A face feia do Exame de Ordem

Quinta, 21 de abril de 2011

Lembram do Exame de Ordem passado? O 2010.2? O Ministério Público Federal ajuizou uma Ação Civil Pública, com pedido de tutela antecipada, para que a Justiça Federal determinasse a recorreção e divulgação dos espelhos de todas as provas prático-profissionais do Exame em conformidade com o disposto no art. 6, §3º do Provimento nº 136/2009 e no item 5.7 do edital de abertura - MPF ajuiza Ação Civil Pública contra correção das provas subjetivas

O juiz da causa deu 24 horas para a OAB e a FGV se manifestarem em relação à ação, e a decisão sairia antes da publicação do resultado dos recursos interpostos do resultado preliminar da segunda fase.

O que a OAB fez?

Nâo esperou nem um pouco a decisão da Justiça Federal e, frustrando parte do pedido do MPF, antecipou em dois dias a divulgação do resultado final do Exame de Ordem 2010.2.

Em entrevista ao site Conjur (cliquem AQUI para verem a íntegra da matéria) O presidente do Conselho Federal da OAB disse que "o MPF age contrariamente aos interesses de bacharéis que já foram aprovados. E mais: entendemos que não tem legitimidade para manejar a Ação Civil Pública neste caso". Aduziu ainda que antecipação na publicação do resultado se deu "por entender que o juiz não tem competência pra analisar o caso..."

Na prática a OAB estrategicamente antecipou a publicação visando frustrar parte do pedido do MPF e mesmo tentar colocar esta instituição na defensiva ao asseverar que os candidatos aprovados poderiam ser prejudicados pela ação.

E assim agindo, a Ordem criou um fato novo capaz de influenciar o juízo em seu favor. Afinal, alterar um processo seletivo consumado, que já gerou direitos para milhares de candidatos, não é uma decisão fácil e nem simples de ser tomada.

Foi uma jogada! E deu certo!

Ontem, como vocês bem sabem, a OAB adiou em um mês a divulgação do resultado final do Exame 2010.3, incluindo aí a lista de aprovados, padrões de resposta, etc e tal - Resultado final do Exame de Ordem 2010.3 só em 20 de maio!!!

E o fez sem dar uma justificativa, apesar de sabermos que o novo provimento sairá do forno no dia 16 de maio, 4 dias antes da divulgação do resultado.

O novo edital certamente será elaborado sob os ditames desse novo provimento.

A decisão de publicar ou não o resultado, nos dois casos acima, estava atrelada aos interesses da OAB em completo arrepio aos respectivos editais.

Tudo é feito com o olho no objetivo primordial do Exame de Ordem na atualidade: reprovar o maior número possível de candidatos.

Uma simples avaliação de capacidade não demandaria tantos malabarismos em torno da prova, não apresentaria um percentual cada vez pior de reprovações, não irritaria tanto os bacharéis.

A culpa não é só do ensino jurídico de baixa qualidade.

Os candidatos hoje são muito mais preparados do que há poucos anos atrás. Muito mais mesmo! Apresentam, no mínimo, os mesmos conhecimentos que candidatos de outrora, hoje advogados em plena atividade, apresentaram quando foram aprovados.

Só a título de curiosidade, comparem o enunciado da última prova trabalhista elaborada pelo Cespe e vejam a última prova trabalhista feita pela FGV. O abismo entre ambas é colossal:

CESPE

FGV

Se a prova da FGV tivesse sido aplicada aos candidatos do Exame 2010.1, o último do Cespe, a reprovação teria sido monstruosa.

E sequer passou um ano ainda da aplicação da última prova do Cespe. Quem foi aprovada na prova do Cespe tinha mais capacidade face aos reprovados na última prova? Isso é discutível.

Vamos ver a evolução do número de aprovados nos Exames passados:

2008.1 - 39.357 inscritos

Percentual de aprovados em relação ao número de presentes: 28.87%

2008.2 - 39.732 inscritos

Percentual de aprovados em relação ao número de presentes: 30,22%

2008.3 - 47.521 inscritos

Percentual de aprovados em relação ao número de presentes: 27,35%

2009.1 - 58.761 inscritos

Percentual de aprovados em relação ao número de presentes: 19,48%

2009.2 -70.094 inscritos

Percentual de aprovados em relação ao número de presentes: 24,45%

2009.3 - 83.524 inscritos

Percentual de aprovados em relação ao número de presentes: 16,50%

2010.1 - 95.764 inscritos

Percentual de aprovados em relação ao número de inscritos: 14,03%

2010.2 - 106.041 inscritos

Percentual de aprovados em relação ao número de inscritos: 16%

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Eu não me surpreenderia se o percentual de aprovados no atual Exame ficar abaixo da casa do 10%. Não me surpreenderia mesmo.

