Quarta, 27 de agosto de 2014

O que é uma commodity? Vamos olhar a definição da Wikipédia:
Commodity é um termo de língua inglesa que, como o seu plural commodities, significando literalmente mercadoria, é utilizado para designar bens e as vezes serviços para os quais existe procura sem atender à diferenciação de qualidade do produto no conjunto dos mercados e entre vários fornecedores ou marcas.
Uma commodity é um bem fungível, ou seja, é equivalente e trocável por outra igual independentemente de quem a produz, como por exemplo o petróleo, a resma de papel, o leite, o cobre e os imóveis.
Ontem abordei sobre a questão o advento do site chamado Processe Aqui, onde os internautas podem, por conta própria, elaborar petições para processar empresas sem precisar pagar por documentos, profissionais especializados ou pelas custas dos processos.
"Processe Aqui": site oferece serviço que "substitui" o advogado em juizados especiais
Segundo a reportagem, o site é voltado para os processos de juizados especiais que pedem indenização de até 20 salários mínimos (R$ 14.480).
A questão é que o "Processe Aqui" não é bem uma novidade neste mundo. Longe disto!
Nos Estados Unidos, a ABA - American Bar Association - ou seja, a OAB deles, tentou derrubar pela via judicial um primo do Processe Aqui, o LegalZoom, e não se deu muito bem...
De acordo com o Conjur, o LegalZoom foi fundado em 2001, oferecendo um modelo de negócio igual ao do Processe Aqui: a venda de petições de ações judiciais populares a preços módicos, exatamente como qualquer commodity.
Para vocês terem uma ideia, a LegalZoom faturou em 2012 cerca de US$ 200 milhões. É muita grana!
O Conjur mostrou qual seria o cerne da polêmica entre a ABA e o LegalZoom:
Hoje, a LegalZoom é a mais bem-sucedida fábrica de petições eletrônicas em massa, com uma pitada de ?serviços jurídicos não autorizados? embutida no pacote. Essa ?pitada? ? ou uma pequena quantidade não definida claramente ? de serviços jurídicos não autorizados é o que está no cerne das disputas entre os advogados e a empresa. Teoricamente, ela disponibiliza questionários que são respondidos pelos clientes. A equipe da empresa, formada por um ?mix de advogados e não advogados?, revisa as respostas, faz correções e ?avalia a consistência? do documento. Isto feito, o sistema gera a petição, que é impressa e assinada pelo cliente.
Porém, os serviços da empresa evoluíram ultimamente para ?assessoria jurídica completa?, oferecida pela equipe mista de advogados e não advogados. Isso revela, para a comunidade jurídica, uma situação nebulosa: ninguém sabe exatamente o que a LegalZoom faz ou deixa de fazer. Por isso, o juiz que examina o caso na Carolina do Norte mandou fazer uma investigação para obter essa informação.
E lá, nos Estados Unidos, alguns advogados aparentemente entenderam que a realidade, definitivamente, mudou:
A diretora do Centro para a Profissão Jurídica da Universidade de Stanford, Deborah Rhode, diz que os advogados americanos já perderam o bonde ? ou o trem: ?O trem já deixou a estação e está viajando a todo o vapor?, disse ao Jornal da ABA. ?O que podemos fazer, agora, é mudar seu curso. Isto é, regulamentar o que a LegalZoom ? e outras tantas que já entraram no mercado, como a Rocket Lawyer, da Google ? pode ou não pode fazer e, assim, impedir que promova a comoditização total da advocacia.
Eis a preocupação na terra do Tio Sam: impedir a comoditização total da advocacia, e não, meramente, impedir que a internet seja um meio de difusão indiscriminada de petições prontas e acabadas.
Soa como uma espécie de rendição diante da realidade.
E aqui no Brasil? O Processe Aqui gerou reações negativas entre os advogados, que se sentem, corretamente, preteridos em seu trabalho e o risco de perda de receita em razão de um sistema "faça você mesmo".
Mas não para aí.
Existe, no Brasil, um outro processo de "Comoditização" em curso: o excesso de advogados e bacharéis em Direito.
Os Estados Unidos, com uma economia muitas vezes maior do que a do Brasil, têm aproximadamente 400 mil advogados; nós, 860 mil.
Com uma faixa salarial em torno de R$ 1.200,00 para jovens advogados, pagamentos de diligências no valor de R$ 50,00 ou mesmo a criação e péssima remuneração do "advogado audiencista", a situação não anda nada fácil.
Isso sem contar com as pressões para acabar com o Exame de Ordem ou criar a figura do paralegal.
Câmara regulamenta a profissão de paralegal para bacharéis em Direito. Texto vai para o Senado
O debate sobre o fim do Exame de Ordem deve voltar só em 2015
De um lado, a pressão tecnológica. Do outro, a pressão em função da explosão das faculdades caça-níqueis.
Cada vez mais a frase "advogar não é para os fracos" se faz mais verdadeira.