Terça, 28 de abril de 2015
É importante ler a legislação seca para estudar para o Exame de Ordem? Há 7 anos atrás, quando criei o Blog, vi um comentário que me motivou muito a escrever especificamente sobre metodologia de estudo.
Mais até, sobre uma metodologia específica para o Exame de Ordem, cujo conteúdo é mais restrito se comparado ao de concursos públicos e cujo lapso de tempo (em regra 4 meses) é bem restrito.
O comentário foi o seguinte: "para fazer a prova da OAB basta ler a lei seca."
Achei a afirmativa curiosa, pois só lei a norma crua e nua me pareceu algo exagerado, em especial porque eu estudei lendo resumos específicos para a OAB e acompanhando tudo com a lei seca.
A afirmativa, portanto, tomada ao pé da letra, não é válida: é preciso mais!
Mas ela não está errada quando falamos em estudar, não só para a OAB como também para qualquer concurso na área jurídica.
E por que é importante?
A importância deriva, em especial, do método utilizado pela FGV na formulação das questões.
Um estudo conduzido pelo doutor e professor do Departamento de Educação da UFSCar - Universidade Federal de São Carlos - João Virgílio Tagliavini, coordenador de um trabalho sobre a estruturação do Exame da OAB, definiu da seguinte forma a estrutura das questões da prova objetiva:
a) 75,75% das questões enfatizam a memorização das normas;
b) 13,75% são questões com foco na doutrina;
c) 1% abordam aspectos jurisprudenciais e;
d) 9,5% abordam mais de uma fonte do direito.
Ou seja, de forma preponderante o conhecimento da norma é importante para se responder as questões da 1ª fase.
Mas o estudo não pode ser conduzido só pela leitura da lei. E isso por dois motivos significativos:
1 - É preciso dar contexto à lei, compreendê-la através da explanação dos doutrinadores. Trata-se, na verdade, de expandir a compreensão da norma por meio da leitura de uma doutrina ou do acompanhamento de uma aula. A apreensão conceitual aumenta se uma leitura SIMULTÂNEA com a doutrina é feita, em especial porque os institutos jurídicos nem sempre são lineares, tal como apresentados na norma seca.
2 - Só, e somente só adotar um processo de compreensão reduz a capacidade de absorção do conteúdo. Ler é a forma primária como aprendemos, mas, digamos, é preciso fazer mais.
Aqui eu vou usar uma alegoria para explicar melhor o conceito.
Imaginem uma pista, com início e fim, onde o início é o livro e o fim é a apreensão do conteúdo no seu cérebro. Vamos usar a imagem abaixo como representação desta pista:
Quando você lê, a informação sai do livro, transita pelos seus olhos, é decodificada pelo seu cérebro e vira memória. Quer dizer, vai para a memória e ficará lá por mais ou por menos tempo.
Se o processo de estudo só utilizar uma única pista, a fixação do conteúdo ocorre, é verdade, mas ocorre com limitações.
Agora imaginem uma outra pista, a pista abaixo:
Essa é uma outra pista, usada quando vamos resolver exercícios, por exemplo. Aqui o processo é diferente! Ao invés da informação "entrar" pela primeira pista, na verdade o cérebro é que pega a informação, que está na memória, e faz o caminho inverso, saindo da memória até ir para o papel, quando o candidato marca uma alternativa correta por exemplo.
O processo neurofisiológico foi diferente, mas, ainda assim, a mesma informação colhida na primeira pista foi usada, só que transitando por uma outra pista.
O estudante leu, depois pegou a informação e respondeu uma pergunta. O uso de duas pistas diferentes ajudaram-no a fixar melhor o conteúdo, pois o cérebro teve que trabalhar com a mesma informação valendo-se de pistas distintas.
Agora imaginem uma terceira via:
Aqui nesta pista o processo também é diferenciado.
Ao invés de responder uma pergunta, o estudante elabora um resumo valendo-se do que tem na memória e PENSA sobre o que estudou, explicando para si mesmo o que aprendeu.
Este já é um terceiro processo, diferente dos dois primeiros. Diferente, mas não desconexo, pois os dois primeiros são importantes para a apreensão do conteúdo.
A diferença está na forma como se trabalha a informação. Há evocação, como na segunda pista, mas este processo exige um pouco além do que meramente se resolver questões, pois aqui não há uma pergunta prévia a ser respondia, e sim a declinação pessoal dos conceitos já anteriormente apreendidos.
Conclusão: o estudo NÃO pode ser um processo que siga por uma única pista, um processo de apreensão de conceitos de forma linear. É preciso usar várias "pistas" para consolidar o que está sendo estudado.
A base disto é neurofisiológica:
Seguindo esse premissa, por analogia, o uso das fontes de estudo também, em certa medida, obedecem essa lógica. A limitação a uma única fonte de estudo não permite que o estudante apreenda por inteiro a complexidade de conceitos entremeados no universo jurídico, incluindo aí o Exame de Ordem.
Não é só a leitura da Lei, mas também da doutrina, a resolução de exercícios, a jurisprudência. Com mais fontes de estudos, maior a amplitude da reflexão sobre o objeto de estudo, sobre o conteúdo jurídico alvo do interesse do estudante.
Temos livros, aulas e a lei para serem trabalhados, por diversas formas de apreensão de conteúdo, para enfim forma uma "pista" complexa e fluida, repleta de conhecimentos:
O cérebro é um órgão notável. Ele , em alguma medida, maleável, capaz de se adaptar a uma série de distintos processos. Evidentemente ele possui limites, mas, aqui para o nosso objetivo, quanto mais demandarmos dele, mais ele irá responder. Não é algo que ocorra da noite para o dia, mas isso acontece sim.
Um pouco sobre o conceito de plasticidade cerebral e o início de um projeto de estudos
Quanto tempo se leva para consolidar o hábito de estudar?
Como estruturar (e manter) um projeto de estudos de longo prazo
Não existem "mágicas" quando falamos em estudar. Estudar toma tempo, cansa e demanda até aspectos de ordem emocional. Mas com o tempo, com as metodologias certas, com a percepção de que o conteúdo está sendo devidamente apreendido, o estudante se adapta e torna a aprendizagem um processo bem assimilável.
Tudo depende, em larga medida, de disciplina. O resto vem por consequência.
E, como fontes de estudo para a lei seca, eu recomendo o uso de um vade mecum, mais especificamente o do Portal Exame de Ordem: