Segunda, 27 de outubro de 2014
Há algum tempo o site da BBC Brasil publicou uma entrevista com o Dr. Larry Rosen, professor da Universidade Estadual da Califórnia e pesquisador da chamada "psicologia da tecnologia".
Ele explicou como estamos perdendo a nossa capacidade de concentração por conta do uso das atuais tecnologias de comunicação. Inclusive sua próxima obra, em conjunto com um neurocientista, é sobre exatamente este tema: "The Distracted Mind."
Pior! O professor explica que não estamos propriamente "viciados" no uso de tablets e smartfones. O vício proporciona alguma forma de prazer como recompensa, mas o uso desses aparelhos e das redes não propociona isso. Nós estamos vivendo em uma espécie de permanente estado de ansiedade.
Confiram a entrevista:
BBC Brasil - Nossa capacidade de concentração está diminuindo?
Larry Rosen - Certamente está cada vez menor, e em diversos níveis. Pesquisas mostram que nossa concentração média é de 3 a 5 minutos antes que acabemos nos distraindo, no estudo ou no trabalho. A maioria dessas distrações são tecnológicas ? alertas de mensagem, e-mails etc.
Culturalmente, seguimos essa tendência. Até TV mudou. Em programas de TV dos anos 1980 e 1990, o tempo de cada cena era muito maior do que é nos programas atuais, que se adaptaram à nossa atenção mais curta. Revistas também fazem reportagens cada vez mais curtas.
BBC Brasil - Isso é um problema?
Rosen - Se ficamos trocando de tarefa, nunca passamos tempo o bastante para nos aprofundarmos em nenhuma, e tudo fica superficial. Três minutos certamente não bastam para estudar, por exemplo. O segundo problema é que, terminada a distração, não voltamos imediatamente à tarefa que interrompemos. Precisamos de um tempo para lembrar onde estávamos. No caso de um livro, temos de reler alguns parágrafos, realocar nosso cérebro.
Em uma pesquisa com estudantes universitários, tiramos seus telefones, os dividimos em três grupos - de uso leve, moderado e extremo - e medimos sua ansiedade.
Os usuários leves tiveram pouca alteração em seus níveis de ansiedade; os moderados rapidamente ficaram ansiosos, até que esses níveis caíram. Mas as pessoas que usavam muito seus smartphones ficavam mais e mais ansiosas. E neste último grupo estavam justamente as crianças e os jovens adultos. Temos de ensiná-los a evitar essa ansiedade.
BBC Brasil - Será um reflexo disso o fato de as pessoas lerem pouco ou não terminarem muitas leituras?
Rosen - Muitas pessoas já não conseguem mais ler integralmente, elas passam o olho. Percebo isso como professor: ao mandar um e-mail aos alunos, que respondem com dúvidas. Mas essas dúvidas estavam respondidas no e-mail original. Daí eles dizem, "desculpe, eu só li as primeiras linhas".
Tudo fica mais superficial, mas também mais estressante. Quanto mais trocamos de tarefas, mais damos para o nosso cérebro monitorar.
BBC Brasil - Alguns estudos mostram que isso afeta o desempenho de estudantes e profissionais. Há exagero?
Rosen - Em outra pesquisa, assisti a estudantes durante seus estudos. Pedíamos que eles estudassem matérias importantes, para ver como se concentravam. E vimos que eles só conseguiam manter sua atenção por uma média de 3 minutos.
O interessante é que os que conseguiam se concentrar mais tinham notas melhores na escola, e não apenas naquela matéria que estavam estudando. Ou seja, se concentrar melhora o desempenho, na escola, no trabalho e até nos relacionamentos pessoais.
BBC Brasil - Como recuperamos esse poder de concentração?
Rosen - É possível aprender técnicas simples para aumentar a capacidade de focar e não se distrair. Imaginemos, por exemplo, a hora do jantar de uma família comum. Hoje em dia, todos jantam tendo seus celulares consigo. A sugestão é, no início do jantar, que todos possam checar seus celulares por um ou dois minutos. Mas depois têm de silenciá-los e virar seu visor para baixo, para não ver as mensagens chegando.
