Quarta, 26 de abril de 2017
Muitos acham que a permissão de cursos superiores de tecnólogos jurídicos abriria um espaço de relativa competição com os bacharéis em Direito e advogados no mercado de trabalho, ocupando funções exclusivas daqueles regularmente formados no curso de Direito.
É isso também, mas a questão sobre o curso de tecnólogo não se resume a isto, assim como este não é sequer o maior problema caso o MEC, ao fim do processo de negociação com a OAB, efetivamente venha a autorizar a abertura de mais cursos como este. Afinal, o temor é real, pois o empresariado da educação enxerga o curso de tecnólogo jurídico como uma nova mina de ouro.
Sim! Mina de ouro mesmo, pois venderia facilidades de uma forma como nunca antes vista!
Reparem só o contexto e as consequência de uma eventual autorização, da forma como foi publicada ontem:
1 - O curso de tecnólogo jurídico NÃO tem um currículo próprio. Ou seja, a própria faculdade vai determinar a duração do curso (em tese, apenas 2 anos), o conteúdo a ser ministrado e, especialmente a FORMA como será ministrado.
Quando ressalto a forma, quero dizer que NADA impede o curso de tecnólogo ser ministrado via EAD, à distância.
Isso torna o curso bem mais barato para a instituição, que poderá ter menos professores e um custo operacional menor. Logo, maximiza o lucro da IES.
2 - Aqui um aspecto que ninguém está levando em consideração mas que na verdade é o mais IMPORTANTE e verdadeiro alvo do interesse do empresariado.
Quem já tem uma graduação concluída em qualquer área pode fazer o curso de tecnólogo em apenas dois anos. Depois, a faculdade permitiria que os créditos da graduação anterior fossem aproveitados em uma graduação em Direito, com integralização de horas-aulas do curso de tecnólogo mais o curso anterior, para ao fim de mais um ano de estudo o aluno sair com um diploma regular no curso de Direito.
Este é o pulo do gato e o charme do curso de tecnólogo: permitir que um graduado de qualquer cadeira acadêmica saia bacharel em direito com apenas 3 anos de estudo!
Entenderam?
Uma forma mais barata e rápida de sair com um diploma do curso de Direito na mão.
Quantos e quantos formados não se sentiriam atraídos por essa possibilidade?
3 - A mesma lógica, mas de uma forma diferente, se aplicaria aos que não têm uma graduação prévia: se formariam em tecnólogos e depois fariam um curso de extensão, com a possibilidade de, ao fim, conseguirem um diploma do curso de Direito. Novamente em um lapso de tempo bem curto.
Nem preciso dizer que a própria graduação em Direito, em seu formato tradicional, estaria sob risco. Afora a natural explosão no número de bacharéis (com uma formação mais precária) e o correlato impacto no mercado de trabalho.
4 - O curso de tecnólogo prescinde de professores mestres e doutores. Apenas professores com especialização (mais baratos) poderiam ministrar as aulas.
5 - Por outro lado, podendo ser EAD e com complementação para virar um bacharelado, o impacto no mercado dos professores da graduação em Direito será natural. Ou seja, demissões entre esses profissionais.
6 - O curso de tecnólogo prescinde da prática jurídica.
7 - Nada impede dos tecnólogos de se organizarem como associação ou mesmo em um sindicato. Isso, com o tempo, geraria uma força política capaz de rivalizar com a OAB no sentido de se pleitear mais direitos, inclusive o de prestar consultoria e assessoria jurídicas, atividades privativas dos advogados.
Não seria algo imediato, mas a perspectiva futura é evidente.
8 - O mercado de trabalho, inclusive para advogados, seria de alguma forma impactado. Não consigo aqui antever de que forma, mas os tecnólogos poderiam em alguns casos retirar espaço dos bacharéis e advogados por representarem uma mão de obra mais barata.
Mas, é certo, o mercado da advocacia seria impactado em função da possibilidade de tornar um tecnólogo em bacharel em Direito de uma forma mais rápida. A explosão do número de advogados seria inevitável.
Claro, os tecnólogos terão mais dificuldade de passar na OAB em razão de uma formação mais precária, mas, mesmo assim, muitos passariam.
A verdade é que o curso de tecnólogo não é para criar uma "carreira específica", como aparenta ser. O objetivo é aumentar o fluxo de alunos (e de receita) como uma forma paralela e rápida para se conseguir um diploma regular no curso de Direito.
O problema é que isso não está explicitado em lugar nenhum (e nem vai estar) mas é a verdadeira ideia por detrás do curso de tecnólogo.
O curso de tecnólogo não tem valor, não permite uma evolução profissional e condena os formados a salários ínfimos para o resto da carreira. É óbvio que o objetivo com este curso é outro: tornar a graduação em Direito mais rápida, barata e, claro, lucrativa para as faculdades.
Não há bobos neste mercado.