Quinta, 5 de dezembro de 2013
Há muito, sob influência do prof. Rogério Neiva, dei início, no Exame de Ordem, a classificação e compreensão da natureza das questões objetivas da primeira fase.
Quando iniciei esta abordagem estava preocupado com a estrutura da prova e, em especial, com a abordagem a ser feita pelos candidatos, pois a compreensão da natureza das questões tem o potencial de mostrar ao candidato a melhor forma de encarar a prova.
Afinal, se vocês compreendem a natureza do enunciado, conseguem refletir com calma sobre as possibilidades, em especial sobre o que, exatamente, lhes está sendo pedido.
Uma coisa é aplicar o conhecimento ao problema apresentado, outra, é entender a natureza do problema e compreender a melhor abordagem a ser feita.
Entender a natureza de uma questão, e sejamos sinceros, não ajuda em muita coisa. De toda forma, é algo fácil de ser compreendido, fácil de ser identificado e ajuda a estabelecer um rápido posicionamento quanto a forma de se abordar o enunciado de uma questão.
Existem apenas duas modalidades de elaboração de questões. A primeira é a conceitual ou conteudista, e a segunda é a operatória ou problematizadora.
A modalidade conceitual (conteudista) envolve a compreensão de um conceito e sua identificação dentro da questão, atendendo-se ao enunciado. O candidato precisa conhecer o conteúdo e identificar a assertiva correta em função do enunciado.
A utilização da memória e a percepção do certo e do errado são as chaves para a solução.
Aqui o foco está no conhecimento puro e simples. Tem correlação com ter memorizado o conteúdo jurídico.
Na modalidade problematizadora (operatória) o candidato precisa não só conhecer o conceito como também estabelecer um raciocínio para identificar qual a solução mais adequada para o problema. Neste caso, será necessário o uso do raciocínio para estabelecer a adequação entre o conceito, o problema hipotético e a solução adequada. Ou seja, é preciso raciocinar.
E como é no Exame de Ordem sob a égide da FGV e quais as implicações na hora de se resolver a prova?
Vamos analisar questões do IX Exame de Ordem, não só porque ela foi a mais difícil como também porque não há variações relevantes nas últimas edições que exija uma abordagem mais extensa.
A lógica toda está presente nesta prova.
Vamos primeiro identificar questões de natureza conceitual.
Todas elas não exigem raciocínio do candidato, somente a compreensão do tema e o estabelecimento de uma correlação entre a lei e a resposta adequada.
O enunciado ?A respeito da ação de habeas corpus, assinale a afirmativa incorreta? é extremamente sucinto, remetendo a atenção do candidato para as alternativas e exigindo deste o conhecimento estrito da letra da lei. O enunciado simples é quase vazio de informações, apenas remetendo ao tema de interesse da banca, informando tão somente o tema jurídico alvo e o tipo de resposta a ser escolhida, no caso, a correta.
A alternativa correta é a letra C, e o candidato teria que conhecer o instituto para responder essa questão, que não é tão óbvia assim.
É fácil perceber que tal questão exige apenas o uso da memória, sem nenhum raciocínio extra, e é o melhor tipo de questão para começar a se resolver a prova.
Entretanto, esse tipo de questão é propicio para a inclusão das chamadas ?pegadinhas?. A pegadinha consiste em uma tentativa da banca em confundir o candidato com soluções muito parecidas, sendo que uma das alternativas apresenta a modificação de um ou dois termos que a invalida como resposta correta.
A pegadinha gera dúvida e reduz a probabilidade de acerto, e o candidato tem de estar atento.
Entretanto, é bom ressaltar que tal tipo de questão não se presta somente a medir conhecimentos relativos à letra da lei, sendo que conceitos jurídicos-doutrinários também podem ser exigidos:
A alternativa certa é a B. Típico exemplo em que o conteúdo está vinculado à norma, no caso, constitucional.
Vejam que a resposta é a letra da CF:
Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei:
(...)
VIII - colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho.
Vejam que questão enjoada. O candidato é obrigado a conhecer a norma Constitucional, em uma parte nem tão estudada assim, para poder apresentar a resposta correta. Muito complicada e de apelo prático-profissional quase inútil.
A questão acima é nitidamente conceitual-doutrinária, e o estudo deve ser pautado na leitura de um livro.
O enunciado abaixo mostra uma questão com um extrema pobreza de conteúdo no enunciado, em que é pedida a resposta correta no sentido de dar uma completude ao enunciado a partir da escolha de uma definição legal-doutrinária:
De forma bem rasteira, ou sabe ou chuta. No caso, letra A.
Vocês acertariam?
O ponto é: o enunciado apenas serve de apresentação. Nele não há grande dicas ou informações complementares, obrigando o candidatos a realmente conhecer a doutrina, jurisprudência ou norma (em especial a norma, pois a prova é essencialmente dogmática) correlata.
