Como resolver questões objetivas da OAB sem saber NADA do conteúdo da disciplina?

Terça, 18 de março de 2014

Como resolver questões objetivas da OAB sem saber NADA do conteúdo da disciplina?

"Chutando!", responderia o mais afoito!

Certo?

Mais ou menos!

O chute, na verdade, é a última ação, a última fronteira a ser usada pelo examinando. Quando não tem mais nada a fazer, quando a resposta for absolutamente incognoscível (uau!), o chute é a medida a ser imposta.

Mas antes do chute vem algo mais eficiente: o bom senso e a lógica! Com eles é possível responder algumas questões sem precisar apelar para o chute, e com isso somar pontos preciosos.

Evidentemente, em regra o desconhecimento do conteúdo inviabiliza gravemente a chance de acertar uma questão, e o uso da lógica e do bom-senso na busca da resposta correta encontra óbvias limitações.

Somente quando não há mais alternativa, ou seja, o candidato não sabe mesmo a resposta, que o uso do raciocínio e da coerência devem entrar em campo.

Vamos ver como funciona na prática?

Vamos dar uma olhada em uma questão de Direito Civil:

1

Enunciado enjoado, né? Ele foi concebido de forma intrincada exatamente para confundir o raciocínio e induzir ao erro. Mas com uma leitura atenta é possível achar a alternativa correta.

Vamos por etapas:

1 - A MAC Geral adquiriu de AC industrial equipamentos para fazer churro.

Primeiro ponto lógico: trata-se de um contrato entre MAC Geral e AC Industrial. A relação contratual é só entre essas duas empresas.

2 - A MAC Geral deve fazer o transporte dos equipamento se valendo dos serviços da Rota Transportes, figura estranha no contrato.

Segundo ponto lógico: a Rota Transportes NÃO faz parte do contrato original. A MAC Geral terá de contratá-la a parte para o serviço. Mas, para o problema, a Rota não é parte no contrato.

Vamos agora para as alternativas. Notem que devemos escolher a incorreta!

A) AC Industrial S.A. poderá exigir de Mac Geral & Companhia o cumprimento da obrigação firmada em favor de Rota  Transportes Ltda.

Pela lógica, e ignorando completamente o Direito, isso é certo. O contrato foi feito pelas duas empresas (criando obrigações recíprocas) e está explícito no enunciado que a obrigação da Mac Gera era a de transportar os equipamentos.

Correto.

B) Ao exigir o cumprimento da obrigação, Rota Transportes Ltda. deverá efetuar o transporte ao preço previamente ajustado pelas partes contratantes.

Se ficou ajustado entre os dois contratantes (Mac e AC) que o preço de contratação da Rota seria de R$ 100,00 por equipamento, então a Mac, que deverá contratar, o deverá fazer por este preço.

Correto.

C) Somente Rota Transportes Ltda. poderá exigir o cumprimento da obrigação.

Pergunta ESSENCIAL: a Rota faz parte do contrato? Não! Quem NÃO faz parte do contrato pode exigir o cumprimento da obrigação? Pela lógica, não.

E o enunciado facilita muito a vida para quem pensa um pouquinho: somente a Rota pode exigir o cumprimento da obrigação? Claro que não! Quem efetivamente pode exigir esse cumprimento é a AC Industrial, que é parte do contrato.

Incorreto!!!

D) AC Industrial S/A poderá reservar-se o direito de substituir Rota Transportes Ltda., independentemente de sua anuência ou de Mac Geral & Companhia.

Aqui pinta uma dúvida! A AC industrial efetivamente pode substituir a Rota Transporte independentemente da anuência da MAC ou da própria Rota?

Como nós não conhecemos o Direito, a dúvida surge. Pode ou não? Aqui nós não temos uma resposta.

Compete agora fazer uma ponderação: A alternativa C está errada, isso foi constatado logicamente. Já a alternativa nos deixa na dúvida, pois não sabemos como aplicar o Direito no caso. Qual delas devemos escolher?

Naturalmente, a que temos a convicção, pela lógica, de que está errada, no caso a C. E, pelo gabarito, efetivamente é a alternativa C a equivocada.

