Quarta, 18 de abril de 2012
Os professores Geovane Moraes e Ana Cristina elaboraram razões para quem vai recorrer da prova de Direito Penal. Confiram:
Fundamento para recurso da 1ª questão da prova de DIREITO PENAL da 2ª fase da OAB 2011.3
Eis o enunciado da 1ª questão:
Ao chegar a um bar, Caio encontra Tício, um antigo desafeto que, certa vez, o havia ameaçado de morte. Após ingerir meio litro de uísque para tentar criar coragem de abordar Tício, Caio partiu em sua direção com a intenção de cumprimentá-lo. Ao aproximar-se de Tício, Caio observou que seu desafeto bruscamente pôs a mão por debaixo da camisa, momento em que achou que Tício estava prestes a sacar uma arma de fogo para vitimá-lo. Em razão disso, Caio imediatamente muniu-se de uma faca que estava sobre o balcão do bar e desferiu um golpe no abdômen de Tício, o qual veio a falecer. Após análise do local por peritos do Instituto de Criminalística da Polícia Civil, descobriu-se que Tício estava tentando apenas pegar o maço de cigarros que estava no cós de sua calça.
Considerando a situação acima, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.
a) Levando-se em conta apenas os dados do enunciado, Caio praticou crime? Em caso positivo, qual? Em caso negativo, por que razão? (Valor: 0,65)
b) Supondo que, nesse caso, Caio tivesse desferido 35 golpes na barriga de Tício, como deveria ser analisada a sua conduta sob a ótica do Direito Penal? (Valor: 0,6)
Apresentou a Banca Examinadora, para a referida questão, o seguinte espelho de correção:
Gabarito Comentado:
a) Não, pois atuou sob o manto de descriminante putativa, instituto previsto no art. 20, parágrafo 1º do CP, uma vez que supôs, com base em fundado receio, estar em situação de legítima defesa. Como se limitou a dar uma facada, a sua reação foi moderada, não havendo que se falar em punição por excesso.
b) Ainda que tenha procurado se defender de agressão que imaginou estar em vias de ocorrer, Caio agiu em excesso doloso, devendo, portanto, responder por homicídio doloso, na forma do artigo 23, parágrafo único, do CP.
O gabarito da questão merece reparo, em especial ao que se refere ao artigo citado para fundamentar a legítima defesa putativa, uma vez que a teoria adotada pela Banca Examinadora não é algo pacífico na nossa doutrina. Sabe-se que as descriminantes putativas dividem-se em três espécies, quais sejam: erro quanto aos pressupostos fáticos de uma causa de exclusão de ilicitude; erro quanto à existência de uma causa de excludente de ilicitude; erro quanto aos limites de uma excludente de antijuridicidade.
A questão apresentada pela Banca Examinadora abordou sobre a primeira espécie de descriminante putativa. Nela, o agente pensa estar numa situação de defesa que na realidade inexiste. O agente atua acreditando estar agindo, no caso concreto, em legítima defesa, porém tal situação não existe no mundo real, sendo imaginada pelo autor.
Para a teoria limitada da culpabilidade, teoria esta adotada pela Fundação Getúlio Vargas, se o erro do agente recai sobre a situação fática, primeira hipótese de descriminante putativa, estar-se-á diante do erro de tipo, mais precisamente o erro de tipo permissivo. Nas demais espécies de descriminantes putativas, o erro passa a ser de proibição.
Todavia, para os defensores da teoria extremada da culpabilidade, como os autores Assis Toledo, Guilherme de Souza Nucci e Cezar Bittencourt, todo e qualquer erro que recaia sobre uma causa de justificação é erro de proibição, não realizando distinção se o erro seria sobre situação fática, existência de causa de exclusão ou limites de uma excludente.