Após 15 minutos marcados no relógio, todos recebem permissão para checar o telefone novamente, por um minuto. À medida que a família se acostuma com isso, aumenta-se gradualmente esse período de 15 para 20 e 30 minutos.
E assim cria-se tempo para conversas familiares ininterruptas por 30 minutos, seguido de um minuto para checar o celular. É uma forma de treinar o cérebro a não se distrair, e isso é essencial.
BBC Brasil - É uma reprogramação do cérebro?
Rosen - Você está reprogramando a parte química envolvida no estresse do seu cérebro. Porque o que começamos a ver é: se impedimos as pessoas de checarem seus celulares ou dispositivos tecnológicos, elas ficam ansiosas, (o que produz) alterações químicas.
BBC Brasil - É como um vício?
Rosen - O engraçado é que não é um vício ? se fosse, teríamos sensação de prazer ao checar nosso celular.
E a maioria não está obtendo prazer, apenas tentando reduzir a ansiedade e a sensação de não saber se está perdendo algo (na internet ou nas redes sociais).
BBC Brasil - O que podem fazer os professores que querem recuperar a atenção de seus alunos?
Rosen - Em geral, eles terão de usar a própria tecnologia, seja permitindo que os alunos usem seus próprios dispositivos ou trazendo dispositivos à aula.
Por exemplo, com vídeos curtos, que costumam atrair os estudantes. Aqui nos EUA, algumas escolas particulares também têm usado mais tecnologias, como iPads e Apple TV, na sala de aula. Isso certamente torna a educação mais atraente.
Em escolas que proíbem os aparelhos móveis, os estudantes os levam escondidos e ficam trocando mensagens debaixo da carteira. É melhor, então, que os professores os deixem checar em determinados momentos ? por exemplo, a cada meia hora por um ou dois minutos.
Se você veta o uso da tecnologia, os estudantes vão ficar o tempo todo pensando no que estão deixando de ver (no celular), nos comentários que a sua foto no Instagram estará recebendo. E, assim, não vão prestar atenção na aula de qualquer maneira.
BBC Brasil - Você vê alguma vantagem no fato de estarmos fazendo diversas tarefas ao mesmo tempo?
Rosen - Em geral, não ? a tentativa de fazer muita coisa junta impacta seus relacionamentos. Se você tenta falar com seu marido ou mulher à noite e cada um está vidrado em seu celular, que conversa vai ter?
Se você está com seus amigos num restaurante, mas fica no celular, que interação fará com eles? E fico pensando como será quando as pessoas começarem a usar o Google Glass - você vai achar que (seu amigo) está olhando para você, mas ele estará, na verdade, olhando para o que estiver aparecendo nos óculos.
BBC Brasil - Mas tem gente que pode ter uma performance melhor nesse novo ambiente de estímulo constante?
Rosen - Pesquisas mostram que uma parcela bem pequena das pessoas é capaz de funcionar bem nesse tipo de ambiente. Não vi pesquisas de longo prazo a respeito disso, mas imagino que isso seja algo estressante. E no longo prazo isso não é bom para o corpo.
BBC Brasil - As pessoas conseguem definir regras para si mesmas, limitando o próprio uso da tecnologia?
Rosen - Eu costumava enlouquecer com meu feed no Twitter, até decidir checá-lo uma vez só por dia. Uma das regras que recomendo é: tire seu celular ou notebook do quarto uma hora antes de ir dormir e não se permita checá-los até o dia seguinte.
Hoje, nossos estudos mostram que a maioria dos adolescentes e jovens adultos dorme ao lado dos seus telefones e acorda no meio da noite para checá-los. Isso é péssimo para o seu cérebro, que precisa de blocos longos e consistentes de sono. E também prejudica o aprendizado.
Acho que isso ainda vai piorar, até que as pessoas percebam o efeito negativo sobre sua saúde. E daí começarão a pensar: será que eu realmente preciso checar meu feed de Twitter 20 vezes por dia? Será que realmente preciso estar em sete redes sociais diferentes?
