, mas talvez nem tanto. Sofri emocionalmente tanto quanto qualquer um de vocês, e passei pelas mesmas tensões de sempre. Mas, com a mais absoluta certeza, hoje, valendo do processo de estudo que usei anteriormente, eu NÃO passaria na prova.

E não passaria pelas seguintes razões:

1 - Hoje o livro do Maximiliano não me seria útil. O resumo foi concebido para uma época em que o Exame de Ordem era mais fácil;

2 - Sim, de 2006 até hoje o grau de dificuldade da prova subiu MUITO. E subiu, acredito, porque a preparação para a OAB se tornou cada vez mais sofisticada. Ou a FGV incrementava o grau de dificuldade ou as estatísticas não manteriam o padrão abaixo:

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Não existe uma manutenção de um padrão se uma modulação da dificuldade em função do incremento dos estudos dos candidatos. Hoje existem uma série de recursos para todos estudarem, mas quando criei o Blog não era assim.

Com o desenvolvimento de cursos, aumento da competição entre eles e consequente, e natural, oferecimento de mais conteúdo, mais cursos específicos e um maior foco e conscientização de que é necessário estudar para ser aprovado, os candidatos estão hoje bem mais preparados se compararmos com os examinandos há alguns anos atrás.

Ou seja: é preciso também se esforçar mais, pois a FGV acompanhou este processo evolutivo.

Não vou afirmar com certeza absoluta, pois ainda acredito que é possível passar sem cursinho, mas essa é uma realidade para poucos.

O estudo ESPECÍFICO e CONSISTENTE para a OAB demanda, com certeza, uma preparação especializada.

Vamos partir da premissa, verdadeira, de que estudar é um processo complexo que envolve tempo, disposição, concentração, método, disciplina e investimento. A ausência de um desses fatores certamente prejudica o processo como um todo, implicando diretamente no desempenho do candidatos no concurso almejado.

Tempo, disposição, concentração, método e disciplina são fatores que, em maior grau, dependem exclusivamente do candidato e de sua organização pessoal.

Não custam nada para serem obtidos. Talvez o tempo seja mais custoso, de forma indireta, pois o candidato pode trabalhar ou ter família para cuidar e dispor do tempo implicaria em prejudicar uma outra atividade, gerando reflexos na vida pessoal. Mas, em tese, esse elementos são gratuitos.

Sobra o investimento.

E estudar custa dinheiro. E de um modo geral, ou mesmo quase como uma regra, o ensino privado no Brasil é melhor do que o público. Essa lógica só muda quando falamos do ensino superior, e aqui a excelência, também de um modo geral, está no ensino público.

Não por acaso, em uma observação bem tópica, as instituições que mais aprovam no Exame de Ordem são as públicas, pois, na média, conseguem aprovar mais de 50% de seus egressos. Por outro lado, 80% das instituições de ensino privado não aprovam sequer 10% de seus alunos.

Essa discrepância quer dizer muita coisa. Por um acaso, os melhores alunos do ensino médio, em especial do ensino médio privado, vão para as universidades públicas, e isso guarda ao fim uma correlação com o desempenho das instituições de ensino superior no Exame de Ordem. Há de se considerar, é claro, que isso não representa uma verdade absoluta - Mais de 40% dos alunos das universidades federais são das classes C, D e E - mas o Direito é um curso de prestígio e o perfil dos estudantes, ao menos nas universidades públicas, ainda é de alunos agraciados com um ensino médio pago e de qualidade.

O discurso oficial da OAB diz que o bom aluno passa no Exame. E é verdade: os bons alunos passam no Exame, principalmente os das universidades públicas.

Mas também bons alunos reprovam.

Ultimamente 80% dos candidatos reprovam, expondo a severidade da prova da OAB, que, como processo seletivo, tem suas peculiaridades (e suas injustiças). E tendo peculiaridades, uma preparação específica ajuda a superar a prova, independente da qualidade da instituição do examinando.

Um dos conselhos que dou aos candidatos antes de começar os estudos ESPECÍFICOS para o Exame é o de resolver uma prova passada para se sentir, para ver como está o preparo e a bagagem de conhecimentos. Curiosamente, o feedback que recebo é dos piores: a maioria apresenta um desempenho pífio.