Vamos olhar outra questão, agora de ambiental:

2 Aqui vamos ter de apelar para um pouco de lógica jurídica. A resposta deriva diretamente da letra da lei, e em um primeiro momento a pergunta pode desanimar. Mas, mesmo assim, é possível achar a alternativa correta. Vamos lá! 1 - Técnicos do Ibama, autarquia federal meteu uma multa em uma empresa licenciada pelo Estado em que está localizada. A leitura com atenção já mostra por onde vai girar a controvérsia: a distribuição de competência entre a União e um Estado. Evocando um pouco do conhecimento jurídico, nós sabemos que a União, Estados e o DF têm competência concorrente. Vamos ter de escolher a alternativa correta. A) Há irregularidade no licenciamento ambiental, uma vez que em se tratando de atividade que cause degradação ambiental significativa, o mesmo deveria ser realizado pela União. Lendo esta alternativa não temos como saber se ela é correta ou não. Pode ser que haja uma norma específica quanto a isto. Apesar da ignorância, não faz muito sentido, em termos de lógica, que a natureza da degradação determine se o problema é de âmbito da União ou de um Estado. Essa fica de stand by. B) É ilegal a fiscalização realizada pelo IBAMA, que só pode exercer poder de polícia de atividades licenciadas pela União, em sendo a atividade regularmente licenciada pelo Estado. Aqui o enunciado diz que o licenciamento determina a competência. Será? A pergunta a ser feita à alternativa é: diante de um crime ambiental, a autoridade fiscalizadora só pode agir se for competente? Aqui a lógica mata esse item: oras, diante de um crime qualquer um pode agir, quando o agente estatal deve agir, independentemente da natureza do crime, incluindo aí o crime ambiental. Neste ponto, a lógica torna essa alternativa inválida. C) É possível a fiscalização do IBAMA o qual pode, inclusive, lavrar auto de infração, que, porém, não prevalecerá caso o órgão estadual de fiscalização também lavre auto de infração. Aqui o enunciado faz mais sentido. O IBAMA pode lavrar o auto mas, caso o órgão competente em âmbito estadual lavre um auto sobre o mesmo problema, este último prevalecerá. Alternativa possível, mas sem muita segurança. D) Cabe somente à União, no exercício da competência de fiscalização, adotar medidas para evitar danos ambientais iminentes, comunicando imediatamente ao órgão competente, em sendo a atividade licenciada pelo Estado. Esta alternativa é totalmente contrária ao conceito da competência concorrente. Seu erro é facilmente perceptível. E agora? Qual das alternativas, entre as duas em que ficamos com dúvida, fazem mais sentido em termos lógicos? A A ou a C? Eu escolheria a C, pois nela, comparando com a A, não há uma ruptura da lógica ou da lógica jurídica. A correta é essa, por óbvio. Vamos agora olhar uma de Constitucional: 3

Novamente aplicaremos um pouco de lógica jurídica para resolver essa questão:

1 -O Supremo publica uma súmula vinculante e um Estado edita lei no sentido contrário ao determinado pelo STF.

Bom...súmula vinculante faz o que mesmo? Vincula, certo? Partindo dessa óbvia constatação vamos às alternativas. Foco na correta:

A) O Supremo Tribunal Federal (STF) poderá, de ofício, declarar a inconstitucionalidade da norma estadual produzida em desconformidade com a Súmula.

De ofício? De cara essa questão está errada! Nós sabemos que o Judiciário não age, em regra, de ofício.

B) Qualquer cidadão poderá propor a revisão ou o cancelamento de súmula vinculante que, nesse caso, será declarada mediante a decisão de dois terços dos membros do Supremo Tribunal Federal (STF).

Qualquer cidadão? A competência para propositura de ações no âmbito do STF está na Constituição, e é restrita a um rol pequeno de legitimados. Imaginem se qualquer cidadão pudesse propor uma ação diretamente no STF? Nós sabemos que isso não ocorre.

Errada!

C) É cabível reclamação perante o Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar a validade da lei do Estado X que dispõe sobre os sistemas de consórcios e sorteios em seu território.

Hummmm....será? Será que a reclamação é o instrumento adequado neste caso? Como nós não sabemos Constitucional, vamos deixar essa em stand by.