Mas no momento estamos tão empolgados com a tecnologia que somos como crianças em uma loja de doces: queremos experimentar tudo.
Fonte: BBC Brasil
Essa entrevista é terrível, pois revela traços que nem imaginávamos da influência de se permanecer plugado o tempo todo.
Não se trata de vício, e sim de ansiedade.
E todo esse impacto em nossas vidas, em especial de quem estuda, é potencialmene danoso.
Acho interessante colar aqui um texto bem interessante do professor Rogério Neiva sobre a questão da concentração nos estudos:
Como combater a falta de concentração nos estudos
Muitas estratégias terapêuticas são baseadas na compreensão dos fenômenos psicologicamente vivenciados, tendo na tomada de consciência um caminho importante para a neutralização das situações emocionalmente fortes que se busca combater. Napsicologia do comportamento adota-se a lógica da identificação do estímulo positivo ou negativo (S+/-), bem como da reação (R+/-) conseqüente, principalmente para tentar promover a desconstrução da negatividade de estímulos negativos (S-), causadores de reações negativas (R-). A psicanálise, também valorizando a tomada de consciência e compreensão da realidade, atribui um papel muito importante à compreensão das informações inconscientes.
Na aprendizagem, principalmente voltada à preparação para concursos públicos e exames, a compreensão e a tomada de consciência do processo de apropriação intelectual do conhecimento estudado não é menos importante. E esta lógica vale inclusive para atacar a falta de concentração nos estudos.
Assim, diante de situações de dificuldades de concentração, o primeiro passo consiste em entender e não ignorar o que ocorre quando somos atingidos por uma ?rajada?, ?ataque? ou ?onda? de desconcentração ao longo de um turno de estudos, ou mesmo quando isto nos impede de começar a estudar. Ou seja, me refiro às situações nas quais temos uma enorme dificuldade para nos concentrar, tendo aquela desconfortável situação de que ficamos empacados e não avançamos. Você costuma passar por isto?
Diante deste cenário, duas atitudes são fundamentais:
(1) entender a dinâmica do processo em andamento, isto é, o que está acontecendo;
(2) entender os fatores ou causas determinantes para a situação em andamento.
Quanto à dinâmica do processo, se estamos tendo dificuldades para nos concentrar nos estudos, é porque há um estímulo que está tendo mais relevância do que aquele que gostaríamos que tivesse, sendo que o estímulo preferido corresponde à informação ou objeto de conhecimento a ser estudado. Daí é importante entender que a concentração consiste numa função cognitiva primária, que corresponde a uma lógica de seletividade de estímulos.
Portanto, concentrar-se significa valorizar alguns estímulos em detrimento de outros. Se quero me concentrar nos estudos, preciso desconsiderar todos os outros estímulos ambientais, tidos por exógenos, como sons e características do local onde estamos, e não ambientais, considerados endógenos, estes envolvendo fatos e lembranças que podem vir à nossa mente naquele momento de estudos.
Se não nos concentramos é porque algo ?rouba? a nossa atenção, algo este que não é aquele estímulo que gostaríamos que prendesse a nossa atenção. Este é o processo em andamento, acerca do qual precisamos tomar consciência e compreender.
Superada a compreensão da dinâmica do processo, é preciso entender o que o determina. Ou seja, se estamos passando por uma situação de dificuldade de concentração, o que está por trás disto? Temos duas possibilidades, as quais podem estar ocorrendo de forma concomitante ou não:
(1) o ?estímulo-ladrão?, que está tomando a nossa atenção, tem relevância significativa, maior do que o estímulo principal-preferencial que pretendemos valorizar, correspondente ao conhecimento a ser estudado;
(2) mesmo que o ?estímulo-ladão? não tenha tanta relevância, não estamos atribuindo a relevância devida ao estímulo-principal-preferencial, ante a nossa falta de interesse.