Agora me digam: Qual é a diferença substancial que separa um candidatos aprovados no Exame de Ordem 2008.3 (27,35%) dos aprovados no Exame  2010.2 (16%).

Afora o lapso de tempo de 2 anos e a crença (minha) de que os atuais candidatos se preparam mais, as diferenças não são óbvias. Mas, de uma forma ou de outra, percentualmente mais candidatos foram aprovados naquele Exame.

Por que, cada vez mais, o Exame de Ordem reprova um maior número de candidatos?

Porque o grau de dificuldade da prova em si e de seus procedimento tem aumentado cada vez mais

Só isso!

Pergunto mais uma vez: o que é o mínimo necessário para o exercício da advocacia? Já respondo: Ninguém sabe!! Não existe uma definição ou conceito para isso.

E aí entra o novo provimento que regerá o Exame de Ordem.

Vocês viram a abertura de algum debate entre os interessados? Um seminário, por exemplo?

Não...

No máximo a FGV enviou um e-mail aos aprovados na 2ª fase com uma série de pergunta DIRIGIDAS para ajudar o balizamento do que será este novo provimento - FGV faz pesquisa com candidatos sugerindo novos modelos de aplicação do Exame de Ordem

Mas DEBATER com a sociedade, nem pensar.

Isso em razão da natureza do Exame. Abrir ao debate contrariaria o propósito de fechar as portas para o ingresso na advocacia.

O novo CPC ou o novo CPP, por exemplo, foram debatidos exaustivamente com a sociedade, mas o novo provimento do Exame de Ordem...

Será que o Exame não interessa tanto assim para a sociedade brasileira?

Vocês sabem a resposta...

E este novo provimento certamente trará novidades, e nenhuma será boa para os futuros candidatos.

A possibilidade de reduzir o número de prova ao ano é real e foi efetivamente debatida na última reunião do Conselho Federal: um exame a cada 6 meses.

Pobres daqueles que reprovarem 2, 3 ou 4 vezes. O lapso entre uma prova e outra será muito maior, e o desânimo em voltar a estudar e ESPERAR tanto tempo derrubará ainda mais gente.

Imaginem! O candidato que passar em sua 4ª tentativa (o que não é raro) levará 2 anos para enfim ser aprovado!

Dois anos em 4 tentativas!!

Duas tentativas apenas? Um ano inteiro!

Para quem não sabe, 80% dos candidatos que fazem a prova já foram reprovados ao menos uma vez, e esse dado foi colhido da pesquisa feita pela FGV mencionada acima - Sergipe se destaca com aprovação superior à taxa média nacional

E se engana quem acha que a OAB tem medo de perder receita com um Exame a menos por ano. Apesar de cada Exame de render 20 milhões aos cofres da entidade, o dinherio é da entidade, e não dos advogados. E a classe está mais preocupada com o mercado do que com dinheiro em si.

Mas isso é apenas, ainda, uma proposta, e talvez não se concretize. Mas, se se concretizar...

E o que falar da ideia de aplicar as provas todas em um mesmo dia ou no mesmo final de semana?

Teci várias considerações sobre isso na postagem sobre a pesquisa feita pela FGV (acima) e nenhuma alteração, nenhuma, seria boa para os candidatos.

Dito tudo isso, o mais interessante é constatar, mais uma vez, a absoluta INCAPACIDADE da OAB em se comunicar com os candidatos. Constatei isso desde que criei o Blog, há três anos atrás, e nesse meio tempo nada mudou.

A OAB não conversa com os bacharéis, a OAB não explica nada e provavelmente nunca explicará.

Isso porque vocês NÃO SÃO ADVOGADOS.

A Ordem é de advogados e não de bacharéis.

Um amigo me contou que entrou numa segunda-feira na sala de advogados do fórum trabalhista de Brasília e encontrou vários advogados debatendo a última prova subjetiva, essa cujo o resultado foi adiado para o dia 20 de maio. Ele não participou da conversa, mas não pôde deixar de notá-la. Eles riam dos candidatos. Riam que os bacharéis haviam "se arrombado" na prova, pois ela, como vocês sabem, foi como foi.

Quem não é advogado, infelizmente, é um pária, um excluído, um indesejado.

Vocês são tratados assim.

E gostem ou não, por tudo o que se vê por aí, é a pura verdade.

Ninguém, por palavras, admitirá isso, e mesmo refutarão. Mas como falaram uma vez, é pelo frutos que se conhece a árvore.

Que frutos o Exame de Ordem tem dado?

Esses vocês conhecem bem, e são amargos.