Candidata ajuíza ação na quarta e consegue liminar na sexta para fazer a prova da OAB de domingo

Sábado, 20 de outubro de 2012

O futebol tem uma expressão para quando um time consegue fazer um gol no finalzinho do jogo, após os 90 minutos regulamentares: "um gol feito na bacia das almas!"

Pois uma candidata do estado do Rio de Janeiro conseguiu, na bacia das almas, seu direito de fazer a prova de amanhã. Ele ajuizou uma ação ordinária com pedido de antecipação de tutela e teve seu pedido deferido.

Tratou-se de uma decisão extrema e bem rara. Poucas liminares são deferidas, mas ainda assim, há esperança para quem se sente injustiçado com a não anulação de questões na prova objetiva.

Curiosamente, a questão anulada foi a mesma de um outro candidato, que o site Conjur informou recentemente - a do usucapião - Justiça Federal dá liminar para candidato fazer a prova da 2ª fase do VIII Exame de Ordem

Confiram a íntegra da decisão:

0002919-11.2012.4.02.5153 Número antigo: 2012.51.53.002919-4 1005 - ORDINÁRIA/OUTRAS Autuado em 18/10/2012 - Consulta Realizada em 20/10/2012 às 08:12 AUTOR : VANESSA DE SOUZA PESSANHA ADVOGADO: LUIZ FELIPE SARDENBERG CARDOSO DA SILVA REU : ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SECAO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 01ª Vara Federal de Campos Juiz - Decisão: ELDER FERNANDES LUCIANO Redistribuição Livre em 19/10/2012 para 01ª Vara Federal de Campos Objetos: CONCURSO PUBLICO -------------------------------------------------------------------------------- Concluso ao Juiz(a) ELDER FERNANDES LUCIANO em 19/10/2012 para Decisão SEM LIMINAR por JRJEEY --------------------------------------------------------------------------------

Processo n.º: 0002919-11.2012.4.02.5153 (2012.51.53.002919-4) (ORDINÁRIA/OUTRAS) CONCLUSÃO: 19/10/2012 15:26 - WESLEY WIGANDE MONTEIRO

DECISÃO

Vanessa de Souza Pessanha ajuizou ação ordinária em face da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Estado do Rio de Janeiro, objetivando a concessão de tutela antecipada, para que, mediante reconhecimento da nulidade das questões 40 e 75 do VIII Exame de Ordem Unificado promovido pela ré, fosse determinada a inclusão do nome da autora no rol dos inscritos para a segunda fase do certame, a ser realizada no dia 21 de outubro do corrente ano.

Em sua causa de pedir, aduziu a autora, em suma, ter obtido 39 (trinta e nove) pontos na primeira etapa do Exame, relembrando serem necessários 40 (quarenta) para a admissão à segunda fase. Ocorre que, dentre as 80 (oitenta) respostas indicadas como corretas pela ré, ao menos duas estariam em manifesto descompasso com o ordenamento jurídico pátrio, com as lições doutrinárias preponderantes e com o entendimento cristalizado do Tribunal Superior do Trabalho. Em anexo, juntou documentos nas folhas 12-22.

Foi requerida a concessão de gratuidade de justiça.

Proferida decisão na folha 24, declarando a incompetência do Juizado Especial Federal desta Subseção.

É o relato do necessário. Passo a decidir.

Da competência.

Não me comprometo, no momento, com a tese ventilada na decisão proferida na folha 24. É necessário fazer maior reflexão sobre o tema que o exíguo tempo não permite.

Em verdade, subsistem dúvidas quanto à hipótese dos autos versar, ou não, acerca da anulação de ato administrativo, em razão da natureza jurídica da OAB. Embora, tecnicamente, fosse mais adequado o julgador transpassar as questões processuais, vê-se que, até deliberação do Tribunal Regional Federal da 2ª Região sobre o assunto, fulminaria a pretensão da autora, e sobrepor a forma ao conteúdo malferira o direito de quem pleiteia. Sendo assim, impõe-se a imediata aferição do pleito vestibular, tendo em vista a circunstância de ter sido declarada a incompetência absoluta do 1º Juizado Especial Federal desta Subseção, e que eventual suscitação de conflito ocasionaria o perecimento do direito da autora, porquanto designado para o próximo domingo (21/10/2012) a realização da segunda etapa do certame.

