Comissão do MEC avaliará o ensino jurídico e o papel do Exame de Ordem no próximo dia 29

Quarta, 23 de outubro de 2013

Faculdade_de_Direito_da_USP

No próximo dia 29 de outubro, das 14h às 18h, a Comissão de Reforma do Marco Regulatório do Ensino Jurídico no Brasil, instituída pelo Ministério da Educação, fará uma reunião extraordinária na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Criada a partir de uma iniciativa conjunta do Ministério da Educação e da Ordem dos Advogados do Brasil, a comissão tem o objetivo de identificar os principais problemas na formação dos bacharéis em Direito, o excesso de oferta de vagas, a qualidade dos cursos, além de propor mudanças na regulação sobre o ensino jurídico.

O grupo foi instituído há cinco meses e seus membros têm se reunido uma vez por mês em Brasília. O trabalho está dividido em duas frentes: revisão das diretrizes curriculares nacionais (currículo mínimo, disciplinas obrigatórias, atividades complementares, prática jurídica) e elaboração de novos instrumentos e requisitos para credenciamento, avaliação e fiscalização de novos cursos e de cursos em funcionamento.

Segundo integrantes da comissão, o objetivo da reunião extraordinária é ampliar o acesso de docentes e de especialistas ao processo de elaboração das propostas de reforma. A reunião não terá o formato de uma audiência pública. A Comissão ouvirá alguns especialistas sobre temas específicos, como o papel da prática jurídica, as matrizes curriculares, as competências e habilidades de um profissional de Direito e a experiência nacional e estrangeira no ensino jurídico. O encontro será aberto ao público, que será ouvinte.

Pontos em discussão

"Essa é a primeira reunião fora de Brasília, numa instituição de ensino para ouvir a comunidade", diz o professor de direito civil da USP Otavio Luiz Rodrigues. "Estamos formando consensos, discutindo a eventual mudança da matriz curricular e o que queremos de um bacharel".

Outro ponto em discussão é sobre quem deveria ser responsável pela formação profissional dos bacharéis: se as universidades ou instituições como OAB e escolas de magistratura e do Ministério Público. Quanto à necessidade de trabalho de conclusão de curso, a comissão já chegou a um consenso: o instrumento de avaliação deve continuar.

Para o procurador de Justiça do Rio Grande do Sul Lenio Streck, o ensino jurídico passa por uma crise, o que impõe a necessidade de entender o Direito como um fenômeno complexo. "O ensino jurídico tem simplificado os conceitos básicos da teoria do Direito e da própria dogmática jurídica. A literatura básica utilizada nos cursos de Direito é de baixa densidade teórica. Enquanto continuarmos a "ensinar" com livros simplificadores ou facilitadores, estaremos no mau caminho", afirma Streck.

Professor titular da Unisinos, ele defende mudanças na grade curricular mínima e alterações no Exame de Ordem e nos concursos públicos. "Não podemos entrar em um discurso tautológico ou em uma espécie de "Dilema Tostines" (tostines vende mais porque é fresquinho ou é fresquinho porque vende mais?). Ou seja, a prova de ordem é feita do modo estandardizado para atender as faculdades e os cursinhos ou os cursinhos de preparação e as faculdades ensinam desse modo para atender a demanda do exame de ordem? Quebrar esse circulo parece ser o primeiro passo".

Presidente da Comissão de Graduação da USP, o professor Heleno Torres também considera necessário mudar a grade de ensino. Em sua avaliação, as faculdades devem dar mais espaço para disciplinas optativas, além de ter uma matriz curricular mais próxima uma das outras.

?O ensino do Direito brasileiro merece uma reflexão porque a legislação federal em vigor já não atende aos critérios de atualização do Direito e do modelo de formação de juristas no Brasil. Estamos formando bacharéis para o século passado, mas não para as demandas do século XXI?, diz.

Segundo o professor, a heterogeneidade curricular dificulta a migração de estudantes e a internacionalização do curso. ?O interesse de estudantes estrangeiros pelas faculdades brasileiras é muito baixo, justamente porque a matriz curricular é muito complicada?, afirma. De acordo com Heleno Torres, já há na USP um trabalho de revisão da grade. ?Procuramos na USP reduzir a densidade das disciplinas obrigatórias para que as optativas, que são mais flexíveis e de fácil atualização, tenham mais espaço no currículo?.

