A encruzilhada digital da advocacia

Terça, 20 de março de 2018

A encruzilhada digital da advocacia

O presidente da OAB/RJ convocou para hoje um ato defronte ao TJRJ contra a implementação de um "Centro de Soluções", um sistema de informática que analisa conflitos via internet. Esse sistema é um robô, ou seja, um programa que avalia parâmetros jurídicos e aprende com os próprios erros.

Vejam a chamada para o evento:

É impossível não associar a manifestação de hoje com um movimento ocorrido há dois séculos atrás, o Ludismo.

O ludismo ocorreu na Inglaterra entre os anos de 1811 e 1812, quando trabalhadores, amedrontados pelos avanços da revolução industrial, protestavam contra a substituição da mão-de-obra humana por máquinas. Eles quebravam máquinas e invadiam fábricas para protestar contra o desemprego e as péssimas condições de trabalho.

O advento da inteligência artificial aplicada ao Direito no TJRJ está provocando agora um movimento com o mesmo conceito subjacente: a indignação em função do avanço tecnológico.

O interessante é que o TJRJ não está sendo pioneiro nesse avanço.

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A verdade é simples: o futuro chegou!

A ameaça não é só contra os advogados, mas também contra os próprios magistrados. Pois se um robô pode peticionar, ele também pode decidir, e o fazer seguindo estritos padrões técnicos, completamente isentos de subjetivos e ideologias.

Na verdade, toda a estrutura do Poder Judiciário encontra-se em uma encruzilhada, e negar isso é querer ser deliberadamente cego.

O futuro chegou!

Este texto não tem a menor pretensão de oferecer soluções ou apontar caminhos, mas sim o de convidar à reflexão: o que fazer de agora em diante?

Evidentemente, pressões políticas e corporativistas podem conter a escalada do uso de robôs na área jurídica, especificamente pelo Judiciário, mas só o conseguirá por um pouco tempo, talvez 5 ou 10 anos, se muito. Com o avanço da tecnologia e a sofisticação dos sistemas, é praticamente impossível impedir que computadores venham a  tomar decisões jurídicas.

Até meados de 1965 não havia nenhuma previsão real sobre o futuro do hardware quando Gordon E. Moore fez sua profecia, na qual o número de transistores dos chips teria um aumento de 100%, pelo mesmo custo, a cada período de 18 meses. Essa profecia tornou-se realidade e acabou ganhando o nome de Lei de Moore.

O avanço cresce tanto, em todas as áreas, que hoje a preocupação quanto ao futuro do trabalho humano é global.

Em evento ocorrido no início deste mês, Thomas Friedman, colunista do The New York Times, afirmou que "a velocidade de avanço das tecnologias superou a capacidade humana". Segundo ele, a habilidade humana cresceu gradualmente ao longo da história, enquanto a tecnologia pouco evoluiu até o século XX. Mas a partir desse ponto, o avanço tecnológico começa a se acelerar. "Estamos em um momento em que tecnologia está evoluindo mais rápido do que a capacidade humana".

"A tecnologia está evoluindo mais rápido do que a capacidade humana", diz Friedman

Na advocacia hoje a imposição de limitações ao uso de robôs advogados sequer é cogitada. Escritórios já usam robôs e não existe nada que impeça isso. Advogados já estão perdendo seus empregos, especialmente no contencioso de massa, por conta da utilização de robôs.

Os robôs já podem analisar a probabilidade de sucesso de uma demanda e até mesmo ajudar na estruturação de uma estratégia por meio da análise INDIVIDUALIZADA das decisões de um magistrado singular ou de um tribunal, fazendo-o com imensa velocidade e precisão.

A encruzilhada é real e nós acabamos de chegar nela. A manifestação marcada para hoje pela OAB/RJ é o início de um "movimento ludista" jurídico, com os trabalhadores do Direito enfrentando o avanço tecnológico. Um avanço que não pode ser contido.

O futuro chegou e é hora de se pensar o que fazer com ele.