E faço essa sugestão exatamente por ter aplicado ela em mim mesmo quando comecei a minha preparação para a prova. Lembro-me bem do sentimento de perplexidade ao constatar que só havia acertado 23 questões da prova simulada. Foi um choque!! Me senti um verdadeiro asno e fiquei apavorado pois iria iniciar meus estudos faltando apenas 3 meses para a 1ª fase.

E, ao longo desses 3 meses, estudando 5 horas por dia, meu desempenho nos simulados auto-aplicados foi gradativamente melhorando, até eu ir para a prova com a convicção de que iria passar.

E passei!

O que mudou nesse intervalo de tempo tão curto? Em 3 meses ninguém aprende todo o Direito.

Eu acredito que não se trata de um processo exato de aprendizagem, mas sim de se relembrar e, principalmente, de se adaptar ao sistema da prova.

Parte desse processo de adaptação e rememorização é obtido com os cursos preparatórios, cujo papel para muitos dos aprovados é fundamental.

E esse papel decorre de uma demanda, de uma busca dos candidatos, pois os cursos não são obrigatórios para se passar no Exame. São uma opção para um objetivo em específico, assim como também são uma opção para os concursos públicos. Você pode querer ser juiz um dia e não precisar fazer um curso para ser um. Mas neste caso certamente vai enfrentar alguém que fez, e este alguém pode estar bem mais preparado...

Os cursos fazem parte de um aspecto do investimento. De um investimento visando um propósito.

Fazer um curso é uma opção, geralmente escolhida em razão de uma simples necessidade: o candidato quer passar no Exame de qualquer jeito e INVESTE nisso. É seu futuro profissional que está em jogo!

Livros atualizados também. Estes têm um custo, mas em troca oferecem o que o candidato está procurando: informação atualizada, revisada e editada.

Pensando nisso tudo, lembrei-me de só ter conhecido uma única pessoa aprovada no Exame que não estudou com livros específicos ou mesmo fez cursos, tanto para a 1ª como para a 2ª fase. Foi um colega de sala meu. Naturalmente, foi agraciado pela natureza com uma inteligência excepcional, inteligência essa já notada desde o início da faculdade por mim e pelos demais colegas.

Nós, pobres mortais, precisamos ralar um pouco para conseguir a aprovação ou qualquer outro tipo de sucesso na vida.

É possível estudar por conta própria e ser aprovado?

Aqui, neste ponto, é preciso contextualizar a problemática. Vamos falar da última prova objetiva, a do XII Exame de Ordem.

O percentual de aprovação foi de apenas 21%, e isso é muito, mas muito pouco. Ou seja: quem não estudou FORTE para esta primeira fase provavelmente ficou no caminho. E o nível da prova foi bem acima da média.

Tendência futura?

Quem sabe?

Falando em tendências, vamos dar uma olhadinha em questões de edições anteriores do Exame e estabelecer uma pequena comparação apenas ilustrativamente. Vou pegar algumas questões de uma mesma disciplina de edições passadas do Exame de Ordem para vermos a evolução do grau de dificuldade da prova.

Exame de Ordem 2008.3, ainda na era CESPE:

Considere que um advogado que nunca tenha sido punido disciplinarmente seja processado pela OAB, sob a acusação de violação de sigilo profissional, e venha a ser condenado. Nessa situação, deve-se aplicar pena de

A censura. B exclusão, com retenção de honorários. C suspensão. D multa progressiva.

Exame de Ordem 2010.2, o primeiro da FGV:

Dentre as sanções cabíveis no processo disciplinar realizado pela OAB no concernente aos advogados estão a censura, a suspensão, a exclusão e a multa. Dentre as circunstâncias atenuantes para a aplicação do ato sancionatório, encontra-se, consoante o Estatuto,

(A) exercício assíduo e pro?ciente em mandato realizado na OAB. (B) ser reincidente em faltas da mesma natureza. (C) prestação de serviços à advocacia, mesmo irrelevantes. (D) ter sido o ato comei do contra outro integrante de carreira jurídica.

IX Exame de Ordem Unificado:

Laura, advogada na área empresarial, após concluir o mestrado em renomada instituição de ensino superior, é convidada para integrar a equipe de assessoria jurídica da empresa K S/A . No dia da entrevista final, é inquirida pelo Gerente Jurídico da empresa, bacharel em Direito, sem inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil, apesar de o mesmo ter logrado êxito no Exame de Ordem. Observado tal relato, consoante as normas do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB, assinale a afirmativa correta.