Para o professor Alexandre Veronese, da Universidade de Brasília, os sistemas de avaliação estão muito focados na atribuição de notas, e são pouco úteis para a coleta de dados. "O grande dilema é preparar para a prática. Os sistemas de avaliação vigentes informam poucos dados sobre os núcleos de prática jurídica dos cursos. Para regular melhor, em prol de todos, o MEC precisa saber mais", diz.

A comissão tem entre seus membros os professores Otavio Rodrigues e Heleno Torres, ambos da USP, Alexandre Veronese (representante da Abedi ? Associação Brasileira de Ensino do Direito), Loussia Felix (UnB), Gregório Assagra e Igor Lima de Oliveira (representantes do Ministério da Justiça) e Ademar Pereira (representante da OAB). A presidência da Comissão é de Adalberto do Rego Maciel Neto, do Ministério da Educação.

Já confirmaram presença no evento o diretor da Faculdade de Direito da USP Antonio Magalhães Gomes Filho, o presidente da Comissão de Graduação da Faculdade de Direito da USP Heleno Taveira Torres, o presidente do Iasp José Horácio Halfeld, o coordenador da área de Direito da Capes Martonio Mont"Alverne, os professores Lenio Streck (Unisinos), Ingo Sarlet (PUC-RS), Valdmir Silveira (presidente do Conpedi) e o juiz de Direito do TJ-SP Carlos Vieira von Adamek, atualmente em auxílio no Supremo Tribunal Federal.

Fonte: Conjur

Uma verdade: o ensino jurídico, muito em breve, irá passar por uma grande reforma. Tanto o MEC como a OAB estão discutindo as mudanças a serem implementadas e em 2014 essa reforma deverá ser implementada.

Aliás, hoje aqui em Brasília teremos uma audiência pública da OAB sobre o tema. Confiram a pauta de debates:

1. Diretrizes Curriculares, propostas de aprimoramento, possível inclusão de novas matérias;

2. Avaliação e instrumento de avaliação do curso de Direito. Necessidade de instrumentos diversificados ou manutenção de um único para o processo regulatório dos cursos jurídicos. Necessidade de novos parâmetros a serem considerados na avaliação (Exame de Ordem, etc.);

3. Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE): resultados dos últimos exames; contribuição que o exame trouxe ao ensino jurídico; redução do intervalo entre as aplicações do exame; o exame como parâmetro de qualidade do ensino;

4. Vaga para a OAB no Conselho Nacional de Educação,que  representa aproximadamente 800 mil advogados e participa do processo regulatório dos cursos jurídicos, com seus pareceres;

5. Propostas para aprimoramento do Núcleo de Prática Jurídica e do estágio curricular;

6. Estímulo ao aprimoramento docente nas Instituições de Ensino Superior  públicas e privadas;

7. Concepção pedagógica dos cursos jurídicos;

8. Aprimoramento do E-MEC (sistema que tramitam processos)

E aqui um ponto interessante, retirado da abordagem o jurista Lenio Streck. O Dr. Lenio reiteradamente critica a falta de profundidade jurídica da doutrina acadêmica atual. Sob sua ótica, e tal como retratado na notícia acima, "a literatura básica utilizada nos cursos de Direito é de baixa densidade teórica. Enquanto continuarmos a "ensinar" com livros simplificadores ou facilitadores, estaremos no mau caminho."

Tenho a impressão, e muito possivelmente estou certo, que as mudanças propostas neste ponto para o Exame de Ordem ( a quebra do "Dilema Tostines") está na mudança da densidade das perguntas feitas no Exame de Ordem.

Essa seria uma mudança séria no Exame, caso venha a ser implementada.

Claro! Tudo depende da anuência da OAB, mas como a Ordem está em parceria com o MEC, tal alteração pode perfeitamente acontecer, e isso sem a necessidade de alterar o edital ou o provimento.

Do que, exatamente, eu estou falando?

Se há o interesse em alterar a estrutura curricular do ensino jurídico, o Exame de Ordem vai ter de acompanhar essa mudança, ou seja, a prova possivelmente vai deixar de ser dogmática e terá uma outra formatação, que leve em conta uma estrutura ainda a ser definida. Talvez enseje em uma abordagem mais nas disciplinas propedêuticas do Direito indo até a adoção de um método interdisciplinar de abordagem do conteúdo programático do Exame.