Como a competência entre Vara Comum Federal e Juizado Especial Federal é de natureza absoluta, a questão poderá ser apreciada posteriormente sem qualquer prejuízo

Do pedido liminar.

Como cediço, a análise judicial de questões de provas somente se comporta em hipóteses excepcionais, para assegurar a observância dos princípios da legalidade e da vinculação ao edital (STF-MS nº 30894, 2ª T., DJe 21/9/2012, rel. Min. Ricardo Lewandowski), bem como quando se cogitar da existência de erro grosseiro (STF-MS nº 30859, 1ª T., j. 28/8/2012, in Informativo nº 677, rel. Min. Luiz Fux).

Na espécie, aduziu-se a nulidade da questão de número 40, que tem o seguinte teor:

Questão 40

Em janeiro de 2010, Nádia, unida estavelmente com Rômulo, após dez anos de convivência e sem que houvesse entre eles contrato escrito que disciplinasse as relações entre companheiros, abandona definitivamente o lar. Nos dois anos seguintes, Rômulo, que não é proprietário de outro imóvel urbano ou rural, continuou, ininterruptamente, sem oposição de quem quer que fosse, na posse direta e exclusiva do imóvel urbano com 200 metros quadrados, cuja propriedade dividia com Nádia e que servia de moradia do casal. Em março de 2012, Rômulo - que nunca havia ajuizado ação de usucapião, de qualquer espécie, contra quem quer que fosse - ingressou com ação de usucapião, pretendendo o reconhecimento judicial para adquirir integralmente o domínio do referido imóvel.

Diante dessa situação hipotética, assinale a afirmativa correta.

A) A pretensão de aquisição do domínio integral do imóvel por Rômulo é infundada, pois o prazo assinalado pelo Código Civil é de 10 (dez) anos. B) A pretensão de aquisição do domínio integral do imóvel por Rômulo é infundada, pois a hipótese de abandono de lar, embora possa caracterizar a impossibilidade de comunhão de vida, não autoriza a propositura de ação de usucapião. C) A pretensão de aquisição do domínio integral do imóvel por Rômulo é infundada, pois tal direito só existe para as situações em que as pessoas foram casadas sob o regime da comunhão universal de bens. D) A pretensão de aquisição do domínio integral do imóvel por Rômulo preenche todos os requisitos previstos no Código Civil.

Segundo a autora, o gabarito trazia como certa a alternativa D, tendo em vista a redação do artigo 1.240-A do Código Civil, que dispõe:

Art. 1.240-A. Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1o O direito previsto no caput não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez. § 2º (VETADO)

Ocorre que, como bem sustentou a autora, referida hipótese de aquisição da propriedade por usucapião somente foi inaugurada com a Lei nº 11.424/11, devendo o prazo de 2 (dois) anos ser contado da vigência deste Diploma Legal, consoante menciona a orientação firmada no seguinte enunciado da V Jornada de Direito Civil:

Enunciado nº 498 - A fluência do prazo de 2 (dois) anos previsto pelo art. 1.240-A para a nova modalidade de usucapião nele contemplada tem início com a entrada em vigor da Lei n. 12.424/2011.

No mesmo sentido tem se orientado os Tribunais Superiores, para os quais a posse anterior à instituição de novos e reduzidos prazos de usucapião não pode ser computada, como, ademais, já teve oportunidade de assentar o Supremo Tribunal Federal, no que concerne à usucapião especial do artigo 183 da Constituição da República:

Usucapião especial (CF, art. 183): firmou-se a jurisprudência do Supremo Tribunal, a partir do julgamento do RE 145.004 (Gallotti, DJ 13.2.97), no sentido de que o tempo de posse anterior a 5.10.88 não se inclui na contagem do prazo quinquenal estabelecido pelo art. 183 CF (v.g. RE 206.659, Galvão, DJ 6.2.98; RE 191.603, Marco Aurélio, DJ 28.8.98; RE 187.913, Néri, DJ 22.5.98; RE 214.851, Moreira Alves, DJ 8.5.98).

