Quinta, 5 de outubro de 2017
Acabou a guerra entre o MEC e a OAB, e com a derrota da Ordem: Curso Superior de Tecnólogo em Serviços Jurídicos reconhecido pelo MEC.
Foi publicado ontem (04) no Diário Oficial da União (D.O.U.) o reconhecimento do curso a distância de Gestão de Serviços Jurídicos e Notariais (Tecnológico) do Centro Universitário Internacional (Uninter), com 3 mil vagas.
Em 18 de abril deste ano o MEC havia homologado parecer do Conselho Nacional de Educação (CNE) autorizando o funcionamento de curso superior de tecnologia em serviços jurídicos após recurso interposto pela Faculdade de Agronegócio Paraíso do Norte contra a decisão da própria Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior do MEC que, no ano passado, negou a abertura do curso.
Toda IES (instituição de ensino superior) precisa, antes de qualquer outra coisa, ser credenciada pelo MEC. Sem este credenciamento não há como emitir diplomas.
Após o credenciamento, a IES PODE criar cursos novos, bastando para isto pedir uma autorização para o MEC. Com a autorização, a IES pode abrir um processo seletivo e criar turmas para esta nova graduação.
Depois de iniciado o curso, a instituição deverá pedir o reconhecimento dele para o MEC. Isto deve acontecer no segundo ano de funcionamento para cursos com duração de quatro anos e a partir do terceiro ano para aqueles cuja duração for superior a quatro anos.
Foi o que aconteceu ontem.
Esse reconhecimento, sem dúvida, é a sinalização definitiva do MEC quanto ao tema. Afinal, se um curso é finalmente reconhecido, o que impedirá outros cursos serem autorizados ou também reconhecidos? Outras mantenedoras poderão alegar o Isonomia e abrir ou reconhecer agora seus cursos, e o MEC não terá o que fazer, dado o precedente.
É verdade que, ainda em abril, o MEC havia suspendido a tramitação de pedidos de autorização destes cursos após pressão feita pela OAB. Mas com a publicação do reconhecimento, dias após o Conselho Nacional de Educação ter publicado parecer rejeitando um recurso da OAB que tentava acabar com curso de técnico (nível médio) em Serviços Jurídicos, mostra de forma cristalina a força e o lobby do empresariado da educação dentro do Ministério e do Conselho.
MEC suspende temporariamente a abertura de cursos de tecnólogos jurídicos
No último dia 26/08 encerrou o prazo de 4 meses de suspensão da tramitação dos pedidos de autorização de cursos superiores de tecnologia em serviços jurídicos ou equivalentes. E, pelo visto, este reconhecimento foi o sinal dado pelo MEC para a OAB e para o mercado.
No caso do curso de técnico, a Câmara de Educação Básica já havia rejeitado pedido anterior da OAB para excluí-los do Catálogo Nacional de Cursos Técnicos, editado pelo MEC.
Agora, com o indeferimento no recurso, a aprovação final depende do aval do MEC.
Se o MEC reconheceu ontem o curso de Tecnólogo em Serviços Jurídicos, outra pedra no sapato da OAB, e vai autorizar o de técnico, assim como todos os demais que surgirem.
E a posição da Ordem neste tema é clara:
Presidente da OAB diz que MEC patrocina verdadeiro estelionato educacional
Um aumento ainda maior de bacharéis, somado com o surgimento do tecnólogo em serviços jurídicos e do técnico, vai levar ao limite as condições do mercado como um todo.
Há poucos meses atrás divulguei um anúncio feito em um site para a contração de jovem advogado em Belém/PA:
Essa oferta não é algo excepcional: os (muitos) comentários feitos pelos internautas nas redes sociais apenas corroboram uma impressão geral: os valores iniciais para a estão cada vez menores. E isso, claro, em função da natural saturação de advogados no mercado.
Lei da oferta e procura em ação.
Onde um tecnólogo em serviços jurídicos ou um técnico encontrarão espaço para trabalhar se um advogado, previamente aprovado no Exame de Ordem, já recebe ofertas como esta?
Não há mercado para esses profissionais.