No fundo, creio, há a pretensão de se combater a chamada "walmartização" do ensino jurídico. Aqui reproduzo trecho de um interessante texto, da autoria de Rafael Tomaz de Oliveira e André Karam Trindade, publicado na coluna "Diário de Classe", no site Conjur. Esse trecho resume como o ensino jurídico é visto hoje por muitos:

Todavia, nos últimos anos, é cada vez mais comum observar o fortalecimento de uma política de administração dos cursos de direito que podemos denominar ?lógica Walmart?. Isto nos remete àquilo que Ernildo Stein chama de empresamento da universidade. De pronto, um alerta: ninguém irá negar que, atualmente, uma universidade deve sobreviver enquanto empresa. Em muitos casos, a situação de ajustes financeiros se torna de tal modo dramática que as receitas geradas pelas mensalidades representam o fio de sobrevivência dessas mesmas universidades (situação que atinge, inclusive, grandes centros de pesquisa). O ?x? da questão, portanto, não é se ? literalmente ? a universidade se organiza como uma empresa. O problema é de ordem simbólica: aparece quando desse caráter estrutural, inevitável, se desdobra uma ?lógica da empresa? que subjuga o próprio ?espírito universitário?. Ou seja: não é a formação do ser humano ? objeto primevo da universidade ? aquilo que importa, mas, sim, as possibilidades lucrativas que podemos obter com esse ?negócio?. E são exatamente as disciplinas de formação humanística que representam o élan daquilo que se chama universidade. Logo, as grandes vítimas dessa radicalização do empresamento são as conhecidas humanidades (o mesmo E. Stein nos lembra uma frase de T. Hölscher e M. Ursinus: ?Quem hoje poupa milhões nas ciências humanas, irá pagar amanhã bilhões para o saneamento da sociedade?).

A corrupção do papel das universidades e a implantação desse puro empresamento é que o nos remete ao walmartismo jurídico: os cursos são administrados na perspectiva de aumento dos lucros com redução dos custos, sempre garantida a total satisfação do freguês. O ?serviço?, neste caso, pode até ? mas não necessariamente é ? ser prestado com menor custo para o consumidor, mas os lucros estão garantidos pelo menor custo que o curso terá. É preciso que esteja garantida a ?administrabilidade? do empreendimento. Dentre os mais diversos estratagemas do walmartismo, surge a conhecida e deletéria prática de alocação de docentes nas mais variadas disciplinas, sem que haja entre eles qualquer relação de afinidade pela via da pesquisa. Note-se: um docente = duas ou mais disciplinas (no mais das vezes, em áreas completamente diferentes!). Evidentemente, esse é um ótimo negócio: são contratados menos professores, porém é mantido o mesmo número de disciplinas. Assim, um docente cuja formação em sede de mestrado e doutorado (quando a titulação existe, é claro) ? bem como a sua produção acadêmica (projetos de pesquisa, publicações, apresentações de trabalho, etc.) ? está vinculada área do direito privado, com ênfase em direito civil, acaba lecionando direito constitucional (ou vice-versa). Não é necessário muito esforço para perceber que este tipo de postura não poderá produzir bons resultados (ao menos sob a perspectiva acadêmica...). E mais: quais são, em maior grau, as disciplinas que alocam docentes de outras áreas? Exatamente: as propedêuticas! Não raro, a figura do ?quebra-galho? ? e aqui estamos pensando naqueles cursos que são oferecidos fora dos grandes centros, onde o recurso humano é escasso ? sempre aparece para completar o quadro docente e lecionar disciplinas como Introdução ao Estudo do Direito, Filosofia do Direito, Sociologia Jurídica, Teoria Geral do Estado, História do Direito, etc.

Fonte: Conjur

Eis o ponto! Pelo visto, há uma vontade, e agora também, uma brecha para que isso ocorra, de resgatar a qualidade do ensino jurídico do Brasil, e as propostas a serem encaminhadas ao MEC aparentemente convergem nesse sentido.

Eis o ponto: não só querem reformar o ensino jurídico, como também, dentro deste processo, pretendem alterar o que hoje é o Exame de Ordem.

Não tenho ainda elementos para saber quais são as propostas, mas vou dar uma averiguada e tentar descobrir.