D) A súmula possui efeitos vinculantes em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, mas não vincula o Poder Legislativo na sua atividade legiferante.

Sim, a Súmula vincula, mas volta e meia o poder legislativo dos mais diversos entes da federação editam normas inconstitucionais, quanto mais normas contrárias a uma súmula vinculante.

Vem logo a lembrança o Princípio da Separação dos Poderes, e legislar, criar lei, é a essência da atividade do legislativo. Pode uma Assembléia Legislativa editar norma contrária a um pronunciamento do STF? Óbvio! É para isso que o STF serve também.

E agora? Entre a C e a D, qual escolher? A C nós não temos certeza, já a D é mais coerente e não apresenta erro.

Ficamos com a D.

2

De vez em quando o uso da lógica torna a resolução de uma questão algo muito fácil. Essa aqui é um exemplo disto.

1 - O trabalhador tentou ajuizar duas vezes uma reclamação trabalhista. Na 1ª tentativa ele faltou e depois, na 2ª, ele desistiu.

O problema versa sobre a faculdade de ajuizar uma ação em caso de desistências anteriores. Na base da lógica, desta vez, temos o Direito de Ação.

Vamos olhar as alternativas:

A) terá de aguardar o prazo de seis meses, pois contra ele será aplicada a pena de perempção.

Aguardar seis meses? E a prescrição, entra como nessa história?

Alternativa muito improvável, pois a demora no ajuizamento da ação prejudica o recebimento das verbas trabalhistas.

B) poderá ajuizar a nova ação de imediato, contanto que pague o valor de uma multa que será arbitrada pelo juiz.

Multa? Será que existe multa? Não seria a multa um obstáculo ao exercício do Direito de Ação?

Opção esquisita.

C) não precisará aguardar nenhum prazo para ajuizar nova ação.

Ok, faz sentido, em conformidade com o livre exercício do direito de ação.

D) deverá aguardar seis meses para ajuizar ação contra aquele empregador, mas não para outros que porventura venha a ter.

Tão improvável quanto a alternativa  A.

A Letra C é a que faz mais sentido entre as 4.

Simples, não parece?

Mais ou menos...

Vamos agora deixar claro alguns pontos para não parecer que a coisa é simples. Não é simples!

Primeiro devemos ter em mente que apenas algumas questões esse tipo de busca é possível, e em todas as hipóteses serão somente naquelas em que o candidato teve dúvida sobre a alternativa correta. Ou seja: só após a resolução das questões que o candidato domina é que ele parte para o uso da lógica em conjunto com a lógica jurídica.

Depois, esse tipo de raciocínio demanda muito tempo.

Vejam: quando uma pessoa domina determinado conteúdo, a identificação da alternativa correta consome muito menos tempo e esforço, pois em termos das conexões cerebrais, o conteúdo está facilmente disponível (memória profunda) e não demanda esforço.

A construção de um raciocínio lógico como os apresentados acima demanda sim muito esforço, em especial na hora da prova, pois o candidato não sabe o conteúdo e tenta, valendo-se do raciocínio, achar o caminho correto.

Logo, essa metodologia é residual, quando não é mais possível achar a resposta por meio do uso do conhecimento específico para aquela determinada questão.

Há de se considerar também que, em troca do uso da lógica, só resta o chute. E o chute é sempre loteria. Se o uso da lógica não for mais possível, se a mente não aguenta mais o esforço, aí o chute está liberado. Melhor chutar a arriscar acertar do que deixar em branco.

Ao fim, nem todas as questões podem ser resolvidas desta forma. Talvez, no máximo uma 15 ou 20. A lógica pode ser buscada a qualquer momento mas o conhecimento específico de determinado assunto pode frustrar a tentativa. Estamos partindo do princípio de que o candidato não sabe nada da questão-alvo, e sob essa premissa que escrevi o texto. Se ele domina alguma coisa, a tentativa pode ganhar mais consistência.

Moral da história: antes o uso do raciocínio do que o do chute!

Mas isso só depois da 1ª etapa da prova ter sido concluída, ou seja, da resolução convencional das questões.