O renomado e conhecido autor Guilherme de Souza Nucci defende ser o caso como um erro de proibição, assim informando em seu código penal comentado: ?Continuamos adotando a teoria extremada da culpabilidade, ou seja, há um autêntico erro de proibição que foi tratado como erro de tipo?. Ainda em seu código, ele cita o exemplo do motorista que agride um mendigo porque acha que ele iria assaltar o ônibus quando, na realidade, ele queria pedir esmola. Nessa situação, Nucci defende a tese de que o engano do motorista recai sobre a proibição, já que ele não estava autorizado a agir contra o mendigo, existindo dolo na conduta do agente.
Cezar Roberto Bitencourt, no livro Manual de Direito Penal, defende a ideia de que adotar a teoria limitada da culpabilidade, nesse caso, excluindo-se a dolo, gerariam consequências indesejáveis, assim elencadas: ?a) um fato praticado, com erro invencível, afasta o injusto típico, não podendo ser considerado como um fato antijurídico. b) não seria punível a participação de alguém que, mesmo sabendo que o autor principal incorre em erro sobre os pressupostos fáticos de uma causa de justificação, contribuiu de alguma forma na sua execução. c) a tentativa não seria punível, nesses casos, pois a configuração exige a presença do dolo. Mesmo sendo o erro vencível, o fato ficaria impune, pois os crimes culposos, em tese, não admitem tentativa?.
Nesse caso, não pode a banca examinadora primar apenas pela pontuação que se refere ao artigo 20, §1º do Código Penal, já que os candidatos que seguem a teoria extremada da culpabilidade entenderam que, no caso concreto, houve erro de proibição, fundamentando-se no artigo 21 do mesmo diploma legal.
Com isso, resta claro que o candidato que tem seus estudos pautados por doutrinadores reconhecidos e renomados, como os já supramencionados e que seguem a teoria extremada da culpabilidade, informaram na questão haver inequívoco erro de proibição, previsto no artigo 21 do Código Penal, tratando-se a legítima defesa putativa como uma espécie desse erro, não podendo serem prejudicados em virtude de defender tese diversa da adotada pela Banca, visto que o assunto é divergente.
Diante do exposto, não pode requerer a banca examinadora que o candidato tome por base um ou outro doutrinador, já que a própria doutrina discorda no assunto, requerendo, nesse caso, a aceitação também da fundamentação pautada no artigo 21 do Código Penal Brasileiro.
Observação para as demais questões e para a peça da prova de DIREITO PENAL da 2ª fase da OAB 2011.3
Aos alunos que, por ventura, colocaram o nome da peça como Relaxamento de prisão cumulada com Liberdade provisória com ou sem o arbitramento da fiança, em princípio, é possível formular recurso no sentido de requerer ao examinador a correção da prova, uma vez que tanto a Constituição Federal quanto o Código de Processo Penal estabelecem que o agente não ficará preso se houver possibilidade de ingresso de pedido de liberdade, fundamentando-se no art. 5º, LXVI combinado com o art. 322 do Código de Processo Penal. Apesar da peça cabível ser o relaxamento de prisão em flagrante, não pode o candidato ser prejudicado por ter colocado a mais algo que beneficie o seu cliente.
Além disso, é necessário verificar se há algum erro material na sua prova, ou seja, se faltou alguma coisa a ser pontuada. Para isso, você irá pegar a sua prova e pegar o espelho de correção e verificar ponto por ponto aquilo que foi ou deixou de ser pontuado.
O que a banca deixou de pontuar, será objeto de recurso, mas como é algo muito genérico, não temos que fazer um modelo específico pra vocês. Mas, por exemplo, se na questão 2 você fundamentou ser caso de resposta à acusação, merece a pontuação que lhe é devida. No seu recurso, você colocará que o candidato, as linhas ___ informou ser o meio abordado pela banca examinadora, ou seja, que é cabível ao caso concreto a apresentação da resposta à acusação, no prazo de 10 dias de acordo com o espelho de correção, requerendo a pontuação que lhe é cabível.
Vocês farão isso em todas as partes da sua prova, tanto na peça, quanto nas questões se existir algum erro material.
Estamos juntos.