Técnicos e tecnólogos jurídicos não têm mercado no Brasil
Por detrás da abertura destes cursos está no fato do curso de Direito ser o mais popular no Brasil hoje:
Direito concentra o maior número de estudantes universitários do Brasil
Existe procura pelo curso, e um procura grande.
Pensem comigo:
Se o curso de tecnólogo é à distância, ele seria mais barato e rápido do que uma graduação em Direito. O que impede os futuros formandos em aproveitar os créditos do curso de tecnólogo em serviços jurídicos e ingressarem no bacharelado em Direito, visando se formarem de forma mais rápida?
Ninguém quer tecnólogo para ser somente um auxiliar jurídico, impossibilitado de prestar sequer uma consultoria jurídica. O alvo, o destino final, será o bacharelado.
Resta agora à Ordem judicializar a questão, como havia prometido.
OAB ameça judicializar questão do curso de tecnólogo jurídico
Aliás, é uma vergonha que a OAB esteja sozinha nesta luta. Associações de magistrados e do MP nunca disseram nada sobre isto. Parece que as ações do MEC não são também problema deles.
O comportamento do MEC, francamente favorável ao empresariado e muito, mas muito desastroso para a qualidade da educação, está merecendo verdadeiramente uma investigação.
MEC atropela Conselhos de Classe
O mercado não aguenta mais tantas pessoas.
Brasil ganha 159 advogados por dia
1 - O curso superior de tecnólogo NÃO tem um currículo próprio. Ou seja, a própria faculdade vai determinar a sua matriz curricular, sendo que sua duração poderá ser em até 2 anos, ou até menos, em razão do que estabelece a legislação e especialmente a FORMA como será ministrado.
Como o curso superior de tecnólogo pode ser ministrado via EAD, à distância. Isso o torna bem mais barato para a instituição, que poderá ter menos professores e um custo operacional menor. Logo, maximiza o lucro da IES.
2 - Quem já tem uma graduação concluída em qualquer área pode fazer o curso de tecnólogo em apenas dois anos. Depois, a faculdade permitiria que os créditos da graduação anterior fossem aproveitados em uma graduação em Direito. Isso com integralização de horas-aulas do curso de tecnólogo mais o curso anterior. Ao fim de mais um ano de estudo o aluno sair com um diploma regular no curso de Direito.
Este é o pulo do gato e o charme do curso superior de tecnólogo: permitir que um graduado de qualquer cadeira acadêmica saia bacharel em direito com apenas 3 anos de estudo!
Uma forma mais barata e rápida de sair com dois diplomas de nível superior em tempo inferior aos bacharéis atuais.
NOTA: O aval do MEC dando regularidade a esta tipo possibilidade não faz com que deixe de ser uma gambiarra. Especialmente porque a a formação destes futuros bacharéis será, inequivocamente, capenga. O aspecto pedagógico é o que menos importa neste caso.
Quantos e quantos formados não se sentiriam atraídos por essa possibilidade?
3 - O curso superior de tecnólogo prescinde de professores mestres e doutores. Apenas professores com especialização (mais baratos) ministrariam as aulas.
4 - Por outro lado, sendo EAD e podendo virar um bacharelado, o impacto no mercado dos professores será natural. Ou seja, demissões entre esses profissionais.
5 - O curso superior de tecnólogo prescinde da prática jurídica e mesmo de um TCC.
6 - Nada impede dos tecnólogos de se organizarem como associação ou mesmo em um sindicato. Isso, com o tempo, geraria uma força política capaz de rivalizar com a OAB. Inclusive o de prestar consultoria e assessoria jurídicas, atividades privativas dos advogados.
Não seria algo imediato, mas a perspectiva futura é evidente.
A verdade é que o curso superior de tecnólogo não é para criar uma "carreira específica", como aparenta ser. O objetivo é aumentar o fluxo de receita como uma forma rápida de conseguir um diploma de Direito.
Confiram o D.O.U. de ontem: Imprensa Nacional de 04/10/2017 A educação jurídica no Brasil vive o seu pior momento em toda sua história.