Cursos de Direito: uma verdade que também precisa ser dita

Terça, 20 de setembro de 2011

Por Waldy da Rocha Ferreira Neto

Não sei se, em qualquer outra época da nossa história, houve, no Brasil, um curso superior que despertasse tanto interesse como o de Direito. De repente, ou, vá lá, de um certo tempo para cá, o diploma de bacharel em Direito transformou-se em um dos documentos mais cobiçados, como se o simples fato de possuir um fosse capaz de garantir, ao felizardo detentor, pleno e imediato acesso a um mundo de prestígio, fama e, principalmente, fortuna. Neste cenário idílico, pipocaram (o termo é esse mesmo, pipocaram) cursos jurídicos país afora, alguns, como têm revelado os decepcionantes índices de aprovação no exame da OAB, sem a menor estrutura e, portanto, sem quaisquer condições de formar bons profissionais.

É evidente ? não se pode negar ? que ao bacharel em Direito (ainda) descortina-se um horizonte de reais possibilidades de ascensão social e profissional, sendo, de longe, entre todos os que saem das faculdades, aquele que mais perspectivas concretas tem de conquistar, quando não excelentes, bons empregos, notadamente no setor público. Com efeito, poucos são os que, egressos de um curso superior e com pouco tempo de experiência profissional, podem sonhar com empregos públicos cujo salário inicial hoje está no patamar de vinte mil reais, casos de juiz federal e procurador da república, para ficar só com estes dois exemplos, sem falar nos empregos públicos para cujo ingresso o candidato sequer depende da pré-condição de ser advogado, casos, por exemplo, de delegados de polícia (estadual ou federal) e auditores fiscais, também nas duas áreas.

Mas há um detalhe precioso que não está sendo levado em conta pelos pregoeiros das supervantagens e dos superbenefícios dos cursos de Direito. É que a população brasileira, das grandes às pequenas cidades, cresceu pouco, ou relativamente pouco, nesta última década, como atestou o IBGE no último censo realizado. E o que isso tem a ver, particularmente, com os bacharéis em Direito e os advogados? É simples: caso, daqui para frente, a população continue experimentando pequeno crescimento, a demanda por prestação jurisdicional crescerá, basicamente, na mesma proporção, o que fará diminuir, consideravelmente e por consectário, a necessidade, para o funcionamento da máquina judiciária, de novos juízes, novos promotores de justiça, novos procuradores estaduais, novos defensores públicos e assim por diante, inexistindo razão, consequentemente, para a realização de concursos para estas áreas com a mesma frequência que se vê nos dias de hoje.

É verdade ? cabe reconhecer ? que se novos municípios forem criados, e é previsível que, por um viés de nossa prática parlamentar, continuarão sendo criados às pencas, novas comarcas haverão sempre de ser criadas (além, é óbvio, de novas varas nas comarcas já existentes), provocando, por via de conseqüência, a necessidade de realizarem-se concursos de tempos em tempos, mas, mesmo assim, é claro que esses concursos não virão, nem de longe, com a abundância que hoje se verifica.

Quanto à realização de concursos para também preencher as vagas deixadas por aqueles que se aposentam, basta que se cite, como exemplo que certamente ilustra uma realidade presente em todas as demais áreas, o caso dos juízes e promotores atualmente em atividade em todo o país. A média de idade deles, para quem não sabe, gira em torno dos quarenta anos, o que dá para dizer que, por baixo, ainda terão pela frente, em média, pelo menos mais uns vinte anos de batente, situação que, por esta razão específica, seguramente não favorecerá a realização de novos concursos com a regularidade atualmente verificada.

O resultado de tudo isso é que, em um futuro próximo, essa paisagem de exuberância que tanto vem seduzindo quem deseja alcançar os excelentes empregos acima citados, e tantos outros na seara jurídica, infelizmente vai se modificar. Quando tal momento chegar, ou seja, quando de fato começarem a rarear tais concursos, é bom que os advogados, assim como os próprios bacharéis em Direito, sobretudo os que tenham saído da faculdade há pouco tempo, estejam realmente preparados para enfrentar os desafios, cada vez maiores e mais árduos, de uma atividade liberal que, devido justamente aos encantos que já há algum tempo vem despertando em grande parte da população, conta com um número gigantesco de profissionais.

Como dizem os mais velhos, sempre haverá espaço para os bons, para aqueles que fazem a diferença. E para aqueles que, por um ou outro motivo, não são tão bons? É precipuamente para eles que escrevo este artigo, à guisa de alerta. Que, conscientizando-se de suas eventuais deficiências, estudem sempre e mais do que os outros. É o meu humilde conselho.

[1] Sócio do Escritório Moreira Serra & Advogados Associados; Especialista em Direito Processual Civil e em Relações de Consumo; membro da Comissão de Jovens Advogados.

Fonte: OAB/MA