Aluna é ameaçada de eliminação no exame da OAB por usar véu

Quarta, 18 de março de 2015

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No último domingo (15), milhares de formandos e bacharéis em Direito se submeteram ao XVI Exame de Ordem Unificado da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) em todo o país. Uma delas foi Charlyane Souza, 29, que está no 9º período de direito e se preparou para a prova com o objetivo de obter o sonhado registro na Ordem e se tornar advogada após se formar.

Mas, ao contrário das outras estudantes que prestaram a prova no mesmo local, Charlyane usava um hijab, tradicional vestimenta muçulmana, e foi ameaçada de eliminação no exame, caso não o tirasse. "Li todo o edital da prova e não havia nada que falasse sobre o lenço, mas fui preparada para ser revistada", diz.

Quando chegou ao local da prova, que é organizada pela FGV (Fundação Getúlio Vargas), ela foi revistada. Constataram que ela não portava nenhum objeto embaixo do hijab e a orientaram a ir para a sala. "Quando se passou cerca de uma hora do início da prova, uma representante da FGV me convidou para acompanhá-la. Parei a prova e fui", conta.

A coordenadora perguntou a Charlyane se ela era brasileira e disse que, de acordo com o edital, a estudante não poderia realizar a prova portando objetos de chapelaria. "Eu respondi que não estava usando um objeto de chapelaria, mas um hijab que fazia parte da minha vestimenta e que eu usava em todos os lugares, trabalhava e estudava com ele", diz.

Ela perguntou se Charlyane tinha alguma comprovação de que pertencia à religião, afirmando que qualquer pessoa poderia chegar "fantasiado, alegando ser muçulmano". "Eu expliquei que já havia sido revistada e ela disse que, usando o hijab, eu poderia constranger as outras pessoas e que se não tirasse, eu seria eliminada".

O item do edital de abertura do exame que trata do porte de objetos diz que será eliminado o examinando que for surpreendido durante a prova portando aparelhos eletrônicos diversos "ou quaisquer acessórios de chapelaria, tais como chapéu, boné, gorro etc", mas nada fala sobre a vestimenta.

A coordenadora informou à estudante que no ato da inscrição deveria ter solicitado atendimento especial para realizar a prova em sala individual. O edital do exame só trata da necessidade de atendimento especial em caso de deficiência ou doença que justifique tais condições especiais ou para examinandas durante o período de lactação.

A coordenadora disse que Charlyane poderia voltar para a sala ciente de que poderia ser eliminada.

Mais constrangimento

"Voltei para a sala e após mais uma hora de prova sou chamada pelo vice-presidente da Comissão do Exame da OAB [Rubens Decoussau Tilkian]. Levantei e fui chorando", diz. O vice-presidente e dois advogados da Comissão do Exame disseram que entendiam Charlyane, mas que ela não poderia fazer a prova usando o hijab.

"Eu disse que como eles eram advogados poderiam entender que eu estava exercendo o meu direito de cidadã, que não há lei no Brasil que proíba manifestação religiosa e que eu só queria fazer a minha prova", diz.

Os advogados perguntaram se ela se sentiria constrangida se fosse convidada a retirar o lenço e voltar para a sala. "Eu disse que iria repetir que eu não podia retirar meu véu em locais públicos e que seria ainda mais constrangedor se eu voltasse para a sala sem, depois de sair duas vezes", diz.

Charlyane terminou a prova em uma sala individual e afirmou aos advogados que iria reclamar judicialmente. "Eu fiquei totalmente constrangida, não consegui mais fazer o exame e, apesar de ter estudado muito, não fui aprovada", diz.

"Estamos aguardando o posicionamento da OAB e da FGV em relação ao caso e se houver inércia da parte deles, iremos recorrer a vias judiciais", afirmou Daniela Coelho, advogada de Charlyane.

Mudanças

A OAB disse em nota que o edital do exame prevê a "vedação ao uso de quaisquer acessórios de chapelaria", porque existem dispositivos que permitem a comunicação entre pessoas, o que é proibido.

Sobre o caso citado, a Ordem disse que vai estudar novas medidas.

"A necessidade de fiscalização não pode em hipótese alguma sobrepor a liberdade religiosa dos candidatos. Diante do ineditismo do ocorrido, sem precedente similar que tenha chegado à Coordenação Geral do Exame ao longo de suas 16 edições, a OAB estudará novos procedimentos para que constem no edital itens levando em consideração o respeito ao credo. Para que nesses casos específicos de religiões que exijam o uso do véu tenhamos procedimentos fiscalizatórios específicos", disse em nota.

Fonte: UOL

Deem uma olhadinha na imagem abaixo:

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Sabem o que são essas pecinhas? São pontos eletrônicos, feitos para serem encaixados nos ouvidos. Eles são utilizados em fraudes das mais diversas. Os da imagem acima foram usados em uma fraude do concurso da PM Bahia:

Pernambucanos são presos por suspeita de fraude em concurso da PM da Bahia

Ou seja, fraudes existem e são uma realidade nos mais diversos concursos e mesmo no Exame da OAB. Aliás, no Exame de Ordem existe o relato de pelo menos 3 incidentes desta natureza por prova. Um lenço na cabeça encobriria tranquilamente o ponto e não permitiria que os fiscais sequer desconfiassem.

Não que a examinanda, evidentemente, fosse fraudar alguma coisa, mas as regras existem exatamente para evitar problemas desta natureza.

Sim, existe quem fraude o Exame em todas as edições. Alguns casos são descobertos, mas a maioria não.

Logo, a vedação a itens de chapelaria não está no edital de graça: tem um sentido muito prático.

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Esta regra é importante e não me parece que a coordenação da prova tenha errado em impedir o uso do hijab.

Aí entra a parte da liberdade religiosa. Essa peça, o hijab, é visto como indumentária religiosa.

Sim, o art 5º, VI, da Constituição Federal preceitua que "é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias; "

Isso significa que a liberdade religiosa é a regra, mas também que é mitigada pela legislação infraconstitucional.

E o edital é a lei do Exame de Ordem, como também é dos concursos.

Acredito que a candidata deveria ter pedido atendimento especial em razão da necessidade de usar o hijab (que é um direito dela). A Ordem teria que assegurar um local diferenciado para a candidata fazer a prova.

Para mim a coordenação da prova errou na forma de conduzir e resolver a situação, mas a candidata, se queria usar o hijab, deveria sim ter pedido atendimento especial.