A) O bacharel em Direito pode exercer as funções de Gerência Jurídica mesmo que não tenha os requisitos para ingresso na Ordem dos Advogados. B) A função de Gerente Jurídico é privativa de advogados com regular inscrição nos quadros da Ordem dos Advogados. C) O bacharel em Direito, caso preencha os requisitos legais, inclusive aprovação em Exame de Ordem, pode exercerfunções de Gerente Jurídico antes da inscrição na Ordem dos Advogados. D) A função de Gerente Jurídico, como é de confiança da empresa, pode ser exercida por quem não tem formação na área.

XII Exame de Ordem, a última prova:

Fernanda, advogada regularmente inscrita nos quadros da OAB, atua, individualmente, sem sócios, em seu escritório situado no centro da cidade ?Z?, onde recebe os seus clientes para atividades de assessoria e consultoria, atuando também no contencioso cível, administrativo e trabalhista. Em visita de cortesia, recebe sua prima Giselda que, estudando Economia, tem acesso a várias pessoas de prestigio social, econômico e financeiro, em razão da sua atividade como assessora da diretoria de associação empresarial. Por força desses vínculos, sua prima começa a indicar clientes para a advogada, que amplia o seu escritório e passa a realizar parcerias com outros colegas, diante do aumento das causas a defender. Não existe qualquer acordo financeiro entre a advogada e a economista.

Com base na situação descrita, nos termos do Estatuto da Advocacia, assinale a afirmativa correta.

A) Constitui atividade infracional disciplinar receber clientes de pessoa com relação de parentesco e prestígio social. B) Constitui atividade corriqueira, não infracional, o relacionamento social com parentes ou não. C) Constitui atividade ilícita por valer-se de parentes para obtenção de clientela, mesmo gratuitamente. D) Constitui atividade vedada, uma vez que a clientela deve ser formada espontaneamente pelo advogado.

O volume de informações a serem filtradas e trabalhadas pelos candidatos para cada questão ser respondida corretamente é bem distinta. A diferença do grau de dificuldade entre elas é manifesta.

Óbvio! Pinçar uma questão de uma prova e comparar com uma questão de outra prova não consegue demonstrar quaisquer diferenças entre uma ou outra edição do certame. A exposição acima é meramente demonstrativa.

Mas as provas de referência de cada questão foram devidamente linkadas. Convido vocês a lerem cada prova e tirarem suas próprias conclusões.

Muito dificilmente discordarão da minha conclusão: a prova está cada vez mais difícil.

Eu poderia fazer o mesmo com edições passadas da 2ª fase. Neste caso as discrepâncias seriam muito maiores.

A prova, sem a menor sombra de dúvida, vem experimentando um acréscimo paulatino e constante em seu grau de dificuldade. Isso é um fato.

Antes eu acreditava que era possível fazer a prova sem precisar de um cursinho. Creio que ainda é, mas essa convicção aos poucos está sendo solapada, e está porque a prova vem evoluindo. Ou o candidato evolui junto ou não conseguirá passar.

De toda forma, sempre é necessário investir no estudo, de uma forma ou de outra, para otimizar o resultado.

Ir para a prova apenas com a coragem, no peito e na raça, é tarefa para poucos.

Existe uma indústria dos cursinhos e dos livros? Sim, sem dúvida! Mas essa "indústria" existe porque ela é demandada pelos candidatos, exatamente em razão da NECESSIDADE da aprovação.

Essa "indústria" está aí não para explorar ninguém, e sim para atender necessidades. Os candidatos pagam para receber conhecimentos, e os cursos, inegavelmente, cumprem com o seu papel. Dessa forma, os cursos possuem significativa relevância dentro do contexto do Exame, apesar de muitos acusá-los de serem exploradores dos candidatos.

Nada mais longe da verdade...

Então, bem antes do Exame de Ordem bater na porta, planejem-se para fazê-lo e tenham a exata noção de seus potenciais e deficiências. Só assim vocês poderão fazer a melhor escolha, investindo, ou não, o seu dinheiro.

Mas tenham em mente uma coisa: o pior prejuízo em uma reprovação é o tempo perdido. Quantas e quantas oportunidades não passam na frente de um candidato reprovado e ele não podem aproveitá-las porque a carteira ainda é um sonho?

Pensem nisso.