Dessa forma, considerando que o prazo de 2 (dois) anos para a aquisição da propriedade pela nova modalidade de usucapião somente pode ser contado a partir da vigência da Lei nº 12.424/11, ou seja, 17/6/2011, tem-se que o autor hipotético da ação de usucapião (Rômulo), somente implementaria o requisito temporal no ano de 2013, estando, dessa forma, incorreta a alternativa D da questão em comento.

Cuidando-se de hipotético erro grosseiro, resta viabilizado o reparo pela via jurisdicional, impondo-se a concessão da tutela antecipada, a fim de permitir que a autora realize a segunda etapa do certame, eis que a anulação da questão nº 40, fará com que a autora obtenha a pontuação mínima para prosseguir no Exame.

Vale lembrar que a análise do pedido é baseado na verossimilhança das alegações, e, em sede liminar, não exsurge tese que controverta o posicionamento externado pelo Supremo Tribunal Federal. De outro norte, deve prevalecer o posicionamento da banca examinadora na hipótese de questão de concurso ser controvertida.

Insurgiu-se a autora, ainda, contra o gabarito da questão nº 75, que dispunha:

Questão 75

A respeito da estabilidade, assinale a afirmativa correta.

A) a estabilidade da gestante dura de 28 dias antes até 92 dias após o parto. B) A estabilidade do membro da CIPA dura da eleição até 1 ano após o término do mandato, servindo para os representantes dos empregados, inclusive suplentes. C) a estabilidade do dirigente sindical dura do registro da candidatura até 1 ano após o término do mandato, servindo para os representantes dos empregados eleitos e seus suplentes, estando limitada ao número de 7 dirigentes sindicais. D) De acordo com o entendimento uniformizado do Tribunal Superior do Trabalho, o empregado poderá adquirir a estabilidade no curso do aviso prévio, pois este integra o contrato de trabalho para todos os efeitos, inclusive pecuniários.

Disse a autora estar passível de controvérsias a questão, uma vez que alternativa C (indicada como correta pelo gabarito), refletiria o texto antigo da Súmula nº 369 do TST, faltando a referência ao igual número de suplentes, que consta da atual redação do verbete em comento.

Dispõe a Súmula nº 369 do TST:

SÚMULA Nº 369 / TST - O art. 522 da CLT foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988. Fica limitada, assim, a estabilidade a que alude o art. 543, § 3º, da CLT a sete dirigentes sindicais e igual número de suplentes.

Conquanto a ausência da referência ao número de suplentes torne a alternativa C incompleta, não se divisa a existência de erro grosseiro. Pelo contrário, mais se identificaria a existência de controvérsias, o que não autoriza a retificação do gabarito da questão pelo Poder Judiciário, consoante os parâmetros alhures mencionados.

Nessa análise contextual, vislumbra-se que a autora havia obtido 38 pontos* no exame, necessitando de mais um ponto para avançar à próxima etapa. Compactuando com a tese apresentada em relação à questão nº 40, ao menos na seara liminar, é plausível franqueá-la a realização da próxima prova.

ANTE O EXPOSTO, defiro o pedido de antecipação dos efeitos da tutela para determinar que a ré permita a participação da autora na segunda etapa do VIII Exame de Ordem Unificado, a ser realizado no dia 21/10/2012.

Defiro o benefício de gratuidade de justiça.

Intime-se com urgência a OAB, Seção Estado do Rio de Janeiro.

Cite-se.

Campos dos Goytacazes/RJ, 19 de outubro de 2012

ELDER FERNANDES LUCIANO Juiz Federal

(ASSINADO ELETRONICAMENTE NOS TERMOS DA LEI 11.419/2006) -------------------------------------------------------------------------------- Registro do Sistema em 19/10/2012 por JRJAUQ. Movimentação Cartorária tipo Aguardando publicação de Decisão no D.O. Realizada em 19/10/2012 por JRJAUQ

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* Os 38 pontos, constantes na decisão, estão errados. Ela tirou 39 pontos. Tratou-se de um erro material na hora de se redigir a liminar.