Costumo dizer que para um fanático por seu time de futebol, numa final de campeonato na qual o time está em campo, sendo a partida o estímulo principal, jamais ocorrerá a segunda hipótese mencionada. Digo isto para provar que o interesse é determinante a atribuição de relevância ao estímulo.
Mas muito bem, agora você já sabe o que acontece quando está tentando estudar e não consegue se concentrar. Porém, esta tomada de consciência, por si só, resolve o problema, nos fazendo ficar concentrados? Obviamente que não! Até porque o diagnóstico não se confunde com o prognóstico. Então daí você pode se perguntar: mas o que fazer? Afinal, qual é o prognóstico?
Seguramente, tendo a devida compreensão, você já pode encontrar estratégias que lhe ajude. Inclusive se tiver alguma sugestão deixe em forma de comentário no final do texto. Masvou pontuar algumas iniciativas que podem ajudar, identificadas a partir da minha vivencia empírica nos estudos, principalmente como candidato a concursos público, bem como por meio da pesquisa psicopedagógica-cognitiva:
1 ? no caso da falta de interesse no estímulo principal, ou seja, na matéria a ser estudada, tente identificar o que há de útil neste conhecimento. Seguramente, existe alguma utilidade que vai além do edital. Pense no que pode ganhar ao saber daquela informação. Ainda neste sentido, procure trabalhar o prazer em aprender (clique aqui para ver o texto Preparação para Concursos e o Prazer em Aprender);
2 ? seja minimamente flexível! Isto é, se está muito difícil se concentrar naquela matéria a ser estudada por determinada fonte, passe para outra matéria ou fonte, faça alguns exercícios, faça um resumo, esquema ou mapa mental da matéria estudada anteriormente, ou seja, faça uma revisão do que já estudou, inclusive enquanto estratégia para retomar o ritmo;
3 ? compreenda de forma fragmentada o que irá estudar, do tipo ?agora minha meta é estudar e entender este parágrafo?, ou ?esta página, este item, este capítulo, este tema??.Encare um, para depois passar ao outro. Avance por partes, esqueça o todo e estude o que tiver que estudar de forma fragmentada. E não deixe de ler o texto a Fragmentação do Plano de Estudos (clique aqui para ler o texto Repercussões Emocionais da Fragmentação do Plano de Estudos);
4 ? tenha força de vontade! Esta colocação pode parecer autoajuda enlatada e superficial para concursos, mas a questão é como fazer para ter força de vontade? Neste sentido, é preciso que entenda que você conta com estruturas bio-cognitivas capazes de selecionar estímulos de forma voluntária, ou seja, estou dizendo para acreditar que é capaz não por uma questão de fé, mas pelo fato de que, neuro-bio-fisiologicamente, você tem um equipamento cognitivo que lhe permite isto. Repito: você tem um cérebro e estruturas cognitivas que lhe permite selecionar e descartar estímulos relevantes. Você pode! Isto é uma afirmação racional e científica! Portanto, lute! Lute com o que você tem! Lembre-se que na partida da final do campeonato, na qual seu time está jogando, você consegue selecionar o estímulo principal. Portanto, também pode fazer isto ao estudar!
5 ? trabalhe com a respiração; pare por alguns minutos, não mais do que 5, feche os olhos e respire de forma profunda e pausada, da maneira mais profunda e pausada que puder;
Além destas sugestões, compreendendo e tendo consciência do processo relacionado à falta de concentração, tente identificar outras estratégias adequadas ao seu perfil. E reitero o pedido para deixar as sugestões em forma de comentário!
Alerto ainda que, para as pessoas diagnosticadas como portadoras de TDAH ou DDA, existem outros caminhos a serem adotados, inclusive com intervenção medicamentosa. Mas é preciso buscar a atuação de profissionais autorizados, tanto para o diagnóstico, quanto para o prognóstico, intervenção e principalmente o uso da medicação. E se não tem as referidas patologias, não se iluda com o uso da ritalina (clique aqui para ler texto sobre a Ilusão da Ritalina).
Por fim, bom combate às rajadas de desconcentração e bom estudo!