Vamos analisar agora questões de natureza problematizadoras.
As questões que exigem o raciocínio do candidato são mais trabalhosas, pois demandam não só o conhecimento da norma e da doutrina como exige sua adaptação ao problema. Ou seja, não basta conhecer, é preciso compreender e adaptar.
Esse tipo de enunciado é mais complexo e demanda mais foco e concentração na hora de ser resolvido.
Vejam uma típica de situação-problema na qual o candidato precisa refletir para encontrar a alternativa adequada. O enunciado é bem mais extenso e conta um caso, uma história (a que chamamos de situação-problema) exigindo uma leitura bem mais atenta para a correta compreensão do enunciado. Aqui temos a forte distinção das questões operativas:
A resposta é derivada do problema, e sem a compreensão do enunciado (e do problema FÁTICO apresentado), não se tem a compreensão da resposta correta. A alternativa certa é a letra B.
A resposta correta está na letra A.
Agora prestem atenção na questão abaixo. Ela é muito interessante:
Leram o enunciado? Vamos imaginar que ele, o enunciado, fosse assim: Acerca do instituto da repercussão geral, assinale a alternativa correta.
Mudaria o sentido da resposta?
Não...
Aqui nós temos um sério problema na prova, que são as questões cujo os enunciados são inúteis. Na realidade, a questão acima poderia ser classificada como sendo pseudo-problematizadora. Na realidade, ela é conceitual, pois o enunciado não carrega informação útil ou relevante para a solução do problema.
Mas por que isso?
Obviamente é para cansá-los. O candidato lê um enunciado imenso e espera, evidentemente, que a resposta guarde correlação com um possível problema prático. Mas não é o caso. É o famoso "enchimento de linguiça", que serve para cansar a cabeça e cobrar o tributo da desatenção.
Não funciona com uma ou duas questões, mas depois de 2 ou 3 horas de prova, o conjunto da prova como um todo cobra o preço do cansaço.
Vejam o ápice da formulação deste tipo de enunciado:
A resposta está na letra B.
Se o enunciado fosse "a respeito do processo de execução brasileiro, assinale a alternativa correta, em nada, em rigorosamente nada o candidato perderia na análise das alternativas e em sua capacidade de oferecer a resposta correta. As alternativas estão divorciadas da pergunta.
Isso, meus caros, é para cansá-los e estressá-los.
Pois bem!
No plano da estrutura do conteúdo, as questões podem contar com as seguintes possibilidades:
? apenas afirmativas, exigindo a disponibilidade de conceitos: neste caso, a afirmativa pode ser correta ou não;
? afirmativas e justificativas: neste caso, ambas podem estar certas ou erradas, bem como uma estar certa e a outra errada. Muito cuidado, pois não é incomum a apresentação de uma afirmativa correta, com uma justificativa erra. Esta consiste numa pegadinha bastante perigosa.
? afirmativa principal e afirmativa complementar: muitas vezes a afirmativa complementar aparece como uma exceção a uma regra que aparece na afirmativa principal. Muitas vezes usa-se para tanto, como conector, a expressão ?ainda que?.
Ao se comparar as provas anteriores do Exame de Ordem, é nítida, muito nítida a distinção entre os tipos de questões cobradas. E as questões problematizadoras certamente predominam, porquanto são as questões que produzem um maior cansaço mental.
Enunciados mais extensos, como afirmado acima, demandam mais tempo, cansam mais e aumentam a probabilidade de distrações e perda de foco, afora o fato das questões serem mais intrincadas dificultam mais a escolha da assertiva correta.
Que lição tirar disso? Não existe, após se analisar os tipos de questões, um ?esquema? ou ?macete? para resolver as questões: ou o candidato sabe ou não sabe!
Trata-se de apenas uma questão de foco a atenção na resolução da prova. No máximo o candidato pode optar entre resolver primeiro as questões conceituais para depois abordar as operativas, mas isso implicaria em um processo seletivo muito extenso e para a prova seria contraproducente.
De toda forma, serve para identificar enunciados passíveis de conterem ?peguinhas?, e as conceituais são as melhores para esse tipo de construção: o candidato deve ficar atento!
Também serve para o candidato não ficar desesperado caso não consiga estabelecer uma correlação óbvia entre enunciado e respostas possíveis. Várias questões são feitas desta forma, fazendo que o examinando ache que não "pegou" o sentido da coisa, quando na verdade não há de fato um sentido a ser apreendido.
Não se confundam nesta hora!
E, por fim, vale o alerta de que as questões operatórias tendem a ser mais desgastantes que as questões conteudistas, e, em especial, as pseudo-operatórias são ainda mais.